Cultura

A maior expressão da música italiana no Brasil

Redação DM

Publicado em 26 de janeiro de 2017 às 01:18 | Atualizado há 6 meses

Dick Danello nasceu Filippo D’Anello, em Belvedere Marittimo, Calábria, Itália, 1943. Ainda criança já começava a dar seus primeiros passos dentro do mundo da música, cantando no Convento dei Cappuccini, pouco antes de se mudar com toda a família para o Brasil, da década de 1950, acompanhando o pai, que acabara de abrir negócios no país. Já em 1964, Dick iniciava sua carreira como músico profissional, lançando seu primeiro disco, “Reino da Juventude”, com participação de Sérgio Reis.

Nessa mesma década, a presença de Dick Danello no programa Jovem Guarda, da TV Record, apresentado por Roberto Carlos, era constante. Dick Danello tornou-se uma das maiores expressões da música italiana no Brasil, dentro da movimentação cultural que surgia, a Jovem Guarda, que era sinônimo de comportamento, moda, música. Apelidado pelo Rei Roberto Carlos de Italianíssimo, Dick Danello fez carreira cantando em italiano e divulgando a música de sua terra natal para os ouvidos brasileiros.

Na década de 1980 Dick passa a apresentar o programa radiofônico Parlando D’Amore, divulgando a música popular italiana. O programa passou por estações como Rádio Capital e Rádio Gazeta, recebeu diversos prêmios, e foi considerado pela Câmara Municipal de São Paulo um produto valorizador da cultura italiana e, consequentemente, da cultura paulista. O programa está no ar até hoje, e é objeto de pesquisa de acadêmicos de comunicação da Universidade de São Paulo.

Atuou também como produtor musical para o cinema, tendo produzido trilhas sonoras para vários filmes produzidos na Boca do Lixo, em São Paulo. Um destes filmes é Sinal Vermelho–As Fêmeas, primeiro filme de pornôchanchada estrelado pela então jovem e belíssima atriz Vera Fischer. Dick Danello também foi responsável pela pesquisa musical para a trilha sonora da novela global Terra Nostra, um sucesso de audiência no horário nobre, no final dos anos 1990.

Dick Danello, talvez poucos saibam, foi apresentador do Festival de Sanremo, transmitido pela televisão brasileira. O Festival de Sanremo é um dos mais importantes festivais de música de todo o mundo, e o maior da Europa. Foi através de sua atuação como apresentador, que Dick lançou no Brasil nomes importantíssimos da música italiana, e tão familiares no cotidiano brasileiro desde então, como Laura Pausini e Andrea Bocelli.

Agora, em 2017, comemorando os mais de cinquenta anos de carreira, Dick Danello lançará sua biografia, organizada pelo produtor cultural Rafael Spaca, narrando fatos conhecidos e particulares de sua vida de carreira. O cantor, radialista, compositor, ator, produtor e “italianíssimo” Dick Danello falou ao DM Revista sobre passado, perspectivas para o futuro, e memórias da Jovem Guarda.

 

Entrevista com o cantor e radialista Dick Danello

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DM Revista: Dentre tantos países no mundo, o que o fez escolher o Brasil para residir?

Danello: Na verdade não fui eu quem escolheu o Brasil, mas sim meu avô materno que se aventurou em vir para o Brasil, e no ano de 1953, meu pai Fortunato D`Anello veio aqui em São Paulo, abrindo uma alfaiataria no Bom Retiro, e posteriormente ele pediu para a minha mãe Rosaria se eu gostaria de vir. Claro que eu adorei a idéia, mas como eu tinha apenas 12 anos de idade, só poderia viajar acompanhado do meu tio. E isso aconteceu em 1955, quando eu saí da cidade de Nápoles com o navio Augustus, e depois de quase 25 dias cheguei ao Brasil. Era o sonho de muitos italianos imigrantes sair da Itália para se aventurar em ir para a “América”. Ninguém falava em Brasil, Argentina ou outro país e sim: América! Era muito difícil no começo, porque minha mãe, e meus irmãos ficaram lá, mas aos poucos fui me acostumando. Depois de dois anos aqui com meu pai, resolvemos chamar toda a família.

 

DM Revista: Que detalhes novos sobre sua vida e carreira estarão contidos na sua biografia?

