Difícil para um professor de história confessar que nunca viu nada igual
Redação DM
Publicado em 4 de novembro de 2015 às 21:28 | Atualizado há 10 anosSou um dos egressos do Curso de História da hoje PUC. Na minha época, um bando de craques em sala de aula entre professores e educandos. Dava gosto enfiar a cara nos livros. Não ficou era da vida do homem que não nos interessasse.
Esmiuçamos tudo. E ainda nos demos ao luxo de profundas incursões dentro da antropologia física e cultural, sem esquecer, também pela excelência, do muito em geografia que ganhamos para colocar na bagagem pessoal. Apenas para lembrar o menos.
Imagine o que era um Curso de História em plena ditadura militar de 1964. Gente ávida de informações e de cultura como arma para guerrear o sistema golpista. A rapaziada ficava nas pontas dos cascos. Raro o acadêmico que já não exercia a profissão de professor. Era o meu caso.
O bom da coisa é que nos interessava, com toda a profundidade, as causas e a consequências de cada fato. O senso crítico levado à primeira dimensão.
Surgimento de povos, nações e Estados, origem, ascensão e queda de impérios, de ditaduras, de repúblicas e de monarquias. Das guerras e dos tempos de paz estudamos de um tudo. De gênios a medíocres mereceram as nossas considerações. A formação da Terra e os processos de sua destruição aguçaram sistematicamente o nosso interesse. As ideologias foram vistas com lupa, e com igual curiosidade as religiões.
Sempre gostei de levar com muito humor o meu magistério. Por um simples motivo: as coisas da vida já são por demais carrancudas. Os governos nos batem muito, desde que o homem se entende por homem.
Daí, gozador por natureza, adotei o critério de buscar nos fatos históricos seu lado natural, mas indo à cata do submundo de cada um. Foi aí que descobri que, sem exceção, houve sacanagem da Pré-história aos dias de agora. Parece que tudo termina em golpe e mau-caratismo. Nada pode ser levado a sério.
Um homem sempre em crise foi o que encontrei. Por tal razão, as religiões foram ganhando adeptos. A fé passou a ser a luz na escuridão das ações.
Vi céus e infernos nas minhas caminhadas pela história. Mas, confesso, nada como agora. E para meu desencanto, no Brasil.
Tenho a impressão de que ninguém procura na história os exemplos. E nela tem tudo. Erros e acertos.
A ganância, o apego ao poder, a falta de humildade em reconhecer as falhas, a esperteza, o primarismo nas ações e a incapacidade cegaram as instituições e consequentemente as pessoas. Uma bancarrota moral. E o pior é que não sobrou nenhuma reserva de boas condutas.
Iram Saraiva é ministro emérito do Tribunal de Contas da União)