Direito Previdenciário e Direito Médico
Diário da Manhã
Publicado em 3 de agosto de 2018 às 23:00 | Atualizado há 7 anos
Lei 13.457/2017: “Lei do pente fino” – novidade do INSS de cancelar mais de 80% dos benefícios por incapacidade: Auxílio-doença, Aposentadoria por invalidez, Auxílio-acidente e “LOAS” (Benefício de Prestação Continuada – BPC)
A Lei nº 13.457/2017 é fruto da aprovação da MP 767/2017, editada no início do ano de 2017. Essa lei dispõe sobre:
I – Aposentadoria por invalidez
1.1 – Exames médicos periódicos
A Lei de Benefícios Previdenciários (Lei nº 8.213/91) determina que o segurado que estiver recebendo auxílio-doença, aposentadoria por invalidez ou a pessoa que estiver recebendo pensão e for inválida (pensionista inválido) são obrigados a se submeter, periodicamente, a exames médicos, a cargo da Previdência Social, a fim de que seja verificado se a situação de incapacidade/invalidez continua. Caso se recusem a fazer esses exames, o benefício é suspenso (art. 101 da Lei nº 8.213/91).
O Regulamento da Previdência Social (Decreto 3.048/99) afirma que essas pessoas deverão fazer esse exame médico no INSS de dois em dois anos. Esse, contudo, é um prazo máximo. Antes de completar dois anos, tais pessoas poderão ser convocadas pelo INSS para fazer novos exames médicos, sempre que a Previdência entender necessário (art. 46, caput e parágrafo único). De seis em seis meses, por exemplo.
Nessa perícia que será feita, o perito terá acesso aos prontuários médicos do periciado no Sistema Único de Saúde (SUS), desde que haja a prévia anuência do periciado e seja garantido o sigilo sobre os dados dele (§ 4º do art. 101 da Lei nº 8.213/91, inserido pela Lei nº 13.457/2017).
É assegurado o atendimento domiciliar e hospitalar pela perícia médica e social do INSS ao segurado que esteja com dificuldades de locomoção, quando seu deslocamento, em razão de sua limitação funcional e de condições de acessibilidade, imponha-lhe ônus desproporcional e indevido (§ 5º do art. 101 da Lei nº 8.213/91, inserido pela Lei nº 13.457/2017).
Se a perícia médica do INSS concluir pela recuperação da capacidade laborativa, o benefício é cancelado, observadas algumas regras de transição caso a pessoa já estivesse recebendo há muito tempo a aposentadoria por invalidez (art. 47 da Lei n.° 8.213/91).
1.2 – Lei nº 13.457/2017 acrescenta o § 4º ao art. 43
A Lei nº 13.457/2017 acrescentou o § 4º ao art. 43 da Lei nº 8.213/91 reforçando essa possibilidade de o INSS convocar a qualquer momento o segurado aposentado por invalidez.
E essa possibilidade é conferida ao INSS mesmo que a aposentadoria por invalidez tenha sido concedida judicialmente. Por exemplo: o segurado ajuizou ação previdenciária e o juiz federal concedeu a aposentadoria por invalidez com base em perícia judicial que constatou a existência de incapacidade total e permanente para o exercício de atividades laborais. Esta decisão transitou em julgado.
Alguns meses ou anos depois, o INSS, por força deste § 4º acima, poderá convocar o segurado para que ele seja submetido a nova perícia administrativa e, caso seja constatado que aquela invalidez que se imaginava ser permanente, não existe mais, a aposentadoria por invalidez poderá ser até mesmo cancelada administrativamente.
1.3 – Todavia, há exceção a essa regra:
O aposentado por invalidez e o pensionista inválido não mais precisarão se submeter aos exames médicos periódicos em duas situações, ou seja, para esses casos não poderá, o INSS, cancelar o benefício:
1º) quando tiverem mais de 55 anos de idade e já estejam com a invalidez há mais de 15 anos; ou
2º) quando tiverem mais de 60 anos (não importando, neste caso, o tempo de invalidez).
Trata-se do § 1º do art. 101 da Lei nº 8.213/91, com redação dada pela Lei nº 13.457/2017. Por exemplo: o segurado, aos 50 anos de idade, passou a receber aposentadoria por invalidez. Bienalmente, ele deverá ir até o médico perito do INSS, que o examinará para saber se a invalidez persiste. Quando completar 60 anos, João estará isento de tal dever.
1.4 – Ademais temos as exceções da exceção:
Como vimos acima, o § 1º do art. 101 da Lei nº 8.213/91 prevê duas exceções nas quais o aposentado por invalidez ou pensionista inválido estará dispensado dos exames periódicos.
