Investimentos em irrigação, eletrificação rural em Goiás e a dominação política
Diário da Manhã
Publicado em 1 de março de 2016 às 00:06 | Atualizado há 9 anos
A operação Lava Jato vem desvendando uma prática muito comum que, há décadas, ocorre nos subterrâneos do poder, léguas distantes do conhecimento da população: a dos investimentos implantados em nome do “desenvolvimento”. Esses, na verdade, serviram de fomento para o “caixa dois” das campanhas políticas e para o enriquecimento ilícito.
Nesse aspecto, dois setores fundamentais na economia do País – Petróleo e Energia Elétrica – despenderam cifras astronômicas dos caixas da Petrobras e de grande parte das concessionárias de eletricidade para fins completamente alheios aos objetivos estratégicos dessas instituições. Não é por acaso que esses dois setores vêm se tornando alvos da Polícia Federal nesse difícil caminho de estabelecer a verdade dos fatos.
E os fatos vêm demonstrando que o discurso político de “investimentos para o desenvolvimento” era uma falácia, assim, tornando todo um país dominado politicamente pelos donos do poder. Por consumirem cifras astronômicas, tanto da Petrobrás como de grande parte das concessionárias de eletricidade, essas falidas instituições se tornaram alvos prediletos da PF. As práticas do “caixa dois” eram as mais diversas.
Contratos superfaturados e seus eternos aditivos, consultorias de faz de conta, obras intermináveis, enfim: coisas assim, típicas do patrimonialismo inerente a um país periférico como é o Brasil. Só para se ter uma ideia, vai aqui a seguinte constatação: o tão propalado investimento de governos goianos para “modernização da agricultura” instalou, ao longo do tempo, cerca de 20 vezes mais suporte elétrico que o necessário para alimentar os pivôs centrais de irrigação. Com os tão propalados programas de eletrificação rural, surgem elefantes brancos em todos os cantos de Goiás. De 1982 a 1992, o suporte elétrico para “melhorar a qualidade de vida do homem do campo” cresceu cinco vezes mais que a economia do estado. Com isso, a história se repetiu: “Investimentos” demais para crescimento de menos. Eis aí a raiz da quebra da Celg. Os tão divulgados programas de eletrificação rural. Investimentos demais para crescimento de menos, com o excedente ocioso fazendo a alegria de quem sempre fez: empreiteiros.
Em seu seminal livro, leia-se: “A Maldição do Petróleo”, o professor da universidade norte-americana da Califórnia, Michael Ross, aponta o quanto o petróleo se tornou uma verdadeira maldição para povos escravizados politicamente ante a baixíssima cidadania. “O petróleo tornou-se uma maldição porque as receitas que ele gera para os governos são anormalmente vultosas, não oriundas da tributação dos cidadãos, flutuam de forma imprevisível e são fáceis de esconder do escrutínio público”, aponta o autor.
Dos meus tempos de Universidade de Campinas, lembro-me, como se hoje fosse, das vibrantes aulas do doutor Arsênio Sevá a respeito da história das inúmeras usinas hidroelétricas construídas na África e no Egito em nome do desenvolvimento. Desenvolvimento para quê? Para quem? Indagava o sábio professor. Cá entre nós, ingênuo é quem pensa que a Usina Hidroelétrica de Tucuruí, no Pará, serviu ao povo daquele estado. A bem da verdade foi outra história: a usina mais serviu às indústrias de alumínio que ao povo paraense. Como ingênuo é isentar qualquer governo do estado, de 1980 para cá, da falência do grande orgulho que foi a maior empresa goiana, para o bom povo dessa terra que representa o Goiás de verdade.
(Salatiel Soares Correia é engenheiro, bacharel em Administração de Empresas, mestre em Planejamento Energético. É autor, entre outras obras, de A Energia na Região do Agronegócio)