Danello: No livro que estou escrevendo sob a supervisão do jornalista Rafael Spaca, não se trata apenas da minha biografia que é cheia de acontecimentos, mas também, principalmente, quero dar um estímulo de encorajamento às pessoas, para que nunca deixem de acreditar nos seus sonhos. O importante é acreditar principalmente em você, e nunca desistir. O meu lema sempre foi e é: “nas derrotas é que eu triunfo mais”. Porém você tem que ter as idéias claras, objetivos, finalidades, etc. Na verdade, quero que esse livro ajude as pessoas a lutar sempre. Neste livro que se chama Grazie Musica, conto curiosidades dos bastidores da Televisão, do Rádio, enfim coisas que aconteceram comigo, e também como surgiram as idéias, e como colocá-las em prática.

 

DM Revista: Gostaria que relembrasse os tempos em que o senhor compusera trilhas sonoras, além de atuar na produção musical cinematográfica, na Boca do Lixo, em São Paulo. Em especial, um clássico da pornochanchada, “Sinal Vermelho – as Fêmeas”, estreia da gloriosa Vera Fischer no gênero.

Danello: Eu já era muito conhecido do público, principalmente em São Paulo, quando fui convidado para atuar como cantor/ator no filme de Fauzi Mansur, “A Ilha dos paqueras”, com Renato Aragão, Dedé Santana, Berta loran, Martin Francisco, Dino Santana e outros. Foi a partir desse filme que eu compus a primeira trilha sonora. Depois fiz a trilha do filme “Cio–Uma verdadeira história de amor”, e a canção tema “Passion love theme”. Foi um enorme sucesso e é até hoje um clássico do cinema brasileiro. Esta canção foi gravada também pelo saudoso Altemar Dutra. Na sequência, me convidaram para fazer a trilha sonora do primeiro filme da Miss Brasil Vera Fischer. Foi mais um momento maravilhoso da minha vida como compositor, porque na época, não existia na “Boca do Lixo” alguém que usava orchestras nos temas, eu fui o pioneiro. Eu tinha uma parceria com a RCA, a mais importante gravadora do mundo, e me davam toda a liberdade para gravar com os mais renomados maestros, como aconteceu com Waldomiro Lenke, Daniel Salinas, e outros. A canção tema do filme “As fêmeas”, fez parte da novela “Fogo sobre terra” da Rede Globo.

 

DM Revista: Ainda falando sobre trilhas sonoras, o senhor atuou como pesquisador para a global Terra Nostra. Como surgiu este convite? Como se deu este trabalho?

Danello: Eu já era conhecido no meio musical e também na Rede Globo, e quando surgiu a novela “Terra Nostra”, a Som Livre, gravadora da Rede Globo, me convidou para fazer uma pesquisa para a trama desse épico de Benedito Ruy Barbosa. Fiz, uma lista de canções antigas italianas, dos anos 30 e 40, e foram gravadas por vários artistas. Uma canção que foi muito executada foi “La signora di trent’anni fa”, gravada pelo Emilio Santiago. O CD vendeu muito. Enfim, foi um grande sucesso de venda e de execução.

  

DMRevista: Como o senhor se sente, tendo estado à frente das exibições anuais para a tevê brasileira, do Festival de Sanremo, um dos mais importantes festivais musicais da Europa, e talvez do mundo, tendo a sua pessoa sido um dos responsáveis por lançar para o Brasil grandes nomes da música italiana, como Laura Pausini e Andrea Bocelli?

Danello: No meu livro, conto também a façanha do Festival de Sanremo, que teve o seu início em 1951, na Ligúria. Eu estava na Itália em 1985, depois de ter participado do Midem em Cannes, uma feira de música que existe até hoje, e eu negociava música com outras gravadoras internacionais, pois eu tinha uma empresa chamada Central Park Records. Estando em Roma, fui até a Rai, e com muito jeito consegui me aproximar da direção internacional da TV Italiana, e consegui negociar com eles o Festival de Sanremo de 1985, que apresentei pela TV Band, em quatro programas em horário nobre. Foi quando, pela primeira vez, apareceu Eros Ramazzotti. Nos anos seguintes também negociei para a TV brasileira outros festivais, e lancei em 1994 Laura Pausini com “La solitudine” e em 1995 Andrea Bocelli com “Il mare calmo della sera”. Claro que tudo isso pra mim é um grande orgulho, de poder ter trazido para o Brasil, o “maior evento da música italiana de todos os tempos”

 

DMRevista: O senhor tem sido um grande divulgador da música popular italiana no Brasil, principalmente a partir dos anos de 1980, quando passa a apresentar o programa de rádio Parlando D’Amore. Qual a repercussão deste importante trabalho que o senhor desenvolve, entre o meio cultural italiano? O senhor costuma receber feedbacks de seus conterrâneos a respeito desse trabalho de divulgação que desenvolve?