A Lei previu três situações em que, mesmo a pessoa se enquadrando nos incisos I ou II do § 1º do art. 101 acima, ela continuará obrigada a fazer o exame médico. São esses os casos:
I – quando o exame tiver por finalidade verificar se o beneficiário inválido tem uma invalidez tão grande que ele precisa receber assistência (ajuda) permanente de outra pessoa (Exemplo: enfermeiro(a)). Isso porque, nesse caso, esse beneficiário terá direito de receber um acréscimo de 25% sobre o valor do benefício, conforme dispõe o art. 45 da Lei nº 8.213/91.
II – quando o próprio aposentado ou pensionista solicitar o exame do INSS por entender que recuperou a capacidade de trabalho (hipótese improvável na prática);
III – quando o exame médico for feito para subsidiar o juiz que estiver analisando se concede ou não a curatela em favor do beneficiário inválido. Isso porque a Lei nº 8.213/91 prevê que, no processo de curatela, o magistrado poderá louvar-se (aproveitar-se) do laudo médico-pericial feito pela Previdência Social (art. 110, parágrafo único).
No que tange à aposentadoria por invalidez, a Lei nº 13.457/2017 apenas acrescentou este § 4º acima mencionado e mudou o § 1º do art. 101. Em linhas gerais, as demais informações acima explicadas já estavam previstas na Lei nº 8.213/91.
II – Auxílio-doença
Consiste em um auxílio-doença, o benefício previdenciário pago mensalmente pelo INSS, ao segurado do regime geral da previdência social (RGPS) que ficar incapacitado de exercer o seu trabalho ou a sua atividade habitual por mais de 15 dias consecutivos. Esse benefício encontra-se previsto nos arts. 59 a 63 da Lei nº 8.213/91.
2.1 – É benefício temporário
O auxílio-doença é um benefício temporário. Isso porque a incapacidade que acometeu o segurado não é permanente. O auxílio-doença deve ser mantido até que o segurado seja considerado reabilitado para o desempenho de atividade que lhe garanta a subsistência. Se a incapacidade for permanente, o caso é de aposentadoria por invalidez.
2.2 – Alta programada
O perito do INSS, quando constata que o segurado está incapacitado temporariamente para o trabalho ou suas atividades habituais, já fixa, no laudo pericial, uma data que ele presume que o segurado estará com sua saúde restabelecida.
Em outras palavras, o médico do INSS faz uma estimativa de quanto tempo irá durar aquela enfermidade. Assim, o INSS, ao conceder o auxílio-doença, já estabelece a data de cessação do benefício (DCB). Vale ressaltar que o benefício é cessado na data fixada pelo INSS mesmo sem nova perícia. Esse procedimento da autarquia é chamado de “alta programada” ou Copes (Cobertura Previdenciária Estimada).
2.3 – Se chegar o prazo fixado pelo INSS e o segurado ainda estiver incapacitado, precisará requerer a prorrogação do benefício.
A alta programada é muito boa para a rotina de serviços do INSS e acaba gerando uma economia para a autarquia, com uma redução da quantidade de renovações do auxílio-doença. Isso porque muitos segurados não pedem a renovação do benefício antes da data da alta programada, fazendo com que o INSS evite a realização de muitas perícias. Esse número iria aumentar bastante caso a autarquia tivesse que realizar uma nova perícia como condição para fazer cessar o benefício.
Dessa forma, a Lei nº 13.457/2017 teve como objetivo superar a jurisprudência majoritária que preconizava a ilegalidade da alta programada.
Para isso, a referida Lei determinou a imposição da alta programada para os auxílios-doença concedidos tanto na esfera administrativa como judicial.
2.4 – Sistemática imposta pela Lei nº 13.457/2017:
- REGRA: o ato de concessão ou de reativação de auxílio-doença, judicial ou administrativo, deverá fixar o prazo estimado para a duração do benefício (§ 8º do art. 60 da Lei nº 8.213/91).
- SE NÃO FOR FIXADO PRAZO: neste caso, o auxílio-doença cessará automaticamente após 120 dias, contados da data de concessão ou de reativação, exceto se o segurado requerer a sua prorrogação perante o INSS (§ 9º do art. 60 da Lei nº 8.213/91).
Vale ressaltar que, no ato de concessão do auxílio-doença, já deverá ser informado ao segurado que a alta está programada para aquele determinado dia, mas que este possui o direito de pedir a sua prorrogação. Dessa forma, a alta programada não impede a realização de perícia para se aferir a necessidade ou não de manutenção do auxílio-doença. Ela apenas exige, como condição para que seja feito o novo exame, que o segurado requeira a prorrogação do benefício.
2.5 – Convocações a qualquer tempo
A outra novidade da MP foi acrescentar o § 10 ao art. 60 da Lei nº 8.213/91 reforçando o poder-dever que o INSS possui de, a qualquer momento, convocar o segurado que esteja recebendo auxílio-doença para que seja avaliado se ainda permanece a sua incapacidade.
