Reconheçamos: pegar Lula e os petistas virou birra, obstinação
Diário da Manhã
Publicado em 30 de setembro de 2016 às 02:15 | Atualizado há 9 anosNunca fui político de carteirinha, de usar camisetas, de gritar palavras de ordem, de fazer propaganda; mas também nunca fui um cidadão passivo, apenas vendo a banda passar, e grande parte de minha vida exerci meu direito de cidadão: votei em todos os pleitos e comandei vários pleitos, seja como juiz eleitoral, seja como presidente do TRE-TO.
No meu mister de rabiscar meus artigos e crônicas neste jornal, escrevi de tudo: sobre política, Justiça, causos, medicina popular e muita coisa mais. Mas após mais de um ano ininterrupto aqui no jornal fazendo esta interação com o leitor, fiz um retrospecto do que todos escreveram e escrevem e cheguei a uma conclusão: o Brasil que escreve, e o leitor que cobra, não estão atrás de Justiça mas dos petistas mais graduados.
Não compartilho da afirmação de que o “impeachment” foi golpe, pois o de Collor ocorreu da mesma forma, e não foi golpe; Zé Dirceu, Arlindo Chinaglia e outros graúdos do partido pediram muitas vezes a mesma providência contra Itamar e FHC, e não era golpe.
A imprensa sensacionalista grava manchetes em letras garrafais cada vez que um expoente do PT sofre um revés: foi assim com o dispensável espetáculo montado pela força-tarefa de Curitiba para anunciar a denúncia contra Lula; a prisão de Mantega também rendeu matéria para a mídia e as redes sociais, como se fosse um fato extraordinário, e não corriqueiro na tramitação de um processo.
Embora tenha usado de expressões fortes nos meus artigos, não antipatizo com ninguém em particular. O que combato é a corrupção, e as quase três décadas de magistratura ensinaram-me a ser justo. Nunca simpatizei com qualquer partido político, pois acho que é tudo farinha do mesmo saco, e eleição virou uma triagem para saber quem de pior a gente leva das Câmaras de Vereadores ao Senado para nos representar.
Mas, voltemos ao caso Lula.
Quando se abre um zape-zape, já se depara com uma gozação sobre a prisão do ex-presidente Lula; quando se entrevista o juiz Moro, vem a invariável pergunta: “Quando o senhor vai prender o Lula?”, e assim por diante.
Esta obstinação está fazendo com que a campanha contra a corrupção seja desvirtuada, pois ninguém pergunta por que ainda não prenderam Cunha, Renan, Jáder, os Maias do Rio Grande do Norte, e a catervagem que prolifera nas estatais? Por que não investigam o súbito e ilícito enriquecimento de tantos que anoiteceram pobres e amanheceram ricos na política? Por que se esquecem de certos ministros do Judiciário, como Lewandowski, totalmente comprometido com decisões já ensaiadas para rasgar nossa Constituição e como foi escolhido como Corregedor Nacional de Justiça João Otávio de Noronha, analfabeto em Direito, mas pós-graduado em tráfico de influência e decisões políticas?
Por que não chegam no Jucá, no Aécio, nos notórios picaretas que infestam o Parlamento e fixam o foco naqueles que só contam com os movimentos das ruas? Se a maior parte dos movimentos de rua são para não acabarem as mamatas como bolsa-família, imposto sindical, MST, auxílio defeso, benefícios da “lei Rouanet” e outros, isto absolutamente não justifica essa artilharia pesada dirigida apenas a Lula e ao PT, como se cada revés por eles sofrido fosse um troféu de guerra.
Esta guerra contra Lula e o PT está passando dos limites, como se eles fossem os únicos desonestos do mundo. Não aprovo a política petista, que imita a fracassada política de Cuba, da Venezuela, da Bolívia e de outras republiquetas que incentivam a luta de classes para reforçar o poder central, mas daí a centrar as baterias só em cima do PT e de Lula é muito diferente. Os grandes vigaristas, empencados de ações e inquéritos no Supremo, vivem transitando impunes no meio dos mais refinados ambientes, sempre sorridentes, rindo da nossa cara de otários. Só não se sabe se estão rindo PRA gente ou DA gente.
Temer, com esse mandato e com a improvável continuação da carreira política devido à idade, tem uma oportunidade de ouro para consertar o Brasil: baixar medidas reformadoras efetivas, esquecer conchavos e acabar com a corrupção, não só do PT, mas do seu PMDB, do PSDB de Aécio, do DEM de Agripino Maia e, enfim, de todos os partidos que mamam nas tetas do governo, sem se falar numa profunda reforma no Judiciário, que não tem moral para julgar ninguém com imparcialidade, enquanto políticos sem caráter e de conduta duvidosa continuarem a indicar ministros e desembargadores pelo quinto constitucional, em troca de decisões lá mais adiante.
Não adianta ninguém acusar Sérgio Moro de perseguir Lula, pois comparo o juiz a um brinquedinho de corda: só anda se alguém o acionar; Sérgio Moro não age “ex officio”, pois o dono da ação penal é o Ministério Público de Janot, e se Moro decreta uma medida é porque foi provocado pelo MP. Não podemos culpar esse bravo magistrado por ter condenado mais de cem pessoas no mesmo espaço de tempo em que o Supremo não condenou ninguém, e o único ato efetivo foi o recebimento da denúncia contra Cunha. Vivem mais de aconchavar soluções do que distribuir a Justiça.
Concordo com meu amigo Arnaldo Severo, advogado de nossa querida Aurora do Tocantins, que me mandou um zape ponderando: “Gozado! A maioria, em discurso combinado, fala que lugar de bandido é na cadeia, mas só enxergam e atacam os bandidos do PT. Por que não falam dos outros?” E Arnaldo não é petista.
Era nesse ponto que eu queria chegar: Essa radicalização está servindo é de desculpa para convencer o povo de que todo o mal do Brasil vem do PT, o que é um tremendo sofisma, ou seja, segundo a lógica, um argumento ou raciocínio concebido com o objetivo de produzir a ilusão da verdade, incorreta e deliberadamente enganosa. A tal ponto chegou essa obsessão, que partidários de Lula já se articulam para provocar um encontro “casual” entre ele e Moro com o fito de o juiz ser desacatado e poder ser dado como suspeito, pois o que Lula está passando é mesmo um martírio. E Moro não é culpado, pois o tal foro privilegiado faz com que os maiores picaretas se escondam nos escaninhos do Supremo aguardando placidamente a prescrição, enquanto os despidos desse asqueroso privilégio caem nas garras do intrépido juiz.
Esquecem-se de que muito pior que o PT é essa corja que – de vereador a senador – está nos saqueando a cada hora. E usando o PT como pano de fundo para se esconder e continuar a roubalheira.
Para que Moro ou qualquer outro magistrado possa agir, é preciso que o MP esqueça um pouco Lula e o PT e passe a buscar Renan, Aécio, Jáder Barbalho, Kátia Abreu, Agripino Maia, Romero Jucá e outros membros da imensa quadrilha que está usando o cargo e se enriquecendo da noite para o dia, sem dar explicações ao eleitor, e muito menos à Receita Federal.
(Liberato Póvoa, Desembargador aposentado do TJ-TO, Membro-fundador da Academia Tocantinense de Letras e da Academia Dianopolina de Letras, Membro da Associação Goiana de Imprensa (AGI), escritor, jurista, historiador e advogado, [email protected])