Opinião

Espíritos libertários e rebeldes

Redação DM

Publicado em 6 de outubro de 2015 às 22:23 | Atualizado há 10 anos

Henry Miller viveu. E escreveu. E lavou pratos. E fodeu garotas esplêndidas. E recitou Nietzsche e Dostoievski para encher a barriga. E trabalhou como jornalista. Encontrou, na obra de Arthur Rimbaud, um companheirismo imediato. Demorou a conhecer os escritos do poeta francês. Mas quando os conheceu, identificou-se logo de cara. “Foi em 1927, no fundo do porão de uma casa encardida de Brooklyn, que ouvi falar pela primeira vez em Rimbaud. Tinha 36 anos e estava mergulhado em minha própria e tardia temporada no inferno. Um livro fascinante de Rimbaud rolava pela casa sem despertar meu interesse. O motivo era ódio que sentia pela dona do livro, que na época morava conosco. Depois descobri, que em matéria de aspecto, temperamento e conduta, a mulher se parecia tanto com ele quando se é possível imaginar.” Este foi o primeiro parágrafo de A hora dos assassinos, estudo não crítico e autobiográfico sobre a obra de Rimbaud.

Autor de clássicos, Henry Miller recebeu o epiteto de obsceno durante a vida. Quando publicou a trilogia A crucificação encarnada, Miller deu um murro no moralismo. Assim como Rimbaud, ele tinha um espírito libertário e rebelde. Não fazia questão de empregos. Quando passava as mãos nos bolsos, e não tinha nenhuma grana, pedia alguns trocados emprestados aos amigos, que o ajudavam. Miller tocava a vida, sem rodeios, sem ambições. Poeta nato, foi o aluno preferido dos professores, na escola. Algum tempo depois, decidiu abandonar o ensino tradicional. Aí vieram os anos de crise existencial. Miller questionava-se sobre o sentido da vida, até que um dia – após esforço intelectual –, resolveu sair de casa.

Anos depois descobriu a escrita Rimbaud, que o marcou. Henry Miller se debruçou sobre a obra do francês. Ele, que tinha como escritor favorito, até então, o mestre russo Dostoievski, viu-se ser fisgado pela poética visceral e libertária e sonhadora de Rimbaud. “O bom mesmo é um sono bem bêbado na praia”, escreveu o francês, em Uma estação no inferno. Henry Miller fez a mesma coisa. Ao perceber que era diferente dos americanos, decidiu ir à França. Lá, escreveu seu primeiro romance, Trópico de Câncer, criticado e descrito como obsceno. Teve um caso com a também escritora Anais Nin, discípula das descobertas freudianas e influenciada pela escrita proustiana.

Retornou aos EUA, sem grana, sem esperança, sem ambições. A única coisa que Henry Miller realmente tinha era um livro, Trópico de Câncer, que revolucionou o percurso da literatura moderna, chegando a ser proibido no Brasil, durante a ditadura. Perseguiu uma nova linguagem poética. Acreditava que os poetas não são somente aqueles que escrevem versos. Os poetas, segundo Henry Miller, são os que têm coragem de sair por aí e viver a vida, sem pudor; os poetas tem uma forma peculiar de enxergar o mundo. Eles vivem a lamúria dos dias, simplesmente. Em Rimbaud, escreveu ele, “me vejo como um espelho”.

 

(Marcus Vinícius Beck, estudante de Jornalismo e escritor barato)

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