Ministro perseguidor decide processos do próprio filho
Redação DM
Publicado em 22 de março de 2016 às 00:36 | Atualizado há 9 anos
Esta semana, publiquei pela Editora Kelps o livro “Eu também acredito em lobisomem (como se distorce a lei no STJ)”, Neste pequeno livro mostro as entranhas do Superior Tribunal de Justiça, narrando, com minúcias, a tramitação de um processo desde seu ajuizamento no primeiro grau até o Supremo, o que deixa o leitor estarrecido com a manipulação feita no “Tribunal da Cidadania”.
Comento como são escolhidos os ministros daquela Corte, principalmente do chamado “quinto constitucional”, levados pelas indicações políticas, pelo apadrinhamento e pelo que denomino “sobrenomenologia”, deixando uma sombra de dúvida sobre a imparcialidade dos julgamentos naquela Corte, quando uma das partes detém poder político ou econômico, tomando como exemplo o processo em que eu próprio fui parte e que é minuciosamente narrado, fase por fase, por mais de quinze anos, de uma Vara Cível de Palmas-TO até a chegada ao Supremo Tribunal Federal.
E agora, nem bem o livro saiu do forno, volta a confirmar-se a denúncia sobre a parcialidade da Corte, com novo caso.
Falcão foi implacável Corregedor Nacional de Justiça, responsável por afastamentos e aposentadorias compulsórias de colegas, muitas vezes mediante simples suspeitas, antes de ser eleito como presidente do STJ, em setembro do ano passado.
O jornal “Folha de São Paulo” do último dia 13 de março, em matéria assinada pelo jornalista Aguirre Talento, mancheteada sob o título “Presidente do STJ decidiu processos em que seu filho atuou”, confirma o que ocorre nos subterrâneos do STJ.
O filho, não por acaso, é Djaci Falcão Neto, o “Didi Falcão”, ou Falcãozinho”, que acendeu o estopim do afastamento e posterior aposentadoria compulsória de Ari Queiroz, quando esse magistrado se recusou a aceitar uma proposta espúria do filho do ministro, que discorri no artigo “Por que afastaram Ari Queiroz” (DM de 14/03/2015).
A “Folha” localizou quatro decisões monocráticas do ministro Francisco Falcão, como presidente da Corte, todas favoráveis aos clientes do filho, referentes a recursos de partes representadas por “Didi Falcão”. O novo Código de Processo Civil (CPC), no art. 144, inciso III, proíbe que magistrados funcionem “quando nele estiver postulando, como defensor público, advogado ou membro do Ministério Público, seu cônjuge ou companheiro, ou qualquer parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive”.
Quando naturalmente houve reclamação da outra parte, Falcão declarou-se impedido e anulou as decisões prolatadas em dois desses processos, o que atrasou a tramitação, pois só depois foram redistribuídos a outros ministros. Em um outro processo, o terceiro, Falcão decidiu em dezembro de 2014, mas só se declarou impedido em fevereiro de 2016; o processo referia-se à empresa “Rápido Luxo Campinas”, responsabilizada pela morte de um motociclista, cuja família pleiteara indenização, considerada improcedente no juízo singular. Falcão rejeitou o recurso, sob a pífia argumentação de que a família não pedira a extensão da Justiça Gratuita ao STJ; ocorre que ela já gozava desse benefício desde o primeiro grau, sendo desnecessário repetir o pedido em grau de recurso, já que o processo subiu sob o pálio das gratuidade. A autora recorreu da decisão de Falcão, e o novo ministro relator, Ricardo Cueva, decidiu que caberia o recurso, reformando a decisão de Falcão. Em outubro de 2014, ele rejeitara um recurso contra a “Sambaíba Transportes”, sob o mesmo argumento.
No quarto processo, o ministro decidiu, e até hoje não se declarou impedido. E “justificou”, dizendo que “só percebeu que era caso de impedimento depois que o recurso já estava julgado”.
O ministro cometeu dois erros graves: primeiro, não podia jamais atuar em razão do impedimento; segundo, mesmo admitindo eventual descuido de sua assessoria, que não teria percebido o impedimento, não poderia, de qualquer forma, desfazer a decisão, justamente por ser impedido. Mas isto depende de um pouco de conhecimento jurídico.
“Falcãozinho” é sócio do escritório “Djaci Falcão Advogados Associados”, sócio da irmã, Luciana Tavares Falcão. “Falcãozinho” é advogado em 75 processos no STJ, e sua irmã, em trinta, só no STJ.
Quando o caso veio a furo, a assessoria de Falcão informou que “houve falhas na checagem do impedimento dos processos”, afirmando que “tomou as decisões com base no mérito e que, por isso, não viu que seu filho estava entre os advogados das partes”. Por meio da secretária, os dois filhos do ministro simplesmente informaram que não tinham nada a declarar sobre o assunto. E as empresas para as quais advogam não foram localizadas.
É isto que deve estar sistematicamente acontecendo naquele tribunal, composto de investigadores que deveriam ser investigados. E não é por acaso que Francisco Falcão é um dos personagens de “Eu também acredito em lobisomem”, que é apenas uma parte do próximo livro “Nos bastidores das Cortes (como a política interfere no Judiciário)”, onde faço um raio-X de vários deles, nas suas 400 páginas. Pretendo lançá-lo em breve.
Isto, se não o apreenderem antes. Ou se não fizerem comigo o que fizeram com Celso Daniel.
(Liberato Póvoa, desembargador aposentado do TJ-TO, membro-fundador da Academia Tocantinense de Letras e da Academia Dianopolina de Letras, escritor, jurista, historiador e advogado, [email protected])