Lei quer corpo delito antes de aborto
Redação DM
Publicado em 22 de outubro de 2015 às 22:09 | Atualizado há 5 meses
Um novo capítulo foi contado ontem na polêmica proposta de modificação da norma que regulamenta o atendimento às vítimas de violência sexual (Lei 12.845/13). O projeto de lei 5069/13, que muda trechos da norma, foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) por 37 votos contra 14 pela rejeição.
O deputado federal João Campos (PSDB-GO), líder da bancada evangélica, informa que uma das polêmicas que esteve em pauta se refere ao ato do profissional de saúde dar ou não informações à vítima sobre seu direito ao aborto. O direito à informação foi mantido, mas a CCJ introduziu a obrigatoriedade de registro de ocorrência e exame de corpo de delito, explica.
Outra questão polêmica da norma diz respeito ao combate de possíveis mecanismos que facilitem o aborto nos hospitais públicos.
O relator do projeto, deputado Evandro Gussi (PV-SP), adequou a proposta às terminologias e sanções do Código Penal e explica que a intenção da mudança normativa é impedir a prática de forma disfarçada nos serviços de saúde. “Há muito espaço na legislação para isso e precisamos fechar essa porta”, diz Gussi.
Investigação
O deputado João Campos afirma que grupos defensores da vida estão preocupados com mecanismos para sensibilizar e influenciar mulheres a realizarem a interrupção da gravidez. No início do mês, uma comissão instalada em um hospital público de Goiânia apresentou relatório para militantes da causa – grupo composto por magistrados, advogados, religiosos, etc – em que se investigou a suspeita de que uma mulher teria sido induzida a praticar o aborto. No caso investigado por sindicância, a mulher teria sido estuprada após ficar grávida do marido e não teria razões jurídicas para a realização do aborto.
Conforme apurou o hospital, entretanto, a denúncia não procede e a paciente, que havia sofrido estupro, jamais teria sido ‘influenciada’ por qualquer integrante da equipe médica ou pessoa estranha à unidade de saúde. A denúncia inicial indicava que a integrante de uma ONG em defesa do aborto teria entrado na unidade e conversado com a paciente.
O relatório do hospital afirma que a unidade se responsabiliza apenas pelos atos internos e se alguma militante busca influenciar ou informar de forma incorreta as pacientes cabe à Polícia Civil investigar as suspeitas.
Se o caso de Goiânia não passa de suspeita, os militantes do pró-vida colecionam inúmeras denúncias no país quanto aos grupos mais radicais de defensores de aborto que realizam pressão na frente de hospitais e campanhas de esclarecimento que podem levar tanto a grávida quanto à equipe médica a realizar interrupções ilegais. Alguns destes grupos pregam o aborto químico e realizam campanhas maciças na internet.
Militantes defensores do aborto reclamam da norma
Um grupo de deputados que defende o direito ao aborto não concorda com as mudanças aprovadas na última quarta-feira. A deputada federal Cristiane Brasil (PTB-RJ) chamou a modificação de “inconstitucional”.
“Este projeto é um dos maiores retrocessos do Brasil para os direitos duramente conquistados pelas mulheres”, disse.
A proposta não altera os casos em que o aborto é regularizado, como nos casos em que coloca em risco a vida da gestante, quando a gestação é consequência de um estupro ou no caso de o feto ser anencéfalo.
Os grupos reclamam todavia dos requisitos aprovados, como a necessidade de realização de registro de ocorrência e exame de corpo de delito nos caos de pedido de aborto após estupro.
Para as defensoras do aborto e das mulheres, o exame seria vivenciar a violência novamente. Atualmente basta a mulher falar que foi violentada e procurar ajuda no sistema de saúde. Ela é examinada e pode requerer o aborto. “Achar que nós, mulheres, somos um bando de mentirosas, que tudo o que queremos é sair inventando um estupro para conseguir métodos anticoncepcionais e o próprio aborto, é um completo absurdo”, diz a psicóloga Rosângela Talib.
Diretrizes para o atendimento
O Ministério da Saúde publicou ontem portaria que traz os critérios de habilitação de serviços da rede pública para darem suporte às vitimas de violência sexual. As unidades hospitalares do Sistema Único de Saúde (SUS) poderão desta forma realizar o registro de informações em ficha de atendimento multiprofissional até a coleta e armazenamento provisório do material para possíveis encaminhamentos legais.
Conforme o Governo Federal, a medida reduz a exposição da pessoa que sofreu a violência e evita que as vítimas sejam submetidas a vários procedimentos.
A mudança administrativa é uma forma de antecipar e evitar os procedimentos que podem ser impostos com a mudança legislativa que tramita no Congresso Nacional.