Opinião

Pragmatismo e composição ou simbolismo e isolamento?

Diário da Manhã

Publicado em 7 de fevereiro de 2017 às 01:14 | Atualizado há 8 anos

O caos político vivido no Brasil nos anos de 2015 e 2016 foi causado por uma série de fatores, dos quais dois merecem destaque. De um lado, uma oposição insatisfeita com o resultado da eleição presidencial de 2014 e, de outro, uma incapaz articulação política do governo, que não conseguiu sustentar a presidente Dilma Rousseff no poder. Essa falta de articulação é explicada quando observado o modo como se comporta o sistema político partidário brasileiro, por meio do presidencialismo de coalizão, e ainda como o governo comportou-se e organizou (ou não) sua base de apoio no Parlamento.

Há ainda o pós-impeachment e o modo como os partidos que estavam no governo reagiram à ruptura no jogo político. O Partido dos Trabalhadores (PT) e o Partido Comunista do Brasil (PCdoB) mantiveram-se fiéis à ex-presidente Dilma Rousseff até o fim. Surgiram, então, duas saídas: a composição com os outros partidos e um possível posicionamento nas mesas diretoras do Congresso – ou o isolamento – com a manutenção do discurso de que Rousseff sofrera um golpe de Estado e, portanto, o não reconhecimento da legitimidade do governo Temer.

O sistema político partidário brasileiro pode ser compreendido a partir do presidencialismo de coalizão, traduzido como a ideia de transformação dos votos dos cidadãos em apoio no Parlamento. Isso porque o presidente da República, por mais carismático e hábil que seja, não consegue governar sem uma base de apoio no Congresso.

Um traço marcante do presidencialismo de coalizão é a importância de um presidente forte ou alguém que tenha boa articulação com o Poder Legislativo. A inabilidade do diálogo e a falta de interlocutores capazes de compreenderem o papel estratégico do Parlamento para a governabilidade torna o governo vulnerável a personagens como o ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que, de forma oportunista, reuniu condições para iniciar o processo de afastamento da ex-presidente Dilma.

A partir dessa visão do sistema político brasileiro, tem-se o princípio da governabilidade, muito utilizado por Lula em seus dois mandatos. Ele entendia que a necessidade de governar-se o País era, claramente, imponderável. Não adiantava tentar impor uma agenda e um programa de governo que não fossem minimamente aceitos por outros partidos, pois dever-se-ia viabilizar a formação de uma base à sustentação do governo.

Por sua vez, a articulação política nos últimos anos do governo Dilma mostrava-se ineficiente, já que não era possível compor as vontades do Partido dos Trabalhadores, do Palácio do Planalto e do Congresso. À medida que tal percepção foi se tornando mais clara – de que o governo não estava mais conseguindo lidar com o Parlamento, tampouco alinhar objetivos com partidos –, a oposição ganhou força e articulou-se com lideranças insatisfeitas no próprio governo, até conseguir minar de vez a sustentação de Dilma e derrubar o governo com um impeachment mais político do que técnico-jurídico.

Em 2017, ocorreu a primeira eleição regular das mesas diretoras da Câmara e do Senado depois da queda do governo do Partido dos Trabalhadores e de seu bloco. Nos dias 1º e 2 de fevereiro, senadores e deputados escolheram seus respectivos presidentes. Saíram vitoriosos da disputa o senador Eunício Oliveira (PMDB-CE) e o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) para ocuparem a função em cada Casa. Ambas as eleições já eram dadas como certas, conforme os partidos articulavam-se para ocuparem seu espaço nas posições das mesas diretoras do Congresso, de acordo com a proporcionalidade das respectivas bancadas.

De todos os partidos que compunham a base aliada de Dilma, o PT e o PCdoB foram os únicos que não a traíram. Eles reforçaram veementemente, em cada oportunidade, a teoria de que Dilma sofrera um golpe de Estado. Cientistas políticos afirmam que tal ideia até ganhou aderência em alguns setores da opinião pública.

Agora veio o governo Temer. Como ficam então PT e PCdoB?

Destacando-se a eleição da presidência da Câmara como exemplo, nota-se que o PCdoB escolheu ser pragmático e apoiar o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) na sua reeleição, por reconhecer nele uma figura mais sóbria na condução da Casa. O partido argumenta que o grupo de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) na Câmara ainda tem força e tudo deve ser feito para evitar que os aliados dele ganhem aderência nos espaços de poder. Essa disputa, para o líder do partido na Câmara, Daniel Almeida (PCdoB-BA), era maior do que a de golpistas contra não golpistas. Por outro lado, uma parte da base do partido não suporta a realidade que se instalou e rejeita fortemente a ideia de estar lado a lado com pessoas que trabalharam tanto para o impeachment da ex-presidente Dilma.

Já o Partido dos Trabalhadores entende que não há como lutar contra o dito governo ilegítimo e, ao mesmo tempo, compor com qualquer força que tenha apoiado o impeachment de Dilma. Por esse motivo, formulou a seguinte diretriz: “Não votamos em golpistas”. Não compondo com Rodrigo Maia, o PT perde a possibilidade de ter uma posição na mesa diretora da Casa, o que é plausível, já que o partido tem uma das maiores bancadas da Câmara. Fora das decisões e da articulação regimental, resta ao PT, na Câmara dos Deputados, patrimônio simbólico de sua luta contra o governo ilegítimo, o autoinfligido, mas não necessário, isolamento. Tal discurso agrada suas bases sindicais, os movimentos sociais e as corporações, mas cria dificuldades na conjuntura política parlamentar.

 

(Pedro Rebelo, graduando em Relações Internacionais na Universidade Católica de Brasília)

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