Metal extremo toma conta do Martim Cererê
Diário da Manhã
Publicado em 16 de outubro de 2015 às 23:42 | Atualizado há 4 mesesEsqueça Beatles, Metallica ou as baladas do Led Zepellin. Nem The Who ou Pink Floyd. Muito menos Titãs ou Iron Maiden. Imagine uma modalidade de música que faça estes artistas parecer compositores de canções de ninar.
Hoje, a partir das 18h, no Martim Cererê, acontece o Goyattack Festival, encontro de bandas de rock extremo comumente batizado de black metal, mas que não deixa de ter outras e novas vertentes bizarras e agressivas infiltradas em seus ritmos e harmonias.
O evento tem a chancela de Drakkar, lenda viva do black metal goiano que tem passagens em turnês nacionais e internacionais com a bandeira da modalidade de heavy metal que faz ode ao anticristianismo, ao paganismo, satanismo e outras espécies de dogmas religiosos. É claro que existe grande polêmica em torno das bandas e dos jovens que se envolvem com esta espécie de música.
O black metal tem suas origens mais detalhadas a partir dos anos 80, com experiências sonoras do Venom, Sarcofago, Bathory e Merciful Fate. Ao contrário dos demais estilos de heavy metal, jamais foi bem recebido pela mídia e grandes festivais como Rock in Rio. E o motivo é a coerência dos adeptos, que preferem seguir seu estilo a mudar letras, performances e forma de tocar.
Não ter visibilidade na mídia, todavia, reserva outras possibilidades e vantagens. O estilo é livre e reúne com mais coesão os adeptos. O Goyattack é demonstração de que existe público, fãs e também apoios institucionais.
A banda que abre o festival é In Dominium. De origem goiana, iniciou suas atividades em 2001 e apresenta uma temática voltada para questionar a crença. Na ideologia musical do grupo, o “homem é o senhor de suas vontades”. O grupo já esteve envolvido em eventos como o Encontro de Artes Negras, que ocorreu no DCE da UFG neste ano.
A banda seguinte é Dogma Satan. Conforme o release do evento, uma “horda satânica de Brasília” que realizou sua primeira apresentação ao vivo em Goiânia”. O grupo canta mascarado ( corpse paint) e faz o estilo clássico: com notas rápidas (trêmulos constantes na guitarra) e guitarra distorcida.
Outra banda na sequência da noite, Solictus vem de Anápolis e iniciou suas atividades em 2010. A música é extrema e de velocidade impressionante. O baterista parece metralhar a caixa com sua mão esquerda, enquanto a direita acerta o chimbau violentamente. É de se alertar que as bandas posteriores devem ter uma bateria reserva caso seja preciso.
Formada em 1999, o grupo Vultos Vocíferos, de Brasília, mostra seu trabalho registrado em demo e dois discos oficiais. Um dos CDs chama-se “Ao eterno abismo”. A gravação é de qualidade e revela uma banda madura em seu estilo.
Outra ‘horda’, como se denominam as bandas do estilo, vem de Minas Gerais. Diabolical Tyrants é uma banda recente e traz para os goianos o conteúdo de sua primeira demo, “A Glimpse Of the Profane”. Apesar de recente, a banda tem coesão e musicalidade – até solos mais melódicos são enxertados na linguagem da banda. Em alguns momentos, lembra thrash metal e industrial.
Banda seguinte do festival, a Luxúria de Lillith canta em português e se diferencia pela produção das canções. É o metal mais extremo produzido em Goiás e talvez do Brasil, com picos explosivos e paradas apenas para respirar e voltar ao ataque sonoro. Com duas mulheres na banda, o grupo tem um homem no comando vocal e na bateria. Ao contrário do que se pode pensar, as músicas apresentam lógica, organização e execução hábil. As letras falam de moralismo, decadência, morte, guerra, medo e toda uma temática sombria. O grupo tem três CDs oficiais e um LP. Luxúria de Lillith tem no canal Youtube clipes de horror que fazem a festa dos fãs do estilo.
Após Luxúria será a vez dos paulistas Conquistadores, que possui a demo “Lutar e Conquistar” e “À Beira da Loucura”, seu primeiro disco oficial. O grupo possui integrantes da extinta Funeral Putrid. O estilo é menos extremo e mais thrash, com pegadas ganchudas nos riffs.
A última a subir nos palcos do Cererê será a baiana Mystifier, considerada uma das maiores representantes do black metal nacional. O grupo tem a pegada metal, com movimentos bruscos e passagens pesadas que antecedem rompantes violentos e rápidos. As gravações da década de 1990 lembram a sonoridade do Sarcofago e o primeiro disco do Sepultura, “Morbid Visions”.
Serviço
Goyattack Festival
Hoje, 17 de outubro
Martim Cererê
Ingressos antecipados: R$ 20
Ingressos: R$ 30 (portaria)
Música com influência sinistra é mais antiga que black metal
As bandas de black metal revelam o lado mais macabro e tenebroso do heavy metal. Mas a música teve relações com temáticas semelhantes antes mesmo dos jovens cabeludos decidirem pintar a cara e produzir rock extremo.
Na música erudita, Nicolo Paganini (1782-1840) é considerado um músico sinistro e tenebroso, por conta da lenda que o envolve. O grande violinista teria, nos relatos do século 19, feito pacto com o diabo. Mas a aparência, com dedos longos e até monstruosos, se devia mais a uma doença.
Ainda na música erudita, o paganismo se espalhou em vários compositores, que tratam de evitar qualquer relação com o cristianismo – a temática central da maioria dos músicos do período barroco e clássico.
Na música popular, a temática obscura e relacionada ao demônio voltou à tona com Robert Johnson, guitarrista americano de blues que repete a mesma fórmula de Paganini: trocou a habilidade pela alma. Johnson é uma lenda do country blues e se revela exímio guitarrista por conta de articuladas harmonizações.
Nenhum dos músicos, todavia, chegou ao nível do Black Sabbath. A banda se introduziu no cenário roqueiro dos anos 1960 e 1970 com uma fórmula sinistra: riffs mefistofélicos, progressões em mi menor, ritmos tribais e letras que falam de bruxaria e, sim, do demônio. Mas Ozzy Osbourne, o cantor, fazia questão de dizer que a música da banda deveria ser encarada como um “filme de terror” e não como ordenações para um estilo de vida.
O black metal dos anos 1980 soou diferente: em vez de melodias e ritmos lentos, um som sinistro e brutal. Cresceu junto ao death metal, que tem menos pompa e barroquismo. Herdeiras do rock pesado, para os leigos, praticamente se assemelham a outros estilos, como o grindcore e o doom metal. Mas a temática é diferente.
Nos anos 1990, surgiu um estilo mais sinistro: o black metal norueguês. A diferença com os demais músicos, era o ativismo anticristão, responsável por colocar fogo em igrejas.
Aí parte dos músicos ultrapassou os limites da estética e da ética – e tornou-se criminosos. Trata-se de outra história, nada a ver com música nem com o festival dos garotos que se reúnem hoje em Goiânia.
Banda Vultos
Banda – Dogma Satan