Fim das aulas
Diário da Manhã
Publicado em 28 de junho de 2017 às 01:17 | Atualizado há 8 anos
Senhora Delegada.
A sirene da escola tocou. As aulas do dia acabaram. Lá no COLÉGIO ESTUADUAL BATISTA DE ABREU. Cada menina e cada menino tratou logo de juntar os livros e cadernos, e canetas, arrumar tudo dentro da pasta, falar um tchau pra ’fessora e outro pros coleguinhas. Quem mora pertinho vai embora a pé. Quem mora mais longe um pouquinho vai de bicicleta. Outros, de carro.
O pequeno e alegre Valdinho, de só nove aninhos de idade, como os outros coleguinhas, hoje, depois de aprender direitinho tudo o que a professora tinha programado para ensinar, também falou tchau pra ela. Pegou sua bicicletinha. O Breno, seu priminho, mais ou menos da mesma idade, também pegou a sua e os dois rumaram para casa. Atravessaram a pista de Cooper da Rua VC-15 e entraram à esquerda, na Rua Joana D’Arc, que tem sentido duplo. Ali, bem atrás daquele supermercado que tem nome japonês. Parece que… KADAYO, ou KATARA… não sei. O Breno, que ia na frente, passou. Mas… o Valdinho, não. É que… veio um carro grandão, muito pesado, demais da conta, Senhora Delegada e… não deixou.
Não sei muito bem como foi, Doutora Edilva, porque a mamãe do Valdinho também não sabe. Embora fosse ela quem estivesse com ele vindo da escola. Ela estava bem mais atrás. A uma grande distância.
O motorista do carro muito grandão parou. Parece que foi ele mesmo que chamou o socorro. Chegaram bem depressa ali, os anjos da vida, componentes da unidade USA-7. E com o cuidado e carinho maior desse mundo recolheram o pequeno ferido que jazia no leito do asfalto. Colocaram a pequena vítima na maca, dentro da ambulância.
O motorista ligou as luzes de alarme, e com a velocidade maior que a de um raio saiu em disparada para o HUGO. Junto com os faroletes de alarme, ainda aquela sirene saiu gritando e gritando e gritando alto e demais da conta, pra todo mundo sair da frente depressa! E teve carro até saindo da rua e subindo na calçada, e até quase subindo em cima dos outros pra dar passagem para aquela sirene desesperada que levava o Valdinho muito machucado.
Chegando Aqui no HOSPITAL DE URGÊNCIAS DE GOIÂNIA – HUGO, antes mesmo de parar por completo a unidade de salvamento os soldados enfermeiros já estavam com o Valdinho desfalecido nos braços correndo como loucos para entrega-lo aos outros anjos da vida deste Templo da Saúde.
Senhora Delegada, os abnegados e competentes sacerdotes de Esculápio, eternamente auxiliados pela legião de anjos de enfermeiras fizeram de tudo, com máquinas, mangueirinhas e remédios de tudo quanto é jeito e marca que a senhora possa imaginar mas… não teve jeito, Doutora Edilma. Desta vez, venceu a dor.
Senhora Delegada, agora alguém precisa avisar a professorinha do Valdinho, senão… amanhã cedo, ao começar a aula, na hora da chamada, quando ela falar o nome dele, só uma carteira vazia vai responder. Com um silêncio tão triste que… que ninguém vai agüentar.
Data venia, Doutora Edilma,
desculpe se puder, Vossa Senhoria,
este já bem cansado escrivão de seu cargo.
Ele está falando assim pra senhora é porque…
ao longo deste seu tão cáustico mister,
já escreveu tantas histórias, tão cheias de quantos
e tão doridos ais que…
agora é já ele, que não agüenta mais.
(Francisco de Oliveira Santos, escrivão)