Opinião

PEC 241/2016: a única saída, ou a saída mais cômoda para alguns?

Diário da Manhã

Publicado em 28 de outubro de 2016 às 00:56 | Atualizado há 9 anos

Vivemos tempos difíceis. E o que torna mais dramático esses tempos atuais é a incapacidade intencional, por ser claramente ideológica, dos nossos governantes pensarem saídas que rompam com a já antiga – mas não desgastada – fórmula da culpabilização dos trabalhadores. Este atentado à Constituição, em forma de uma PEC, é a velha engenhoca das elites sendo preparada para moer a classe trabalhadora e retirar dela, seu maior bem, qual seja, sua esperança.

A PEC 241 que propõe o congelamento da evolução real dos gastos públicos primários por 20 anos (2017 a 2037) e, que só poderá ser revista após 10 anos de pleno vigor (após 2026) e, ainda, por iniciativa exclusiva do Presidente da República, decreta, não apenas a morte do Estado Social no Brasil e a da democracia, mas, como se não bastasse, institucionaliza a ideologia fundamentalista e fria dos mercados e o enfraquecimento do Poder Judiciário e demais instituições do Sistema de Justiça conforme consta na Nota Técnica n° 26 da Procuradoria Geral da República.

Os defensores da PEC do Congelamento dos Gastos Públicos que afeta, com mais rigor e prejuízo, a saúde e a educação, defendem que nenhum dispositivo desta Proposta estabelece a redução dos gastos, mas tão somente o seu congelamento. Contudo, parecem esquecer do fator demográfico, ou seja, corrigindo o aporte financeiro destinado à educação e saúde apenas considerando a inflação do ano anterior e, desconsiderando o incremento populacional e o crescente envelhecimento da população (dinâmica demográfica) determina-se o abandono institucional das gerações que deram suas vidas pelo Brasil e o desacolhimento de crianças, adolescentes e jovens pelo aparato público/estatal.

O mantra utilizado pelo Governo, na defesa desta famigerada PEC 241, tem sua centralidade na expectativa da geração de renda e de emprego no médio e longo prazo. Mas é preciso pensar criticamente sobre a natureza e destino desta renda gerada e em quais condições a classe trabalhadora estará inserida nestes empregos esperados. Sabe-se que a renda fica concentrada nos cofres dos empresários e, que pouco contribui para girar a economia. Sabe-se, ainda, por esforço do economista Bráulio Borges (Ibre/FGV) que, em relação à renda do trabalhador (esta sim, inteiramente aplicada na compra imediata de bens – portanto com alto potencial de fazer girar a economia) a tendência cristalina e certa é a de uma vigorosa redução do valor real do salário mínimo, o que se somará à já prenunciada reforma trabalhista. Um cenário de colapso social e, posteriormente, econômico.

A PEC do “Orçamento sem Povo” é uma opção política com consequências geracionais. Não continuar o incremento de investimentos em saúde e educação é desprezar os maiores e mais seguros multiplicadores fiscais. Há um verdadeiro consenso de que gastos em saúde e educação proporcionam retornos econômicos em proporções invejáveis e, o avesso é também verdadeiro, ou seja, economizar em saúde e educação é ter de gastar mais – com prejuízos solidificados e alguns até irreversíveis – no médio e longo prazo. Essa proposta de reforma do texto do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) não apregoa apenas um Novo Regime Fiscal, mas anuncia a instauração definitiva de um novo modelo de país com mais mercado e bem menos Estado.

O que muitos não querem debater é a existência de alternativas aos terríveis mecanismos dessa PEC e, claro, não estou falando apenas de (1°) aumento da carga tributária, (2°) nem da saída ensandecida do Governo imprimir mais dinheiro e, (3°) muito menos de deixar as coisas como estão e depois, dar um calote. Não é isso! Mas querem nos fazer crer que só nos restam estas três alternativas, todas elas ineficientes em solução e produtoras de consequências catastróficas. Se este fosse o único horizonte possível, entre a PEC 241 e qualquer uma das três alternativas acima, eu também optaria com a PEC 241. Mas não há outras possibilidades para enfrentamento dessa crise sem que se conceba tocar na educação e saúde do nosso povo?

Existem sim outros mecanismos que podem ser aplicados no sentido de buscar o equilíbrio fiscal no Brasil, tais como, instituir a cobrança de Imposto de Renda sobre os lucros e dividendos auferidos pelos donos e acionistas de empresas. Isso seria no mínimo lógico e justo, ou seja, taxar quem mais lucra e não cobrar somente dos pobres. Mas talvez você esteja pensando:     – Isso é aumentar a carga tributária! Não. Isso é universalizar a lógica do imposto de renda conforme já ocorre no mundo inteiro, exceto no Brasil e na Espanha.

Mas não é só implementar o imposto de renda sobre os donos e acionistas de empresas, o Brasil precisa de mecanismos mais efetivos  de combate à corrupção. Segundo o Procurador da República Deltan Dallagnol a corrupção no Brasil retira algo em torno de R$ 200 bilhões, por ano, dos cofres públicos. No Relatório da Transparency International que apresenta uma lista de países segundo o Índice de Percepção da Corrupção (IPC), o Brasil aparece com um IPC de 38 pontos, onde quanto mais próximo de 100 significa menos corrupto e mais próximo de 0, mais corrupto.

Mas existe também o problema da sonegação fiscal. O Governo Central precisa buscar novas estratégias, tecnologias e meios para intensificar e garantir mais eficiência ao combate à sonegação fiscal. E nem precisa pensar para responder à seguinte pergunta: quem sonega mais, os mais ricos ou a classe trabalhadora?  Segundo o “Sonegômetro” – placar que mede o quanto o Brasil perde por meio da prática de sonegação fiscal, de primeiro de Janeiro até hoje os sonegadores já roubaram dos cofres públicos mais de 440 bilhões de reais.

E aí, a PEC 241 conforme está tramitando é a única solução para o desequilíbrio fiscal brasileiro, ou seria a saída mais cômoda para as velhas elites? Atacar a corrupção, frear a sonegação fiscal e taxar os lucros e dividendos dos empresários é duro demais para eles. Assim, como optamos por um governo sem trabalhadores e trabalhadoras, que paguemos então o preço das reformas draconianas, porque já está claro que a PEC 241 é – na pauta das elites – a primeira de muitas outras, tais como a da previdência e a da reforma trabalhista.

 

(Márcio Greik Viana, professor e jornalista. [email protected])

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