Opinião

É possível corrupção na OAB? Sim, mas é difícil de provar

Redação

Publicado em 6 de outubro de 2015 às 22:45 | Atualizado há 10 anos

Fui procurado, em meu escritório, por um advogado que queria falar comigo. De início ele disse que eu não o conhecia, mas ele me conhecia como ex-presidente da OAB, professor universitário, autor de livros jurídicos e espiritualistas, advogado e, principalmente, pelos artigos escritos contra os desmandos da OAB Forte. Indagou qual a razão que eu não escrevia sobre corrupção na OAB, se estava claro que nos mais de 20 anos que a OAB Forte dirigiu a Seccional ali ocorreu descarada corrupção. Aleguei que o assunto era complicado, pois quem acusa deve provar. E provar corrupção praticada pela OAB Forte não era fácil.

Questionado porque ele não escrevia sobre o assunto, se conhecia vários detalhes que foram relacionados, respondeu que era advogado e contador de três empresas de construção, duas pequenas e uma média. Tinha família para criar, e se seu nome aparecesse perderia os empregos. Argumentou que não era conhecido como advogado, enquanto eu tinha conceito e respeitabilidade profissional. O que eu falasse mereceria mais crédito do que as palavras dele. O máximo que poderia fazer seria votar contra a OAB Forte, o que iria fazer com prazer, e tentaria convencer alguns amigos advogados a votar da mesma forma.

O dialogo foi longo. Realmente ele conhecia contabilidade, assunto que não é minha praia. As suas colocações, para o Direito Processual Penal, caracterizavam fortes indícios de corrupção, mas não chegam à categoria de provas. É bem verdade que, pelas regras do Código de Processo Penal, uma soma considerável de indícios podem ser consideradas provas, conforme giza o art. 239 do estatuto referido.

Foram muitos os indícios por ele elencados, valendo citar: 1) quando a OAB Forte recebeu a instituição, havia dinheiro em caixa; 2) considerando o número de advogados inscritos, valor da anuidade, taxas pagas para concorrer ao exame de ordem, inscrições como advogados, certidões, multas, etc., a receita anual da Seccional é bem superior a 40 milhões de reais. Considerando os valores, se  bem aplicada a receita, atualizada daria quase um bilhão de reais em 20 anos; 3) a receita gerada, mesmo descontando despesas com funcionários e repasse do percentual do Conselho Federal, seria suficiente para manter construções programadas de prédios, sem necessidade de empréstimos; 4) os empréstimos realizados foram efetivados em segredo, não sendo dado conhecimento nem mesmo aos conselheiros; 5) a ausência de transparência é total, pois OAB Goiás nunca fez licitação para construção, durante o tempo que foi administrada pela OAB Forte; 6) nada impede que haja superfaturamento de contratos de prestação de serviços, mesmo se a construção contratada for por administração indireta; 7) nas compras efetuadas, mesmo com notas fiscais, é possível haver supervalorização das mercadorias adquiridas; 8) é possível fazer compras em grandes quantidades, diretamente dos fabricantes, sem que a mercadoria passe por intermediários; 9) existiram muitas doações para as obras erigidas pela OAB, que não foram contabilizadas; 10) se as doações não foram contabilizadas, fica caracterizada a existência de “Caixa 2”, que é irregular; 11) não houve prestação de contas dos gastos realizados com construções; 12) a OAB Forte sempre gastou rios de dinheiro nas campanhas eleitorais; 13) o financiamento privado de campanhas, além de caracterizar violação  ética, caracteriza uma forma de corrupção; 14) foi a OAB Forte que introduziu o sistema de gastos milionários nas campanhas; 15) nunca existiu qualquer forma de fiscalização dos gastos nas campanhas eleitorais; 16) é por demais conhecido o aumento de patrimônio dos líderes da OAB Forte; 17) é sabido que os líderes da OAB Forte adquiriram aviões; 18) se nada de errado havia, não existe razão para destruir processo anual de prestação de contas; 19) nunca foi tentada qualquer explicação da OAB Forte sobre falsificação de processo ético; 20) direcionamento de grandes ações para determinados escritórios de advocacia caracteriza corrupção.

Em uma análise simplista parece ser fácil concluir que aconteceu corrupção, Mas não é tão  simples assim. Uma coisa são os indícios e outra bem diferente são as provas. Dos indícios pode-se extrair uma opinião pessoal. Todavia, pelo Direito, se alguém alega crime tem que provar a materialidade e a autoria. Comprovadamente, dirigentes da OAB Forte praticaram os crimes de falsificação de documentos (CP, art. 297: pena – reclusão, de 2 a 6 anos, e multa), destruição de documentos (CP, art. 305: pena – reclusão, de 2 a 6 anos, e multa), associação criminosa (CP, art. 288: pena – reclusão, de 1 a 3 anos) e prevaricação (CP, art.319: pena – detenção, de 3 meses a 1 ano, e multa). As provas que existem é da materialidade, e não da autoria. Os crimes aconteceram na administração da OAB Forte, mas não há provas de quem foram os autores. Os crimes já prescreveram, devido manobras dos lideres do grupo, que formaram uma barreira impedindo chegar aos autores. No caso, os crimes praticados compensaram, pois resultou em total impunidade. A falsificação de processo ético contra conselheiro que se insurgiu contra desmandos da OAB Forte, teve objetivos, também, de encobrir irregularidades financeiras. E qual a razão de destruição de processo anual de prestação de contas? Além disso, são fortes a possibilidades de líderes da OAB Forte terem praticado outros crimes.

Sobre indícios de corrupção, um corretor de imóveis me disse que intermediou a venda de um apartamento para um os dos dirigentes da OAB Forte, o qual fez questão de pagar a vista, em dinheiro, pagamento efetuado com notas de 100 dólares  mofadas, aparentando que estavam acondicionadas em local escuro e não ventilado. E o que prova isto?

Na investigação da operação Lava Jato há um grupo considerável de procuradores da República, delegados federais e agentes policiais, bem como um juiz competente e corajoso administrando tudo. Não é possível uma investigação dos desmandos da OAB Forte, porquanto a Secional não está sujeita a fiscalização do Estado. Não há que se falar em delação premiada. A única investigação possível será o exercício do voto. E se os advogados aprovam os administradores no momento do voto, os lideres da OAB Forte se sentem a vontade para administrar do jeito que entenderem. A argumentação de que basta “seguir o dinheiro” não funciona pois, em comparação com a Petrobras, a quantia é irrisória e pode facilmente ser diluída como honorários. É bem verdade que se aconteceu a contratação das mesmas construtoras, para os diversos prédios, há indicativo de corrupção. Mas como provar se não aconteceu licitação nem prestação de contas?

A cúpula do PT está sendo investigada, e tudo indica que até mesmo Lula  será punido. A OAB forte não foi nem está sendo investigada. Pelo contrário, pretende retomar o poder. Nenhum órgão do governo investiga a OAB. As tentativas, junto à Polícia Federal, no passado, não surtiram êxito. É claro que os tempos eram outros, pois  o PT mandava e desmandava.

São veementes os indícios de que ocorreu corrupção na OAB, mas é difícil de provar. Entre a possibilidade e ausência de prova concreta fica a duvida. Todavia, dirigentes da OAB devem estar acima de qualquer suspeita.

 

(Ismar Estulano Garcia, advogado, ex-presidente da OAB-GO, professor universitário, escritor)

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