Danello: O Programa de rádio “Parlando D’Amore”, há 34 anos no ar, passou por várias emissoras, e logo depois do carnaval volto a apresentá-lo na Rádio Capital, aos sábados às 9 da noite. Este programa é um marco da música italiana no Brasil. Sempre que um artista italiano vem ao Brasil, vem para o meu programa, que também é conhecido na Itália. Já ganhei prêmios pelo programa, mas o mais importante é saber da grande audiência do mesmo. Muitas pessoas começaram a estudar italiano por causa do programa, e muitas outras se casaram por causa das músicas românticas que eu apresento. Só toco canções que eu acho que o público vai gostar. Não toco músicas do hit-parade, só porque estão na mídia. Faço primeiro o meu gosto particular

 

DMRevista: Recentemente assisti num programa de televisão, cantores japoneses que imigraram para o Brasil, a fim de fazer sucesso, interpretando canções clássicas da música pop nacional. Ao contrário, você se manteve cantando músicas em italiano. O que você pensa sobre artistas que saem de seu país natal para fazer sucesso em outra pátria, mas que não levam consigo sua essência, suas raízes?

Danello: Eu nunca mudei. Sempre fiz música italiana, e canto música italiana. É exatamente por isso que, modestamente, sou respeitado. Nunca mudei o meu jeito de ser e de pensar. Quando eu acredito em alguma coisa, vou até as últimas consequências. Por isso, atuo nos navios da Costa Cruzeiros, nos temáticos, Prata All’Italiana, Natal Italiano, Juke Box Italiano há 29 anos ininterruptos. Nada contra aqueles que fazem os japoneses, mas também devemos levar em conta que a música italiana tem um grande apelo internacional, e isso facilita e em muito o meu trabalho.

 

DMRevista: Além do lançamento de sua autobiografia, quais os planos para este ano que acaba de começar?

Danello: Apesar da grande dificuldade em lançar um livro, pois o custo é muito alto, estamos trabalhando para receber apoios de algumas editoras. Muitas pessoas estão interessadas em ajudar e acreditam neste projeto. Eu agradeço “di vero cuore”, a todas essas pessoas, como a você, jornalista querida Khryst, pela oportunidade, e também juntamente com este livro, estou pensando em lançar um CD, e fazer shows juntamente com o lançamento do livro Grazie Musica.

 

DMRevista: Nos anos de 1960, seu nome figurava entre tantos outros, num movimento artístico e cultural que viria a se chamar “Jovem Guarda”, tempos dourados da música autoral e comportamento brasileiros. O senhor ainda tem boas relações com seus antigos colegas da Jovem Guarda? Gostaria que mencionasse alguma situação curiosa ou emocionante que pôde vivenciar ao lado de Roberto Carlos, aclamado como o “Rei”.

Danello: Com relação à Jovem Guarda, tenho muitas coisas, aliás as menciono nesse meu livro, mas uma das coisas que mais me marcaram foi porque quando eu me apresentava no Teatro Record, sempre vestia ternos confeccionados por meu pai. Foi por causa dos meus ternos super bem feitos e que o Roberto gostava muito do meu look que surgiu a expressão “E agora com vcs, o italianíssimo Dick Danello”. Foram momentos maravilhosos, que o tempo não vai apagar. Um dos momentos marcantes da minha vida artística foi em 2015, quando representei a Itália, no palco da Av. São João, especialmente feito para a Jovem Guarda, na “Virada Cultural”. A praça lotada, cantando as músicas italianas dos anos 60 e 70. Foi inesquecível! Tenho amigos até hoje e que às vezes nos falamos: Jerry Adriani, Martinha, Gilbert, Lilian (Leno e Lilian), Nilton Cesar, Deny (Deny e Dino), Wanderléa, e muitos outros. Enfim, a história continua. e… arrivederci!.

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