2.6 – Recurso administrativo
O segurado que não concordar com o resultado da avaliação previsto no § 10 deste art. 60 poderá apresentar, no prazo máximo de 30 dias, recurso da decisão da administração perante o Conselho de Recursos do Seguro Social, cuja análise médica pericial, se necessária, será feita pelo assistente técnico médico da junta de recursos do seguro social, perito diverso daquele que indeferiu o benefício. (§ 11 do art. 60 da Lei nº 8.213/91, acrescentado pela Lei n] 13.457/2017).
2.7 – Redação do art. 62 da Lei nº 8.213/91
Comparação da redação originária e do art. 62:
Redação originária Redação dada pela Lei nº 13.457/2017
Art. 62. O segurado em gozo de auxílio-doença, insusceptível de recuperação para sua atividade habitual, deverá submeter-se a processo de reabilitação profissional para o exercício de outra atividade. Não cessará o benefício até que seja dado como habilitado para o desempenho de nova atividade que lhe garanta a subsistência ou, quando considerado não-recuperável, for aposentado por invalidez. Art. 62. O segurado em gozo de auxílio-doença, insuscetível de recuperação para sua atividade habitual, deverá submeter-se a processo de reabilitação profissional para o exercício de outra atividade.
Parágrafo único. O benefício a que se refere o caput deste artigo será mantido até que o segurado seja considerado reabilitado para o desempenho de atividade que lhe garanta a subsistência ou, quando considerado não recuperável, seja aposentado por invalidez.
A única mudança foi na redação e organização do art. 62, que foi separado em caput e parágrafo único.
III – Tempo de carência
A Lei nº 8.213/91 conceitua o instituto como o tempo mínimo de contribuição que o trabalhador precisa comprovar para ter direito a um benefício previdenciário.
3.1 – Revogação do parágrafo único do art. 24 da Lei nº 8.213/91
A Lei nº 13.457/2017 revoga o parágrafo único do art. 24 da Lei nº 8.213/91, que previa o seguinte: Havendo perda da qualidade de segurado, as contribuições anteriores a essa data só serão computadas para efeito de carência depois que o segurado contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com, no mínimo, 1/3 (um terço) do número de contribuições exigidas para o cumprimento da carência definida para o benefício a ser requerido.
Além de revogar este dispositivo, a Lei 13.457/2017 acrescenta o art. 27-A prevendo nova regra para cumprimento do requisito da carência em caso de perda da qualidade de segurado: No caso de perda da qualidade de segurado, para efeito de carência para a concessão dos benefícios de que trata esta Lei, o segurado deverá contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com metade dos períodos previstos nos incisos I e III do caput do art. 25 desta Lei.
IV – Perícias
Conforme se viu acima, um dos grandes objetivos do Governo ao se editar a Lei nº 13.457/2017 foi o de promover uma revisão geral, ou seja, um verdadeiro “pente fino” nos benefícios de aposentadoria por invalidez e auxílio-doença a fim de apurar se existem fraudes ou pessoas que estão recebendo mesmo já estando aptas a voltar ao trabalho. Isso exige, contudo, a realização de milhares de perícias nos segurados.
Para poder concretizar essa intenção, a Lei nº 13.457/2017 previu o pagamento de um bônus aos peritos do INSS que realizarem estas perícias. Assim, os peritos recebem R$ 60,00 por cada perícia que realizarem nos segurados que estejam recebendo aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença há mais de 2 anos. Estas perícias extras deverão ser realizadas fora do horário de expediente normal do perito.
Vigência
A Lei nº 13.457/2017 entrou em vigor hoje (27/06/2017), data de sua publicação. Vale ressaltar, no entanto, que quase todos os seus dispositivos já estavam produzindo efeitos por força da MP 767/2017.
Na prática, embora todas essas medidas estejam embasadas em lei, muitas irregularidades são cometidas pelo INSS. Desde a não concessão do melhor benefício que o segurado tem direito, até cálculos de benefícios errados, resultando em valores menores desses benefícios – nesse caso, passíveis de revisões com êxito. E agora, com a “Lei do pente fino”, o cancelamento dos benefícios por incapacidade de segurados que adquiriram seus benefícios inclusive, por determinação judicial.
Contudo, importante se faz nesse momento, um acompanhamento por profissional especialista na área previdenciária – antes mesmo do INSS cancelar o benefício, para que após a análise de cada caso específico, oriente e promova ações, com o objetivo de não permitir a violação de direitos dos segurados. Além disso, que o segurado possa continuar recebendo seu benefício por incapacidade, no momento em que mais necessita desse valor mensal, o qual substitui sua renda e oportuniza viver com o mínimo de dignidade, já que se encontra incapaz de exercer suas atividades habituais e laborais.
(Juliana Kotnik de Matos, advogada, com especialização em Direito Previdenciário, Direito Médico, Direito Tributário e Direito e Processo do Trabalho, MBA em Previdenciário e Direito e Processo do Trabalho – jukotnik.direi[email protected])