Cultura

A dor e luta das mães de maio

Redação DM

Publicado em 10 de maio de 2016 às 02:39 | Atualizado há 8 meses

Hoje é dia de celebração. Dia de presentear as mães e movimentar o comércio do país inteiro. Dia de almoço em família. Dia de presentes. Dia de declarações de carinho as mulheres que choraram com o nascimento de seus filhos. Dia de desolação das mulheres que choraram de desespero e dor quando seus filhos partiram. Dia de luto.

Maio de 2006, nas datas próximas ao tal dia das mães, a hora escolhida pra uma “limpeza” étnica e racial. Os números mostram mais de 500 mortes em menos de um mês. O perfil majoritário das vítimas, jovem negro de periferia. O perfil dos assassinos, policial militar do Estado de São Paulo.

A onda violenta foi atribuída ao PCC, o primeiro comando da capital, facção criminosa que organiza o crime principalmente em São Paulo. Assim foi o início do massacre, ataque do PCC à policiais, a polícia revidou e tomou embalo, resolveu então não parar até chegar a mais de 500 mortos. Muitos deles sem nenhum envolvimento com a facção.

Guerra de poder, morte na periferia

O poder e a violência são unidos em matrimônio eternamente. A polícia, o aparato pra manter o poder nas mãos dos mesmos, os donos dos meios. O crime, um poder paralelo instaurado na “marra” pela parcela a qual não caberia o poder. Os dois grupos tentam estabelecer seu domínio jogando mão das formas mais extremas de violência. O cidadão pobre no meio do tiroteio, tomando tiro pela frente e pelas costas.

Assim aconteceu com os filhos das mães de maio. Começando por Edson Rogério da Silva Santos, gari, 29 anos. Após um dia inteiro de trabalho servindo a prefeitura da cidade litorânea de santos, na limpeza urbana, foi abordado pela PM. Ele caminhava rumo a um posto de gasolina, quando foi agredido pelos policiais, de acordo com os presentes na data, mesmo aos gritos de “Sou trabalhador”, eles continuaram batendo.

Nem a documentação de Edson foi pedida pelos policiais. Após a surra os policiais perceberam que foram reconhecidos pelo trabalhador, de acordo com sua mãe. Ele foi executado com 5 tiros.

Do amor materno e da força, nasce a luta

Edson não foi o primeiro inocente assassinado nessa guerra, mas sua morte e a força de sua mãe, Débora Maria da Silva, originou o Mães de Maio. Débora depois da morte de seu filho, entrou em profundo estado de depressão e só conseguiu superar a doença quando decidiu reunir outras mães que partilhavam da sua dor.

“Via as mães chorando pelos crimes parecidos e fui procurando uma a uma. Nos juntamos, fomos para São Paulo. Em uma reunião do Condepe (Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana) me deparei com um massacre que ocorreu naquele mês. Vi que era um negócio muito grande. Saí determinada que eu tinha que lutar“

contou Débora em entrevista ao Ponte Jornalismo, em maio do ano passado.

No site do Mães de Maio, Débora conta que resolveu seguir o conselho que um promotor lhe deu a época “Investigue a senhora mesma a morte do seu filho, porque o processo não vai dar em nada”. De fato a previsão do promotor era certa e os crimes desse massacre permaneceram em maioria impunes.

Os números do massacre

A característica comum entre a maioria destes assassinatos: Execuções, sem chance de reação da vítima, a maioria com tiro na cabeça e no peito, muitos baleados pelas costas.

Os números são alarmantes. De acordo com o estudo intitulado “Análise dos Impactos dos Ataques do PCC”, dos 505 civis mortos, 118 foram assassinados em confronto com a polícia, 50 foram vítimas de execução sumária individual, 35 de execução sumária por grupo não encapuzado, 53 por grupo encapuzado, 4 foram executados sumariamente por policiais, 10 morreram em ataques a delegacias, 6 em conflitos interindividual, 2 em acidente ou bala perdida, 21 por “outros motivos” e 206 por razões desconhecidas.

Este trabalho de pesquisa foi realizado pelo sociólogo Ignácio Cano em 2009, pela UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro).

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