Judiciário ontem e hoje
Diário da Manhã
Publicado em 18 de março de 2016 às 01:01 | Atualizado há 9 anos
Durante todas as fases em que exerci a advocacia foi-me dado conhecer grandes magistrados, bem como íntegros e eficientes promotores de Justiça. O primeiro dos juízes perante quem atuei foi Ari Corrêa de Moraes, em Morrinhos, o qual não tardou a se aposentar e mudar-se para o Rio de Janeiro, onde residiu até quase o final da vida. Bom magistrado. Além de reconhecida correção, era lhano e trabalhador. Sucedeu-o uma das maiores vocações para a magistratura: Clenon de Barros Loyola. Aureolava-o uma personalidade que se impunha por absoluta respeitabilidade. Estudioso, culto, rigoroso sem praticar qualquer excesso de severidade, dotado de excelente capacidade de redação, era um paradigma em suas funções. Ainda relativamente moço ascendeu ao Tribunal de Justiça, onde pontificou como grande desembargador. Faleceu um tanto prematuramente, ainda sexagenário, se não me engano, cercado de unânimes respeito e admiração.
Em Caldas Novas e Piracanjuba tive a oportunidade de trabalhar em feitos presididos por Osvaldo Costa. Honrado. Competente. Igualmente, Celso Fleury e Geraldo Crispim Borges em Goiatuba. Bons juízes.
Conheci a proficiência e a lisura no Tribunal de Justiça do Estado de Hamilton Velasco, Jorge Jardim, Romeu Pires de Campos Barros, João Canedo Machado, muitos outros mencionáveis mas que omito por traição da memória.
Sou do tempo de Nelson Hungria, Pontes de Miranda e tantos outros cujos nomes enchem de orgulho a Magistratura e as letras jurídicas nacionais.
O extraordinário crescimento populacional do Brasil trouxe tal assoberbamento de feitos judiciais que a justiça brasileira se viu crescentemente atingida por problemas a subtrair-lhe a eficiência. A isto se juntaram as consequências da inversão de valores intelectuais e morais, ocorrente em alguns casos. Antigamente a concessão de Habeas Corpus somente era possível por meio de colegiado, nunca monocraticamente. De pouco mais de uma década para cá os tribunais passaram a permitir que um só dos seus membros tivesse competência para essa concessão. Quando o corrupto Paulo Salim Maluf e seu filho Flávio se encontravam presos desde mais de 40 dias por força de inúmeras provas de desonestidade, não apenas em um processo, mas em vários, o ministro Carlos Veloso, um mês antes de se aposentar, numa decisão que não soube justificar, concedeu-lhes ordem de habeas corpus. Depois dessa concessão Maluf nunca mais, apesar de não poder sair do país para não ser preso pela Interpol em qualquer outro território, se viu nas malhas carcerárias. Ao contrário. Há pouco mais de 1 ano, ocorreu esse absurdo: estando o ex-governador paulista e ex-prefeito paulistano condenado por grossa falcatrua como chefe do Executivo Municipal de São Paulo, e por isso mesmo impossibilitado de tomar posse como deputado federal absurdamente eleito pelo povo que ele tanto traiu, o Tribunal de Justiça de São Paulo reuniu-se extraordinariamente a fim de anular a condenação, permitindo-lhe que 15 dias depois exercesse o mandato de deputado federal, no qual se encontra até hoje.
É conhecido do Brasil inteiro o fato a envolver um dos maiores magnatas da corrupção do Brasil – o sr. Daniel Dantas, maior beneficiário da corrupção havida nas privatizações perpetradas pelo tucanato. Estava ele condenado a 10 anos de prisão pelo juiz Fausto Di Sanctis, de São Paulo. O ministro do STF Gilmar Mendes, amigo de Fernando Henrique Cardoso, em decisão unilateral, cassou a sentença do magistrado paulista. E até hoje Daniel Dantas está absolutamente impune e nessa situação continuará certamente para sempre.
Há 10 anos o ex-senador Luiz Estevão, de Brasília, depois de muitos anos de início do processo, recebeu sentença condenatória também por 10 anos. Mas ficou em total liberdade. E somente agora em março de 2016 se está promovendo o cumprimento da sua pena. Interessante observar que o seu companheiro de falcatrua, o juiz Nicolau do Santos Neto, permaneceu desde o início da ação penal ora em prisão comum ora em prisão domiciliar. Surpreendentíssima essa diferença de tratamento para com um membro corrupto do Judiciário e o dispensado a um corrupto ex-senador…
O assunto comporta outros artigos. Voltarei a ele noutras oportunidades.
(Eurico Barbosa, escritor, membro da AGL e da Associação Nacional de Escritores, advogado, jornalista e escreve neste jornal às quartas & sextas-feiras – E-mail: [email protected])