Teus olhos iluminam uma cidade de sete milhões de habitantes
Redação DM
Publicado em 13 de janeiro de 2017 às 01:43 | Atualizado há 9 anos
Nelson Rodrigues bateu palmas e afirmou, com sua casa feia, de tarado, que escondia as melhores frases: “Não tem para ninguém, barbada, meu filho, ninguém representa a ideia de pecado e liberdade ao mesmo tempo como essa minha Engraçadinha”.
Tio Nelson falou e está falado. Carioca, ela já nasceu para o pecado. Lá vem ela, pasme, como me sopra nos ouvidos Jorge Ben Jor, em Oba, lá vem ela. Pele dourada, corpo pecaminoso, que resplandece como a chama de um isqueiro pronto para acender um cigarro. Maia é uma típica personagem literária.
Seus olhos de ressaca, sinuosos, poderosos têm força para iluminar uma cidade de sete milhões de habitantes. Por mais peculiar que possa parecer, falei-lhe esta frase quando estava com a cerveja correndo pelas veias, após um sonoro pé na bunda, às 2 da madrugada. “Cê deveria escrever um texto com esta frase”, afirmou. Não acreditei, e demorei em pô-la no papel. Antes tarde do que nunca (risos).
Maia, quando caminha às 7 horas da manhã, discorrendo sobre os rumos do mundo, me parece uma personagem que pulou das páginas de algum livro do Henry Miller. Seu jeito místico consegue apaziguar meu matutino mau-humor sulista. Ela gesticula, sussurra, diz, afirma. Maia nasceu para ser livre, e não tolera as mentiras propagadas com esforço por bons samaritanos. “Não sou obrigada”, declara.
Aliás, este mantra me foi aconselhado várias vezes por ela. “Cê não é obrigado a nada”, me aconselha. Evidentemente, antes de conhecê-la, eu estava preso a pessoas pouco expressivas, que não me acrescentavam nada. “Beck, nunca vou desistir de você”, completa. “Vou sempre estar aqui com a mão esticada para você se apoiar”, completa, fazendo meu coração bater calma e tranquilamente.
Obviamente, houve alguns momentos em que ela quis me matar. E isto, provavelmente, deve-se aos meus comentários repletos de sarcasmo, que vinham nas horas menos propícias. Não sei muito bem, mas o humor funciona para mim como uma forma de me libertar, de pôr para fora todas as coisas que não posso falar no horário comercial, onde ninguém se esforça para dizer a verdade. “Você é um rabugento legal”, me disse ela.
Devo reconhecer, Maia sempre lidou muito bem com as indecências que falo. E não há nada mais sublime do que vê-la sorrir às 7 e meia da manhã, antes de irmos assistir uma das monótonas aulas do curso de Jornalismo, da PUC Goiás. Parece que ganhei um presente: fazê-la sorrir. Ganhei-o, de fato. Deve ser por isso que sempre tento lhe arrancar algum sorriso. É por isso que faço meus comentários à lá gonzo.
Delírios à parte, dificilmente alguém vai tomar o lugar dela. Mesmo que rolem comentários tão sórdidos quando a reforma da previdência do digníssimo Michael Temer. Mesmo que as moças desprovidas de formosura, beleza e talento trabalhem no alto de suas verborragias murchas, Maia continuará a iluminar minha mente, minha alma, meus sentidos.
Teus olhos, Maia, iluminam uma cidade de sete milhões de habitantes, como tua terra natal, o Rio de Janeiro.
(Marcus Vinícius Beck, escritor)