Revolução interior
Redação DM
Publicado em 9 de abril de 2017 às 23:34 | Atualizado há 8 anos
Jean Piaget, um dos maiores paradigmas da educação no mundo, mostrou que as pessoas avançam em estágios de conhecimento. Elas vivenciam situações de conflito cognitivo e suplantam os obstáculos (situações-problemas). Tais obstáculos fazem com que o sujeito reorganize seus conhecimentos anteriores e assim busque novas informações para ultrapassá-los. É, portanto, a educação que reorganiza nosso tempo e vivência. Sem ela, perdemos partes consideráveis da experiência e da capacidade de interação social.
Nas últimas décadas, o Brasil avançou, ainda que pouco, no ensino primário. Os resultados do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa) estão aí: o Brasil melhora e recua. Mas não chega mais a ser uma vergonha, como na década de 1980. Disciplinas como a matemática aos poucos deixam de ser uma língua estranha para os estudantes do país. Mas resta agora conseguir a próxima revolução: a inclusão dos adultos neste mundo de superação de obstáculos que tanto fala Piaget.
A educação de jovens e adultos tem sido uma constante do governo federal. Mas só agora se observam os primeiros resultados – e eficientes. Trata-se de uma prática que envolve atividades sistemáticas sustentadas na autoeducação, com intuito de obter novas formas de conhecimentos, habilidades, atitudes e valores que possam significar uma melhoria de aprendizagem dos adultos.
Busca-se através da escolarização tradicional e da alfabetização básica a realização das pessoas por meio da formação. Assim, a educação de jovens e adultos trata de uma filosofia específica: parte do pressuposto de que eles são capazes de assumir responsabilidades através da própria aprendizagem.
A Educação de Jovens e Adultos (EJA) é uma modalidade da educação básica destinada aos jovens e adultos que não tiveram acesso ou não concluíram os estudos no ensino fundamental e mesmo no ensino médio.
Um exemplo de uso da EJA para recuperação educacional dos estudantes pode ser encontrado em Trindade, município da região metropolitana de Goiânia. A cidade faz parte da EJA desde 2011 e recebe alunos de 20 a 80 anos de idade. A prefeitura determinou que a secretária de Educação e Cultura do município, Magda Batista, atuasse com dedicação ao projeto tendo em vista quebrar as barreiras que a modalidade educacional enfrenta.
A cidade tem mais de 280 alunos no período noturno do ensino fundamental do 1º ao 5º ano. Trindade oferece aos alunos um kit escolar com uma pasta que contém lápis, caneta, caderno, cola, tesoura e uniforme. Em sala, surgem modos de reestruturação da própria educação. Cada aluno apresenta sua limitação e o professor desenvolve parâmetros específicos para incluí-lo em um sistema simbólico, que vai dos números até as noções espaciais e geográficas. Tudo isso significa, em bom português, um banho de cultura educacional, pois oferece imensas possibilidades para a conquista da cidadania.
Leitura
Uma das escolas do município, Almiro Pereira da Silva, no Jardim Escala, adota o EJA em duas salas de aula, com aproximadamente 47 alunos.
José Ferreira Mendes, pedreiro, redescobriu a vida após fazer as pazes com a educação: ‘Quando cheguei em Goiás nem assinava meu nome, não sabia ler o destino dos ônibus. Passei necessidade por não saber ler. “Hoje, em primeiro lugar, agradeço a Deus e depois à professora, que me deram a oportunidade de mudar minha vida”.
Já Luzimar Lima Silva se emociona quando começa a falar de sua experiência: “Morava em Marabá, no Pará. Tem um ano que estou aqui. Cheguei pra morar com meus pais e resolvi estudar. Foi quando ouvi falar da EJA. Procurei e me matriculei. Estou gostando e se Deus quiser vou até o fim do curso”.
Maria Celia Soares, uma das alunas mais aplicadas da escola, reafirma a mudança de vida a partir da educação. “Sou vendedora, mas sem estudo, com a glória e a honra do senhor! Quando cheguei pra estudar na escola à noite tinha ido primeiro no setor Pedro Ludovico, em Goiânia. Pois bem: não tinha vaga para o ensino fundamental, que era o que estava procurando. Bom, vim aqui em Trindade, quando consegui uma vaga. Estou estudando e muito feliz. As professoras são ótimas. Já sei ler! Antigamente, chegava a certos lugares e não podia nem pedir um lanche. Não tinha leitura, não sabia preços das coisas. Hoje chego a qualquer lugar, sento, peço e pago o meu próprio lanche. Estou muito agradecida por todos que me ajudaram’’.
A secretária Magda Batista diz que o sistema do EJA é uma luta constante, mas que o educador jamais deve desistir da batalha. “Temos mais de 280 pessoas matriculadas. Tem gente com 20, 40, 50, 70, 80 anos. O EJA dá oportunidades. Além de oferecer aprendizagem para alunos que não tiveram chances de estudar antes, nós queremos proporcionar ensino de qualidade’’.
A professora Lúcia Mocó é uma obstinada no EJA. Ela desenvolve seu trabalho tendo como foco a recuperação do estudante para a cidadania. Para Lúcia, através da educação ocorre um agregamento significativo de valores na personalidade dos participantes. Cada passo na educação significa um direito social agregado na vida do cidadão. “Tinha muita curiosidade em trabalhar com o EJA. Era professora do ensino fundamental para crianças há mais de cinco anos no município. No fim do ano passado fui conversar com a professora Magda para ser locada no EJA. Ela se prontificou e me deu esta oportunidade. Senti algo, que poderia ajudar estas pessoas que não tiveram chances de estudo na vida. Hoje, ajudo e aperfeiçoou meus conhecimentos, já que a cada interação com eles sou obrigada a me desdobrar em habilidades e modelos educacionais. Tenho orgulho de cada conquista. É emocionante sentir a transformação destas vidas ”.
EJA é direito humano fundamental
A Educação de Jovens e Adultos (EJA) é uma concepção ampliada de educação de jovens e adultos no sentido de não se limitar apenas à escolarização, mas também a reconhecer a educação como direito humano fundamental. Através dela ocorre a constituição de jovens e adultos autônomos, críticos e ativos frente à realidade em que vivem.
A idade mínima para ingresso é de 15 no ensino fundamental e 18 anos no ensino médio.
O sistema educacional brasileiro organiza o curso presencial da EJA da seguinte forma: 1º segmento/ Ensino Fundamental – Anos Iniciais, com duração de quatro semestres e carga horária de 1.600 horas; 2º segmento/ Ensino Fundamental – Anos Finais, com duração de quatro semestres e carga horária de 1.600 horas; 3º segmento/Ensino Médio, com duração de três semestres e carga horária de 1.200 horas.
presencial ou telematrícula
Os procedimentos para a matrícula na educação de jovens e adultos presencial podem ser realizados no telefone 156 Telematrícula, nos períodos estabelecidos semestralmente. O estudante poderá concorrer a vaga em duas escolas de Educação de Jovens e Adultos de sua escolha. No momento da ligação, o aluno deverá informar seu nome completo, endereço residencial ou do local de trabalho.
A divulgação da lista dos inscritos pela Telematrícula será feita nos sites das secretarias de educação de cada município e nas escolas que oferecem a EJA. A efetivação da matrícula ocorre na escola em que o estudante conseguir a vaga. Após o período de matrícula, as vagas remanescentes são disponibilizadas nas secretarias das escolas.