Lute como uma garota
Redação DM
Publicado em 30 de junho de 2016 às 01:55 | Atualizado há 5 mesesColocadas, muitas vezes, em um papel secundário na abordagem de movimentos sociais, elas são cada vez mais ativas e personagens de peso da luta
Historicamente, a presença de mulheres no front de lutas sociais é muito recorrente, estando no apoio ou como personagens principais. Muitos movimentos hoje contam com lideranças femininas, em diversas pautas, como luta trabalhista, moradia, acesso a serviços, à educação, enfim, é fácil observar que as mulheres são ativas e resistentes na luta por seus direitos.
Começando por um fato da história de luta trabalhista. No início do século XX, mil e quinhentas mulheres se juntam a um protesto por igualdade econômica e política. No ano seguinte, o movimento ressurge em um ato que reúne mais três mil mulheres. Esses protestos levaram à ocupação de cerca de quinhentas fábricas nos EUA.
Na Europa Oriental, quase cem mil operárias russas entraram em luta no ano de 1917. As pautas dessas trabalhadoras eram contra a fome, as condições de trabalho e a participação da Rússia na guerra. Esses são apenas alguns exemplos que aconteceram pelo mundo no correr da história, para exemplificar lutas em que as mulheres ocuparam o front.
[box title=”Dezembro de 2015, São Paulo”]
Nas movimentações estudantis do ano de 2015, que se espalharam por diversas cidades pelo País, a juventude de escola pública surpreendeu com sua força de luta. Pontos que devem ser lembrados foram a formação política que estes adolescentes construíram de forma independente e a presença e protagonismo feminino.
A página da Agência Patrícia Galvão, focada nas mulheres de luta, relata as ocupações dos estudantes, usando personagens que mostram a representação feminina. Como o caso de Marcela, a garota que foi vista no país inteiro em uma foto enfrentando um policial que tentava levar uma cadeira utilizada pelos alunos como símbolo em uma manifestação.
“No discurso ainda em formação da Marcela. Ela tem uma ascendência natural sobre seus colegas, ascendência que vem da empatia, da facilidade de comunicação e de uma certa leveza nos enfrentamentos. De certo que ainda não se impregnou do modelo mais sisudo da militância clássica. Tem, por exemplo, a inteligência de traduzir ‘empoderamento feminino’ por ‘as minas da linha de frente são zica’. Marcela é zica. As outras garotas da ocupação são zica também. Não tem musa. Não tem darling. Tem zica”– relata uma das postagens na página..[/box]
[box title=”Janeiro de 2016, Goiânia”]
Estudantes se mobilizaram e tomaram como ação a ocupação de colégios estaduais por toda a cidade. Assim como os jovens de São Paulo, a presença das meninas nos colégios ocupadas era extremamente representativa. O movimento começou no dia 9 de dezembro com a ocupação, em Goiânia, do Colégio Estadual José Carlos de Almeida (JCA), inativo desde 2014.
A rotina das ocupações incluía a limpeza da escola, oficinas, aulas públicas e eventos culturais divulgados via Facebook. A alimentação foi provida de doações da comunidade, inclusive mães que apoiavam a luta de suas filhas e filhos. Artistas locais e professores também contribuíram. Nas portas das escolas vários cartazes pediam recuo na implantação do modelo das OSs e enfatizavam: “Educação não é mercadoria”.
Em muitos colégios, as questões de gênero eram abordadas e respeitadas, como, por exemplo, no Colégio Estadual Bandeirante, que praticava no convívio diário o respeito à diversidade. Nos banheiros, colocaram cartazes que asseguravam o uso por transexuais, conforme o gênero com o qual se identificavam.
“Eu estudava no JCA quando ele foi fechado, primeiro foi a desculpa de uma reforma, depois de que não havia alunos suficientes para manter a escola funcionando. Eu estava viajando de férias, quando cheguei recebi a notícia de que a escola tinha fechado e que eu seria transferida para o Lyceu”, contou Narryra, uma garota de 16 anos que participou ativamente das ocupações, em entrevista à Agência Brasil..[/box]
[box title=”Junho de 2016, Goiânia”]
Este mês uma denúncia via redes sociais de um caso de estupro dentro da UFG causou uma grande movimentação. A denúncia acabou por não ser confirmada, porém, estudantes, servidoras e terceirizadas tiveram com esse caso o impulso necessário para lutar contra os abusos, o assédio e a falta de segurança aos quais estão expostas na universidade. Excetuando esse caso, várias pessoas perceberam que não seria o primeiro, nem o último caso de violência contra a mulher dentro da instituição.
Um dia após o ocorrido, centenas de estudantes fizeram uma manifestação na reitoria da universidade. Na ocasião, o reitor Orlando Amaral não apareceu para dialogar com os estudantes. Esse foi o início de uma ocupação que durou 12 dias na sede da reitoria da UFG.
O caráter dessa ocupação destoou bastante das movimentações estudantis clássicas, sendo de orientação feminista e com participação majoritariamente de mulheres. Com assembleias diárias abertas a participações de todas as vozes, mas, por questões do movimento, só mulheres (cis e trans) e homens trans tinham direito de voto.
Um movimento tão inédito foi alvo de críticas de várias orientações ideológicas, mas “As minas na reitoria da UFG”, nome dado ao grupo no Facebook, mantiveram uma resistência ativa. Elas permaneceram ocupadas até que o reitor da universidade assinou um documento se comprometendo a atender todas as reivindicações apresentadas pelo coletivo.
As pautas exigidas incluíam questões de segurança como: iluminação, participação na comissão de segurança, revitalização de áreas consideradas perigosas. Em questões mais amplas o documento pedia uma ouvidoria mais atenta às denúncias das mulheres, promoção de campanhas de conscientização pela universidade, acolhimento de vítimas de abuso e violência sexual e apurações mais rigorosas das denúncias de casos de assédio. Além disso, foi levantada a conscientização sobre a mulher negra e o racismo sofrido por elas como algo a ser combatido ativamente pela instituição.
Uma das integrantes do movimento, Mirna Anarquiri, estudante indígena, deu o seguinte relato: “As mulheres da UFG estão organizadas na luta, a proposta foi assinada e vamos cobrar todas as datas, mulheres indígenas exigem respeito e segurança dentro da universidade” enfatizou..[/box]