O escandaloso tráfico de influência no STJ
Redação DM
Publicado em 7 de maio de 2016 às 02:17 | Atualizado há 9 anosDias atrás, escrevi o artigo “Ministro perseguidor decide processos do próprio filho”. Confirma-se a denúncia de meu livro “Eu também acredito em lobisomem” (edição de 22/03/2016), no qual mostrei que o atual presidente do STJ, ministro Francisco Falcão, decidiu processos em que seu próprio filho, Djaci Falcão Neto.
Na esteira do combate que é sistematicamente feito ao STJ pelo consagrado historiador Marco Antônio Villa, li recentemente na “Folha de São Paulo” matéria do jornalista Frederico Vasconcelos, que amplia o leque de desconfianças que o jurisdicionados nutrem pelo Superior Tribunal de Justiça, autodenominado “O Tribunal da Cidadania”.
No seu bem colocado artigo, ele mostra, com clareza meridiana, como aquela Corte vem a reclamar a abertura de uma “caixa preta” que pode ludibriar o jurisdicionado, semeando a incerteza na imparcialidade de suas decisões. No meu mais recente livro, acima mencionado, o leitor pode certificar-se disso, pois narro, tintim por tintim, o caminho de um processo, cujo desfecho, totalmente à margem da lei e da lógica, iniciou-se com a ministra Nancy Andrighi, paradoxalmente incumbida de julgar os eventuais desvios de conduta de magistrados, como Corregedora Nacional de Justiça. Mas ela se recusa a apurar, por exemplo, a forma como o ministro Navarro Ribeiro foi nomeado para o STJ, com a especial incumbência de livrar da cadeia empresários envolvidos na Lava Jato, segundo delatou o senador Delcídio do Amaral; e, realmente, o ministro cumpriu o que prometera em troca da nomeação: foi o único voto vencido, pela concessão de HCs, no julgamento de empresários. Evidentemente, a apuração contra o ministro vai fazer a Lava Jato cair no colo do STJ. E aí a coisa vai pegar.
Segundo a matéria de Frederico Vasconcelos, estão registrados como advogados no STJ parentes de Francisco Falcão (presidente), Laurita Vaz (vice), Felix Fischer (ex-presidente), João Otávio de Noronha, Humberto Martins, Benedito Gonçalves, Paulo de Tarso Sanseverino, Sebastião Reis, Marco Buzzi e Marco Bellizze.
Em março passado, naquele meu mencionado artigo aqui publicado, falei que o presidente daquela Corte, ministro Francisco Falcão, proferiu quatro decisões todas favoráveis à parte representada por seu filho, o advogado Djaci Alves Falcão Neto (que, por linhas oblíquas, foi o responsável pelo afastamento e posterior aposentadoria compulsória do juiz Ari Queiroz).
E Frederico Vasconcelos amplia o leque de parentes: Djaci Falcão Neto, também conhecido por “Didi” e “Falcãozinho”, e a irmã, Luciana Tavares Falcão, “aparecem em 105 processos no STJ. Otávio Henrique Menezes de Noronha e Anna Carolina Menezes de Noronha, filhos do ministro Noronha, têm 115 processos no STJ; Eduardo Filipe Alves Martins, filho do ministro Humberto Martins, advoga em 18 processos na Corte (há mais um processo em nome de sua irmã, Laís Camila Alves Martins). Estão registrados 88 processos de Denise Campos Fischer e Octávio Campos Fischer, filhos do ministro Felix Fischer. Tramitam no STJ 66 processos em que são advogados Sérgio Marcus Hilário Vaz e Paulo Sérgio Hilário Vaz, filhos de Laurita Vaz. Quatro ministros do STJ confirmam que suas mulheres constam como advogadas no tribunal: Sebastião Reis, Benedito Gonçalves, Marco Bellizze e Marco Buzzi. Resumindo: há 1.166 processos em que Anna Maria da Trindade dos Reis, mulher de Reis, tem ou teve procuração nos autos. Atualmente, há 83 processos ativos em seu nome”.
Só para que o leitor imagine como prosperam esses filhos de ministros, basta dizer que o jovem advogado Otávio Henrique Menezes de Noronha possui em seu nome uma BMW 320I Advice Flex, ano 2013/2014, Placa OVV-5050 e uma BMW X 5, X Drive 300, ano 2014/2015 branca, Placa PAE-8527, a mesma que, segundo a revista Época de 14/03/2016, “quase invadiu a portaria do Palácio da Alvorada, residência oficial da Presidência da República no período da manhã. O carro só não avançou mais porque teve os pneus furados ao passar por uma barreira de pregos. O carro, uma SUV branca, pertence a Otávio Henrique Menezes de Noronha. Ele é filho de João Otávio Noronha, ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ)”. Procurado para comentar o episódio, o ministro afirmou em nota: “trata-se de um incidente que não causou nenhum dano, razão pela qual não há o que comentar”.
Se o pai de Otávio Henrique está hoje com 59 anos de idade, o filho deve ser muito jovem. Não obstante, registrou em 25/4/2014 a empresa “Otavio Noronha Advogados Ss Ltda”, CNPJ 20.298.951/0001-04, num privilegiado endereço: Quadra 05, Bloco K, Sala 609, S/N, Edif Ok Office Tower, Asa Sul, Brasilia.
Vozes vacilantes de ministros do STJ pronunciam-se, ora contra, ora a favor, sobre fato de parentes de ministros advogarem naquela Corte.
O CNJ editou em 03/03/2015 a Resolução nº 200, que disciplina as causas de impedimento de magistrado, aliás, já prevista no art. 134 do CPC vigente na época. E o artigo 1º da referida resolução reza que “está impedido de exercer funções judicantes ou administrativas em que estiver postulando, como advogado de parte, o seu cônjuge, companheiro ou qualquer parente, consanguíneo ou afim, em linha reta; ou na linha colateral, até o grau estabelecido em lei”.
E como que coroando o vacilante entendimento dos semideuses, a ministra Nancy Andrighi, Corregedora Nacional de Justiça, dá sua palavra final sobre a Resolução 200/2015, dizendo, placidamente, que “a resolução não disciplina a atuação de parentes de ministros em processos julgados por outros ministros”. Mas se esqueceu de dizer que, por trás dessa parentalha advogando no STJ, existem os “embargos auriculares” de pais, esposos e companheiras de ministros em cima dos julgadores, embora, como diz a corregedora, “a resolução do CNJ não discipline a atuação de parentes de ministros em processos julgados por outros ministros”.
Está na hora de um parlamentar de coragem, e que não tenha afilhados nas Cortes de Brasília, propor uma Comissão Parlamentar de Inquérito para passar esse nosso Judiciário a limpo.
Em tempo: passados mais de trinta dias da publicação de “Eu também acredito em lobisomem”, e já sabendo que os seus personagens já conhecem a obra, ninguém me veio até agora contestar qualquer coisa.
Continuo à espera.
(Liberato Póvoa, desembargador aposentado do TJ-TO, membro-fundador da Academia Tocantinense de Letras e da Academia Dianopolina de Letras, escritor, jurista, historiador e advogado, liberatopo[email protected])