A revolução da paz
Diário da Manhã
Publicado em 25 de novembro de 2015 às 20:35 | Atualizado há 9 anosDemonstra que não é possível contribuir para uma mudança positiva sem o exercício da melhor política, com palavras e atitudes, rumo a uma evolução global
Paris, sexta-feira, 13 de novembro de 2015. A Cidade Luz e a data ficarão marcadas entre os cenários dos piores ataques terroristas da história, atentados simultâneos que mataram 130 cidadãos e deixaram mais de 300 feridos. Uma ação brutal, marcada pela covardia e pela desumanidade, que aprofunda nossas reflexões sobre a paz e o destino dos povos ao redor do planeta.
Em momentos de horror como este, a paz parece ficar mais distante. Nossa esperança pela construção de um mundo melhor se esvai. Os progressos da ciência e os avanços das nações em prol do bem-estar dos seres humanos perdem o sentido. Por mais que as circunstâncias não permitem, em momentos como estes devemos assumir o compromisso de lutar ainda mais por um mundo melhor, de mãos dadas com aqueles que podem renovar nossa crença na civilização, no desenvolvimento econômico e humano e na convivência pacífica entre os povos.
O Papa Francisco, o sumo-pontífice latino-americano da Igreja Católica, sem dúvida é uma das referências que buscamos. Acompanhando o noticiário sobre os ataques a Paris, me lembrei de Francisco e sua atuação ponderada, equilibrada, voltada para o progresso da humanidade.
Nesse momento de luto e dor, o papa Francisco se solidarizou com a França e mais uma vez pregou a paz, como faz de formade forma incansável. “Quero reafirmar que o caminho da violência e do ódio não resolve os problemas da humanidade, e que usar o nome de Deus para justificar esta voz é blasfêmia”, disse durante celebração no domingo após os atentados.
As atrocidades cometidas por radicais, como os membros do Estado Islâmico, e o medo que disseminam são sintomas agudos da grave crise humanitária atual. Enquanto cresce o número de mortes em sucessivos ataques, cada vez mais ousados, também aumenta a legião de refugiados que tentam escapar de ações de extremistas, de guerras, fome, miséria e arbítrio de ditadores de países do Oriente Médio e da África, onde costuma não se respeitar os direitos humanos.
Por todos que sofrem as piores consequências de um acentuado desequilíbrio, tem se manifestado o papa da paz, Francisco. Sem descuidar de seu papel de líder religioso, ao contrário, exercendo com primor essa missão, Francisco dá constantes exemplos de humildade, coerência e amor ao próximo. Ao assim proceder, demonstra que não é possível contribuir para uma mudança positiva sem o exercício da melhor política, com palavras e atitudes, rumo a uma evolução global, seja na mediação de conflitos ou no respeito ao meio ambiente e a seus recursos finitos.
Passados 26 anos da derrubada do Muro de Berlim, novas barreiras vêm sendo erguidas, prova sombria de que erros do passado que tanto custaram em vidas e sofrimentos não serviram de dura lição, contamos com a figura terna do papa, a acenar para o diálogo e a acolhida. Intermediação imprescindível para diminuir o impacto da que já é considerada pela Anistia Internacional e Comissão Europeia, a pior crise de refugiados desde a Segunda Guerra Mundial.
Somente na Síria, desde o início da guerra civil, em 2011, cerca de 250 mil pessoas morreram e outras 4 milhões fugiram para diversas partes do mundo. Particularmente sensível a essa tragédia, por ser também filho de imigrantes italianos, o sumo pontífice pediu pelos desafortunados. “São pessoas em busca de dignidade, essas famílias em busca de paz continuam conosco, a Igreja não as abandona, porque fazem parte do povo que Deus quer libertar da escravidão e guiar rumo à liberdade”, disse.
O papa não se abstém de abordar questões delicadas, porque disso depende o apoio aos mais vulneráveis ao preconceito e à exclusão.A eles também Francisco sempre se refere ao trabalhar por reformas no Vaticano. Ou quando se referiu a vítimas de abusos por membros do clero, educadores e familiares. “Deus chora pelo abuso sexual de crianças”, declarou, afirmando em seguida: “A juventude é protegida e todos os responsáveis serão responsabilizados.”
Para o papa, a Igreja deve ser simples e inclusiva, espelho daquele que é seu pontífice há dois anos, sempre disposto a colaborar, discutir, propor ações generosas onde for necessário. Tem sido assim quanto às vítimas de atentados, aos imigrantes e a tantos outros expostos ao abandono e violência.
Francisco também é responsável por um avanço diplomático que entrou para a história contemporânea. Ele é considerado o grande articulador da reaproximação entre Cuba e Estados Unidos, nações que visitou em setembro. Na ilha, esteve com Fidel Castro e pediu que os cubanos servissem às pessoas, não às ideias. Nos EUA, incluiu na agenda lotada uma visita a presidiários.
Aos 78 anos, Francisco não se exime mesmo nas causas mais complicadas. Dias atrás, clamou por um pacto do governo colombiano com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), para encerrar meio século da mais longa insurgência da América Latina, que resultou em mais de 220 mil mortos e milhões de deslocados. Também não deixou a questão ambiental de lado e pregou que as nações não coloquem a natureza em segundo plano em nome do desenvolvimento. “Nosso lar comum está contaminado, não para de deteriorar-se. Precisamos do compromisso de todos. Devemos proteger o homem de sua própria destruição.”
Mais do que palavras, Francisco profere gestos de efetiva paz. Um sopro de esperança num mundo cada vez mais marcado e machucado por atrocidades como os ataques terroristas contra a França, Angola, Rússia, Indonésia, Reino Unido, Espanha, Paquistão e tantos outros países desde 2001. Todos injustificáveis, nenhum deles explicável sob o ponto de vista humano. Ao Papa Francisco, o nosso muito obrigado.
(Marconi Perillo,governador de Goiás)