‘É preciso democratizar a mídia’
Diário da Manhã
Publicado em 30 de setembro de 2016 às 02:49 | Atualizado há 9 anos- Ex-ministro da Cultura aponta audiovisual, pontos de cultura e direito autoral como marcas
- Ex-secretário da Cultura de São Paulo diz que Fernando Haddad fez uma revolução na área
- Sociólogo vê golpe, ataca MPF, frisa que Lula é alvo, lê Leonardo Padura e não viu “Aquarius”
– Ferreira Gulag! [Uma referência aos Gulags, campos de extermínio, trabalhos forçados e de reeducação criados pelo Guia-Genial dos Povos, Josef Stálin]
E m um tom de descontração, o ex-ministro da Cultura da “Era PT”, tanto de Luiz Inácio Lula da Silva quanto de Dilma Rousseff, além de ex-secretário da Cultura de Fernando Haddad, prefeito marxista de São Paulo, o sociólogo graduado em Paris, França, Juca Ferreira, com um indefectível brinco na orelha, referia-se à diatribe entre Sérgio Sá Leitão e o velho poeta stalinista, que nutre ódio radical pelo PT, Ferreira Gullar. O gestor cultural participou, em Goiânia, de um fórum organizado, no Culturama, pela historiadora, especialista em Planejamento Urbano e expert em elaboração de Plano Diretor, a bela e radical Silmara Vieira.
Presidente da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas [Ubes], em 1968, aos 19 anos, eleito no congresso clandestino de Salvador, Bahia, do qual participou pela primeira e última vez em sua curta vida o estudante Marcos Antônio Dias Batista, desaparecido em maio de 1970, Juca Ferreira era da turma da luta armada. O MR-8 [Movimento Revolucionário Oito de Outubro], dissidência da Guanabara, a mais charmosa organização contra a ditadura civil e militar de 1964, como define o historiador Daniel Aarão Reis Filho. O revolucionário foi preso em setembro de 1969. O homem ficou em cana por três meses e 15 dias. Depois partiu para o Rio
– Embarquei para o exílio: Chile.
Com o golpe de Estado deflagrado pelo general Augusto Pinochet, ocorrido em 11 de setembro de 1973, que depôs o médico marxista Salvador Allende, ele acabou no refúgio das Nações Unidas. Depois, mudou-se para a Suécia. Ele fez, antes de voltar ao Brasil, pós-Anistia do general-presidente da República, João Baptista Figueiredo, Sociologia, em Paris. Animado, ele relata que a sua gestão no Ministério da Cultura é a continuidade da reinvenção protagonizada pelo cantor, compositor e bom baiano Gilberto Gil. O diálogo como método de trabalho, explica. A ampliação do conceito de cultura como marca, pontua. “Do-in antropológico!”
– Valorizamos as múltiplas formas de cultura…
Audiovisual
O ex-ministro da Cultura informa com exclusividade para o Diário da Manhã, sob os olhares da rebelde Silmara Vieira, ter criado uma política que classifica como consistente para o audiovisual. Os números mostram que, em 2002, o Brasil produzia 10 filmes por ano. Já em 2016, a produção atinge 150 filmes por ano no País, sublinha. Essa política iria ser estendida para novas linguagens, como a música, o teatro, a dança e a fotografia, adianta, com um ar de lamentação estampado no rosto cansado de lutas políticas e sociais. Os Pontos de Cultura tornaram-se referência na América Latina e até na Europa, destaca o gestor cultural.
– Criamos o Instituto Brasileiro de Museus criado. O direito autoral no Brasil foi modernizado…
O sociólogo afirma, sem medo de ser patrulhado, que o impeachment de Dilma Rousseff, sem ela ter cometido crime de responsabilidade, é golpe de Estado. Jurídico, midiático e parlamentar, atira. Para ele, existe identidade entre a queda de Manuel Zelaya, nacionalista que flertou com a Aliança Bolivariana para as Américas, ocorrida, em Honduras, no turbulento ano de 2009, e a deposição-relâmpago, em 24 horas, do progressista Fernando Lugo, no Paraguai, que faz fronteira com o Brasil, em 2012, com o impedimento de Dilma Rousseff. O ativista cultural e político lembra que as Forças Armadas da Venezuela apoiam Nicolás Maduro.
– As direitas balançam as árvores para ver se o fruto cai nos países de governos progressistas na América Latina. A única exceção é o Uruguai.
A denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal e acatada pelo juiz federal de Curitiba Sérgio Moro consiste em muita “convicção e pouca prova”, analisa. A estratégia é retirar Luiz Inácio Lula da Silva da disputa presidencial de 2018, aponta. De qualquer jeito, denuncia. O ex-presidente da República, por dois mandatos consecutivos – 2003-2006 e 2007-2010 –, que elegeu e reelegeu a ex-guerrilheira da VAR-Palmares e economista Dilma Rousseff em 2010 e 2014, é o alvo final da Operação Lava-Jato, executada pela Polícia Federal, Ministério Público Federal e Justiça Federal de Curitiba, avalia Juca Ferreira, hoje com 67 anos de idade. Bem vividos, frisa.
– A saída é construir uma Frente Ampla de Esquerda!
Leon Trotsky
O PSDB desistiu da democracia, afirma. Ele, que participou do Fórum Cidade, Cultura e Democracia, organizado por Silmara Vieira, insiste que Lula e Dilma Rousseff erraram ao não adotarem medidas para a democratização da mídia no Brasil. Bem-humorado, com um papo agradável, Juca Ferreira lamenta não ter assistido ainda no cinema o celebrado filme Aquarius, com a eterna musa Sônia Braga, e registra que devorou da primeira à última linha do romance histórico do maior escritor cubano vivo Leonardo Padura Fuentes, O Homem que Amava os Cachorros, que saiu, no Brasil, pelo selo da Boitempo Editorial, de Ivana Jinkings.
– Como ex-secretário de Cultura de São Paulo sou testemunha de que desde o primeiro dia de gestão de Fernando Haddad, a Folha de S. Paulo e o Estado de S. Paulo começaram a desconstrução de sua imagem!
O prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, reduziu em mais de 25% as mortes no trânsito na Capital, fuzila. Mais: diminuiu o tempo de viagem, atacou a especulação imobiliária com o novo Plano Diretor, que foi celebrado até pela ONU [Organização das Nações Unidas], metralha. Juca Ferreira narra que a gestão atual mudou a cara cultural da metrópole, regulamentou o carnaval de rua, tombou o samba como patrimônio cultural de São Paulo, investiu no Teatro Municipal e na Orquestra Municipal. Ele deveria ser o próximo candidato à Presidência da República pelo Partido dos Trabalhadores, propõe, animado, o ex-ministro.
Perfil
Nome: Juca Ferreira
Idade: 67 anos
Formação: É sociólogo graduado em Paris, França
Cargos: ex-ministro da Cultura de Lula e de Dilma Rousseff e ex-secretário de Cultura de São Paulo
Fórum: Ele participou do Fórum Cidade, Cultura e Democracia, organizado por Silmara Vieira, em Goiânia
Curiosidade: É ex-MR-8, organização mais charmosa da luta armada, como conceitua Daniel Aarão Reis Filho
Cronologia
1968 É eleito presidente da Ubes
1973 Com golpe, é exilado na Suécia
1980 Ele retorna ao Brasil pós-anistia
2002 10 filmes eram feitos no Brasil
2016 150 filmes são produzidos no Brasil
2018 Frente de Esquerda com Fernando Haddad