E agora?
Diário da Manhã
Publicado em 11 de outubro de 2016 às 02:44 | Atualizado há 9 anosAmigos e leitores me provocam: e agora, como vai ser depois da derrota histórica do PT? Como se articularão as forças políticas no país? O Brasil tenderá para a direita e os trabalhadores terão diminuída sua representação no Congresso? Seremos reféns do imperialismo que se esconde por traz da globalização? E por aí vai…
Vamos por partes. De fato, o assim denominado Partido dos Trabalhadores sofreu uma derrota histórica nas urnas, país afora. Os números mostram que a outrora pujante agremiação encolheu, em número de votantes que sufragaram seus candidatos a prefeito e vereador. Pela primeira vez na história brasileira, a rejeição deu-se principalmente em relação ao partido – ao PT, ele próprio – e subsidiariamente aos seus filiados. Disseminou-se uma ojeriza visceral ao outrora dominante Partido dos Trabalhadores, com sua fachada de ética, moralidade e sensibilidade social, além de autoproclamada superioridade intelectual, como vanguarda (?) do pensamento político e filosófico moderno.
Seus dirigentes não têm a hombridade de reconhecer a derrota acachapante, pelo que insistem em explicações fantasiosas: culpam a mídia golpista, o governo ilegítimo, a espetacularização da Lava Jato, até a parcialidade de setores do Judiciário como responsáveis pelo tsunami eleitoral que os fez soçobrar nas eleições municipais.
Certo é que enorme contingente de eleitores do PT migrou para outros partidos; isso sem falar no eleitorado jovem, que em sua maioria preferiu as pequenas siglas emergentes – ou optou pela abstenção/anulação do voto, assim expressando sua rejeição à política e aos políticos, em geral.
Essa me parece ser a grande preocupação do momento: a descrença generalizada em relação à atividade política, ela mesma, bem como aos seus agentes e participantes. Isso porque a democracia, como regime em que o povo se governa a si mesmo, somente funciona com a ampla e consciente participação popular. Participação que vai além do simples ato de votar e ser votado. E se consuma no acompanhamento e na cobrança do eleitorado junto aos eleitos, que não devem servir-se do cargo para si mesmos, mas exercê-lo como “servidores públicos”, no interesse da sociedade e do país.
Quanto à possibilidade de o Brasil tender para “a direita” em consequência da derrota do PT, a assertiva parece inteiramente descabida. A começar pela dicotomia “esquerda” (os bons) e “direita” (os maus), que povoa o imaginário de tantas pessoas de boa fé. Fantasia inteiramente divorciada do mundo atual, que em nada se assemelha à França do século XVIII, nos dias que antecederam a Revolução.
Na verdade, o que derrotou o PT não foram concepções “direitistas” de governo, associadas ao neoliberalismo e quejandos. A bandeira eleitoral mais convincente para votar contra o PT foram os milhões roubados da Petrobrás e de outros organismos e estatais assaltados pelos donos do poder, ao longo 13 anos. Ou será que alguém ainda duvida que isso tenha acontecido, em escala gigantesca, beneficiando não somente o partido – o ético PT – como também as contas correntes dos impolutos companheiros?
No meu fraco entendimento – pessoa idosa e desatualizada que sou – de agora para frente os políticos brasileiros terão de deixar de lado o populismo “de esquerda” e agir com correção, competência e transparência. Até porque é inútil tentar esconder malfeitos e roubalheiras: na era da informática, tudo é registrado. Nem o perdão conferido pelo sacramento da confissão tem o poder de apagar tais registros, que se perpetuam para sempre. E são acessíveis a praticamente todos que os desejarem conhecer.
Quanto à falta de representação dos trabalhadores na política – tendo em vista a débâcle do PT – parece-me que a preocupação é procedente. De fato, o PT foi/é antes de tudo, um partido de sindicalistas do ABC paulista, mais do que uma agremiação de trabalhadores, voltada para seus problemas e vicissitudes. No Brasil, tivemos alguns líderes de ideias trabalhistas na linha do trabalhismo inglês. Dentre outros: Fernando Ferrari e Roberto da Silveira, preteridos por expoentes de esquerda vermelha e oratória populista, como Brizola e outros menos cotados.
Na reforma política que se faz necessária, haverá que ser fundado um autêntico partido trabalhista – imune à “Carta del Lavoro” fascista, que influenciou na criação do sindicalismo brasileiro, durante a ditadura de Vargas. E que se fez presente – naquilo que tem de pior – nos governos petistas, em boa hora defenestrados pelo impeachment previsto na Constituição de 1988. Que – lembre-se – não teve a assinatura dos constituintes do PT.
(Lena Castello Branco, escritora. E- mail: [email protected])