Política

MPF: não tenho provas, mas possuo ‘convicção’!

Diário da Manhã

Publicado em 16 de setembro de 2016 às 02:17 | Atualizado há 9 anos

  • Doutor da USP, Lincoln Secco diz que denúncia é perseguição e não descarta prisão de Lula
  • Economista, Markus Sokol vê denúncia tecnicamente vazia e um suposto ‘vale tudo’ na operação
  • Jornalista, Breno Altman aponta nova etapa do golpe de 31 de agosto para liquidar Lula e o PT
  • Doutor em Ciências Sociais, Flávio Sofiati frisa que acusação formal do MPF é uma peça de ficção

– Não houve  uma denúncia, mas uma clara declaração de perseguição política contra Luiz Inácio Lula da Silva [PT}.

 

É o que afirma o doutor do Departamento de História da Universidade de São Paulo [USP], Lincoln Secco. Sem  provas, com nítido caráter seletivo, a peça  serve como autodenúncia do procurador da República, Deltan Dallagnol, analisa o pesquisador

– Mas não duvido que Lula termine seus dias na prisão!

O escritor lembra que José Dirceu de Oliveira e Silva já havia  sido  condenado, sem provas nos autos, e com base na hoje descartada ‘Teoria do Domínio do Fato’. É  verdade, porém, que Lula não é José Dirceu, pondera o especialista em Karl Marx e PT

– E, por isso mesmo, ele acredita que bajulando a nova presidente do STF, Carmem Lúcia, poderá escapar.

Economista de São Paulo, Markus Sokol frisa que a denúncia é vazia do ponto de vista do direito. Tecnicamente, explica. A denúncia do Ministério Público Federal é, no entanto, política, acredita. A estratégia é a proscrição de Lula e do PT, denuncia.

– Dá a impressão de um vale tudo ou nada. Trata-se de uma conspiração aberta das classes dominantes.

Diretor editorial do Opera Mundi, site especializado em Política Internacional, Breno Altman [SP] é taxativo. É uma nova etapa do golpe institucional, aberto com a deposição a presidente da República, Dilma Rousseff, consolidado dia 31 de agosto, observa

– Para as forças conservadoras é fundamental impugnar política e eleitoralmente o ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, além de criminalizar o PT e os movimentos sociais [urbanos e rurais no Brasil].

Confessadamente sem provas, a denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal do Paraná é uma grotesca e pura retórica ‘antipetista’, ataca. Para cumprir a função política que os círculos mais reacionários esperam da Operação Lava Jato, atira.

Doutor da Universidade Federal de Goiás [UFG], Humberto Clímaco sublinha que a denúncia parece uma comédia de horrores. As provas foram dispensadas em nome de delações obtidas por meios duvidosos, insinuações colhidas a esmo, reclama ele.

– É Teoria do Domínio do Fato utilizada da maneira mais grotesca possível.

Não é um procedimento isolado, crê. Se dá como continuidade da Ação Penal 470 e coroada pelo Congresso Nacional, com destaque no Senado da República e a chancela do Supremo Tribunal Federal [STF], do impeachment de Dilma Rousseff, dispara.

– Sem crime de responsabilidade.

Indignado, Humberto Clímaco insiste que, dessa vez, formalidades e prazos foram dispensados, pois os procuradores e o juiz federal Sérgio Moro acreditam que o vento já estaria soprando para eles de maneira que não há com que se preocupar.

– A estratégia é fazer a ‘assepsia’ a que Ronaldo Caiado se referiu para ‘acabar com o PT e o petismo’.

Ele avalia, no entanto, que o sistema financeiro, o aparato jurídico e policial do Estado, o Congresso Nacional financiado com recursos privados e os conglomerados de comunicação podem estar lançando a agulha que faltava para ‘por fogo no palheiro’.

– O caldo pode entornar de vez para dar início a uma verdadeira revolta da população.

Doutor em Ciências Sociais da UFG, Flávio Sofiati é incisivo. “A acusação formal do MPF é uma peça de ficção”. Apesar das críticas à esquerda do modo petista de governar, ele diz que não há nenhum indício de ilegalidade na trajetória política de Lula.

– Trata-se de uma peça de ficção.

Doutora do Departamento de História da UFG, Alcilene Cavalcante diz que o MPF, na figura do procurador Deltan Dallagnol, ao apresentar denúncia na Operação Lava Jato, baseia-se apenas em convicções e ilações, sem comprovação alguma.

– O que estarrece os/as brasileiros/as pensantes, torna o Brasil um país menor perante o mundo e coloca em questionamento os cursos de bacharelado em Direito do País.

– No âmbito das ciências, elaborações e defesas de artigos acadêmicos, de monografias de final de curso, de dissertações de mestrado e de teses de doutorado, para além de opiniões, crenças e ideologias de seus autores/as, devem ancorar-se em provas.

A professora universitária Alcilene Cavalcante é incisiva. A comprovação é um quesito fundamental na elaboração de conhecimento científico, dispara a pesquisadora. Esse mesmo quesito é imprescindível na área jurídica, metralha ela.

