A Justiça está perdendo o medo e já começam a clarear as coisas
Diário da Manhã
Publicado em 14 de março de 2016 às 00:09 | Atualizado há 9 anosNos últimos dias, publiquei dois artigos sobre a decisão emanada do Supremo Tribunal Federal sobre o assunto, quando me uni à voz do povo, aplaudindo esse marco histórico da nossa Justiça. O primeiro caso de obediência à decisão ocorreu com o seminarista Gil Rugai, condenado a 33 anos e nove meses de prisão por ter assassinado o pai e a madrasta; em setembro de 2015, Gil Rugai teve liberdade concedida por ministros da Quinta Turma do STJ.
A decisão afirmava que Rugai poderia recorrer da sentença liberdade, como previa a condenação em primeira instância. E como ele, inúmeros condenados em primeira instância recorrem em liberdade. Mas nem bem passou uma semana, nova ordem de prisão, desta vez, por decisão da 5ª Vara do Júri da Capital, seguindo recomendação do Supremo Tribunal Federal. A conclusão do STF – como se sabe – é que um réu condenado em segunda instância na Justiça deve começar a cumprir pena de prisão, ainda que esteja recorrendo a tribunais superiores.
Após Rugai, sete outros condenados foram mandados imediatamente para a prisão pela 9ª Câmara Criminal do TJ-SP. E outros casos virão, com certeza, principalmente os da Operação Lava Jato, já condenados pelo implacável juiz Sérgio Moro, cujas decisões raramente são revistas pelo tribunal “ad quem”. Isto, sem dúvida, está tirando o sono daqueles quase cinquenta já condenados pelo juiz Moro, pois certamente recorreram e, paradoxalmente, estão torcendo para que o TRF-4 demore a julgá-los, pois é sabido que raramente o tribunal reforma decisão dele. Também o Ministério Público pediu a prisão do ex-senador Luiz Estêvão com base naquela decisão.
Recentemente, o STJ, dando mais vigor à decisão da Corte Maior, determinou a expedição de mandado de prisão contra o ex-deputado distrital e ex-vice-governador do Distrito Federal Benedito Domingos. Houve uma outra nuance no caso do ex-governador e ex-deputado: o STJ era a instância originária para julgamento de Benedito Domingos e, aparentemente, sua prisão deveria ser decretada quando confirmada por órgão colegiado superior, ou seja, o Supremo. A Sexta Turma do STJ entendeu, ao rejeitar recurso com o qual os advogados do ex-parlamentar pretendiam abrir caminho para levar o caso ao STF, que ele se submetera à revisão no mesmo colegiado, e que a demora na tramitação do processo, relativo a fatos ocorridos há quase dez anos, já havia beneficiado o réu com a prescrição relativa ao crime de formação de quadrilha, reconhecida de ofício pela Sexta Turma no dia 15 de dezembro, quando foram rejeitados dois recursos especiais da defesa.
A decisão de determinar a prisão do ex-parlamentar e remeter cópia do processo ao Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, “para que encaminhe guia de recolhimento provisória ao juízo da Vara de Execuções Criminais, para efetivo início da execução provisória das penas”, é a primeira do STJ a seguir a nova jurisprudência do STF, que passou a admitir a prisão já a partir da condenação em segunda instância, independentemente da pendência de recursos nos tribunais superiores.
Essa guinada da jurisprudência, como observado pelo relator do caso, teve como forte motivação a possibilidade, no sistema punitivo brasileiro, de interposição de sucessivos recursos contra decisões prolatadas no curso de uma ação penal, tornando excessivamente morosa a definição da causa. Segundo ele, o Brasil tem “o assustador número de 20 meios de pedir a revisão de um ato jurisdicional”, considerando ações e incidentes previstos na legislação processual penal. Assim, o reexame de uma condenação vale como se houvesse novo julgamento.
Também é salutar observar que a Justiça está perdendo o medo, no momento em que determinou a condução coercitiva do ex-presidente Lula, que, pelo artigo 6º do Código de Processo Penal, confere legitimidade à autoridade policial a tomar todas as providências necessárias para o esclarecimento de um delito, respeitando-se suas garantias legais e constitucionais. Ou seja, é quando a pessoa é levada para a delegacia a fim de prestar depoimento e depois é liberada, sendo um meio que a autoridade tem de efetivar o atendimento à intimação do indivíduo considerado essencial para a elucidação de um caso.
Embora haja vozes que condenaram a condução do ex-presidente, que é aplicada quando há recusa em comparecer à autoridade policial, deve ter pesado em seu desfavor o fato de ter pedido que o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) proibisse seu depoimento. A liminar foi derrubada pelo plenário. E sua intenção de se esquivar às apurações patenteou-se mais ainda quando teve, no último dia 04/02/2016, negada liminar pela ministra Rosa Weber, do STF, em ação proposta por Lula, em que pleiteava interromper as investigações contra ele e também as ações deflagradas, no mesmo dia, pela Polícia Federal, que o levou para prestar depoimento e fez buscas e apreensões em imóveis usados pelo petista. Segundo a ministra, não houve “ilegalidade irrefutável” na condução das apurações.
Com isto, a Justiça começa a entender que a lei é para todos e que os tentáculos da Lava Jato começam a chegar no terreiro do Planalto, onde é visível o desconforto da presidente Dilma, não bastassem as revelações do senador Delcídio do Amaral, que, em delação premiada, certamente vão tirar muita podridão que se acha agasalhada debaixo do tapete. E inaugurar a era dos pesadelos pra muita gente.
É aguardar para ver. Não sei se vai haver cadeia para tanta gente,
(Liberato Póvoa é desembargador aposentado do TJ-TO, membro-fundador da Academia Tocantinense de Letras e da Academia Dianopolina de Letras, escritor, jurista, historiador e advogado, [email protected])