Espelho, espelho meu
Redação DM
Publicado em 29 de julho de 2016 às 02:06 | Atualizado há 9 anosUm rapaz chega ao outro e diz:
– Como vai?
– Vou que nem espelho. Vou refletindo muito, sobre todas as coisas, amigo, diz o outro.
A resposta do interlocutor pode parecer engraçada, hilariante, diferente, mas não para as páginas 87-88 do Dicionário de Símbolos de Herder Lexikon, 1990, Editora Cultrix. Ali, a questão é lexicamente tratada em sentido nada cômico. Alí se apreende grave e austeramente que…
“Referindo-se à função reprodutiva e “refletora” do pensamento, ele, o espelho, “simboliza o saber, o autoconhecimento, a consciência, como a verdade e a clareza”.
Pode ser visto qual “símbolo da criação” a refletir a inteligência divina “e do coração humano e puro, que abriga em si, por exemplo, Deus (na mística cristã) ou a substância do Buda”.
O pensamento de Lexikon vai fluindo depois para expressões idiomáticas nas quais a gente se depara com a simbólica comparação: “Olho, ou rosto, como espelho da alma.”
A função reprodutora do espelho rende mais reflexões da parte do autor Lexikon.
“Em virtude de sua clareza, o espelho é um síbolo solar na qualidade de fonte indireta de luz, mas é também um símbolo lunar; devido a sua passividade, é um símbolo da feminilidade…”
Pelo que não surpreende a gente o fato das mulheres não desgrudarem os olhos daquele lago de prata.
Pelo que não surpeende a gente aquela velha indagação dos contos de fada: “Espelho, espelho meu, existe alguém mais bela do que eu?”
Aqui é que intervém o poeta, a fim de traduzir a “Mulher” que nem…
ESPELHO
Lago de prata de Narciso
onde a vaidade flutua
Expressão nua da verdade
de uma lágrima ou de um sorriso.
A “lágrima” ou o “sorriso” de tais versos ajeita-se naquilo que diz Lexikon sobre ser “espelho da alma”.
Retornando ao Dicionário de Símbolos, se lê que “…na China, é também um símbolo da sabedoria contemplativa e não-ativa”. Sendo que “no Japão, onde o espelho é um símbolo da pureza perfeita da alma com também da deusa solar, existe um espelho sagrado em inúmeros templos xintoístas.”
Seja lembrado, a respeito da expressão poética “lago de prata de Narciso”, que a semelhança “ótica com a superfície da água” (não nos esqueçamos que o vaidoso Narciso se contemplava assiduamente no espelho das lagoas) faz com que o espelho seja usado como símbolo da água nos ritos em que se pede chuva, alegria da seara.
A gente acredita fervorosamente que quando Deus fez homem e mulher a sua imagem e semelhança, tinha em mente a sua própria imagem refletida na superfície clara de um espelho. Sucede que nem sempre a imagem naquela superfície lisa, a criatura, se assemelha ao objeto real refletido, o Criador.
(Pedro Nolasco de Araujo, mestre pela PUC-Goiás em Gestão do Patrimônio Cultural, advogado, membro da Associação Goiana de Imprensa – AGI)