Doutor em Geografia da UFG, o historiador Romualdo Pessoa Campos Filho crê que Lula já havia sido escolhido para ser o ‘alvo final’ da Operação Lava Jato. A Força-Tarefa ainda busca uma prova para culpá-lo, mas admite que possui apenas ‘convicção’.

– O Ministério Público tem somente um suspeito à espera de um crime para responsabilizá-lo!

 

Sem evidências

Advogada, uma das maiores especialistas em legislação eleitoral e direito administrativo do Centro-Oeste do Brasil, Ana Raquel Gomes e Pereira avalia que a denúncia oferecida pelo MPF é claramente política. “A peça jurídica carece de evidências”.

– A denúncia tem dois fins específicos: primeiro, acabar com qualquer chance de disputa de Lula nas eleições presidenciais de 2018, que ele lidera segundo o Datafolha, e, segundo, dificultar as eleições municipais disputadas pelo PT este ano.

Ao analisar a denúncia, Ana Raquel Gomes e Pereira observa que teria sido imputado a Lula o ‘comando máximo’ de um esquema que os Procuradores da República não conseguiram comprovar. Indícios e evidências ensejam investigação e não denúncia, frisa.

– Para denúncia são necessários e essenciais os fatos e as provas!

Advogado, Bruno Pena afirma que a denúncia em desfavor de Lula, sem Aécio Neves [PSDB-NG] e Michel Temer {PMDB-SP], citados em delações premiadas e gravações, acompanhada da assertiva de que não há provas, apenas convicção, mostra seu teor político.

– Nada tem de jurídico.

Edilberto de Castro Dias, advogado, frisa que, no seu entendimento, a denúncia contra o ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva é inepta. Não possui o requisito de provas, explica. Convicção não se coaduna com o Direito Penal, ataca.

– Muito menos com a Constituição Federal!

O também advogado Carlos Eduardo Ramos Jubé admite o que o procurador da República mesmo resumiu. Não há provas, apenas convicção, atira. Com 149 laudas, a denúncia do MPF tem pouca consistência jurídica e fática, fuzila. Muita retórica, acusa.

– Pirotecnia e nada consistente!

Jornalista de Brasília, Evando Aureliano Peixoto é crítico. A denúncia é uma aberração jurídica, desabafa. Uma acusação em forma de espetáculo em rede nacional, ironiza. Muito além do que de fato consta nos autos, ele exorciza papéis do MPF e da mídia.

– É muito mais que mera denúncia. É julgamento em praça pública. Com a condenação previamente definida entre procurador da República e juiz. Só faltou acender a fogueira. A atuação da tal força-tarefa é orientada politicamente. Está claro.

 

Comandante?

Diretor editorial do site nacional Brasil247.com e colunista da revista IstoÉ, Léo Attuch analisa que, apesar de rotulado pelo MP como ‘comandante máximo da propinocracia’, Lula ainda ocupa, hoje, um outro espaço no imaginário do eleitor brasileiro

– É, para milhões e milhões de brasileiros, o presidente que mais atenção dedicou aos humildes, com programas como Fome Zero, Bolsa-Família, ProUni. Não por acaso, deixou o Palácio do Planalto com 87% de popularidade, índice inédito de aprovação.

Se os pobres ficaram satisfeitos com o primeiro governo na história do Brasil conduzido por um ex-metalúrgico, e não das oligarquias, o mesmo se pode dizer dos mais ricos, frisa. A economia brasileira viveu seu período de maior prosperidade, diz.

– O Brasil se tornou a sétima economia global, acumulou mais de US$ 300 bilhões em reservas e atingiu o chamado ‘grau de investimento’ – o que permitiu que os grandes empresários lançassem ações em bolsa e se tornassem bilionários.

Léo Attuch crê em um momento único em que todas as classes sociais progrediram. A tal ponto que Jim O’Neill, criador da expressão Bric’s, definiu o ex-torneiro mecânico como o mais importante líder político do mundo nos últimos 50 anos.

– O cantor Bono Vox afirmou que Lula era um patrimônio do mundo. Barack Obama o definiu como ‘o cara’. De repente, tudo começou a desmoronar desde que foi colocado em marcha o projeto de destruição do maior líder popular da história do País, narra.

 

Populista e bolivariano

Sob os mais variados pretextos, explica. Para uns, Lula era ‘populista’, quando, na verdade, era apenas popular, conta. Para outros, era ‘bolivariano’, quando tão somente enxergava valor nos processos de integração sul-americana, confidencia ele.

– Ou antiamericano, quando era nacionalista.

Aos movimentos orquestrados pelas forças políticas derrotadas nas últimas quatro eleições presidenciais, se somou um ingrediente destrutivo: o preconceito de parte da elite, que, complexada, não se reconhece em seu próprio povo, denuncia.

– Tempos estranhos.

 

 

 

 

“Dá a impressão de um vale tudo ou nada. Trata-se de uma conspiração aberta das classes dominantes”

Markus Sokol, economista

 


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