Cultura

Da combatividade ao lirismo

Redação DM

Publicado em 22 de setembro de 2015 às 21:31 | Atualizado há 8 meses

Por: Walacy Neto

Um escritor trabalha a vida inteira debruçando os dias e os braços sobre a poesia. No papel ele inventa, destrói, constrói e movimenta. O texto num nível abrangente, sem cercas, ele produz. Durante vários anos da vida um poeta se joga por cima dos seus escritos, deixa que como um sangue a tinta vaze livremente. Livros e mais livros são publicados e vendidos. É convidado a viajar o mundo, ler um poema ali, debater sobre a função da poesia acolá, um lançamento novo e o escritor continua sempre falando sobre o que “transvê” do mundo no poema. Simples seria se a criação de um poeta se valesse apenas dessa rotina desgastante de eventos ilusórios, mas não é.

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Por 49 anos o poeta Pablo Neruda disponibilizou seus braços sobre os traços no papel, ou melhor, por quase meio século Pablo Neruda escreveu poesias. São 32 livros, um Prêmio Nobel de Literatura e vários acontecimentos históricos influenciados diretamente pelo chileno. Hoje se completa 43 anos de sua morte e escrevo esta reportagem não como uma análise crítica, mas como uma homenagem. Ninguém precisa falar por Neruda, pois acredito que tudo que ele pode dizer já está dito, ou seja, escrito.

Pablo Neruda é um nome artístico escolhido para homenagear a poeta theco Jan Neruda. Neftalí Ricardo Reyes Basoalto, o Nerduda chileno, nasceu no dia 12 de julho de 1904, em Parral, no Chile. É considerado um dos poetas mais interessantes do século XX devido ao lirismo e combatividade encontrada em seus livros. Foi sucesso desde a publicação do primeiro original, o Crepusculário, publicado em 1923 quando Neruda tinha apenas 20 anos de idade. O livro é um compilado com diversas poesias de Neruda escritas na adolescência e não fica atrás, quando se fala em qualidade poética, de nenhum dos outros livros lançados em seguida.

O poeta é um misto de diversos sentimentos em relação ao mundo. No livro Cem Sonetos de Amor, o poeta mergulha profundamente nos detalhes desse tal sentimento que tudo mundo tem, teve ou vai ter. Não que este apele pra algo fácil, coisa que todo mundo entende é o amor, mas como este coloca o determinado sentimento. E, convenhamos, nada casa melhor do que soneto e uma relação amorosa, seja esta um conflito, um abrigo ou qualquer outro formato que o amor desenha. Neruda desenha o amor de cem formas diferentes.
Militância

Assim como outras expressões artísticas, a poesia também se adapta e em alguns momentos é uma ferramenta de combate. O movimento musical brasileiro dos anos de ditadura, por exemplo, foi um dos principais motores (ou vozes) contra a opressão do governo militar. Além de poeta Pablo Neruda também foi membro do comitê central do Partido Comunista, embaixador do país na França, senador no Chile e diplomata. No ano de 1936, quando a Guerra Civil Espanhola se desenrolou, o poeta se viu em meio a uma explosão de acontecimentos, entre estes o assassinato do amigo Garcia Lorca. A morte de Garcia levou Neruda a se comprometer com o movimento republicano e inserir em seus poemas as ideologias que aceitava.

Em 1937 escreve o livro Espanha no coração, quando estava na França. Logo após Neruda retorna ao Chile onde começa a produzir diversos textos. É desta época que a política e as questões sociais se adentram na obra literária do chileno. Em 1939 começa a trabalhar como cônsul para a imigração espanhola em Paris e logo em seguida se torna cônsul Geral do México. Mesmo na França o poeta não deixa de lado o prazer que sente em falar de sua terra e suas origens. Nesta época escreve o Canto Geral do Chile, considerado um dos poemas mais épicos do autor, onde ele fala de belezas naturais e sociais do continente americano.

Perseguições

Seguindo uma espécie de tendência recorrente na vida daqueles que tem muito pra falar e falam, Neruda sofreu perseguições ferrenhas do governo quando deu voz a determinados assuntos que cutucam. No ano de 1943 é eleito como senador da República no Chile. Durante os anos que esteve neste cargo, disparou críticas contra o presidente da época, González Videla. Neruda se sentia comovido pelo tratamento repressivo que os trabalhadores de minas recebiam e começou a discursar contra os maus tratos. Foi perseguido pelo governo e logo após teve de se exilar na Europa.

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Apesar de fora de sua terra natal, a poesia não ficou escondida. No ano de 1952 publica Os versos do capitão e dois anos depois As uvas e o vento. Em 1953 recebe o prêmio Stalin da Paz, em 1965 o título de honoris causa da Universidade de Oxford, da Inglaterra, e em outubro de 1971 o Prêmio Nobel de Literatura. De fora do Chile, o poeta é aclamado em diversas partes do mundo e influência diretamente poetas como Vinicius de Moraes, que afirmou ter encontrado nas conversas com Neruda a identificação com a poesia do mesmo.

Neruda teve um pouco de sossego ao final da vida, aparentemente. No ano de 1972 o governo do socialista Salvador Allende foi instaurado e o poeta foi novamente designado como embaixador na França. Um ano se passar e no dia 23 de setembro Neruda havia de retornar ao Chile devido a um suposto câncer de próstata quer levaria sua vida na Clínica Santa Maria de Santiago. Mas existem controvérsias sobre o acontecimento.

A morte de Neruda gerou estranheza, pois viria a ocorrer 12 dias após a instalação da ditadura militar de Augusto Pinochet. Porém, os boatos foram desmentidos no ano de 2013 quando um grupo de peritos analisou os restos mortais do poeta e não encontrou nenhum elemento químico, o que descartava a possibilidade de envenenamento pelo governo Pinochet. Os especialistas confirmaram que o poeta estava com o câncer em estágio bastante avançado, o que fora comprovado com a existência de lesões metastáticas disseminadas em vários segmentos do corpo, que correspondia à doença que o assolava.

Um poeta se debruçou durante quase meia década por sobre o papel e rabiscou o mundo com poesia. Morreu, de fato, mas boa parte do que foi dito está escrito e, portanto, não é possível que seja apagado. Pablo Neruda falou, falou por vários meios e de várias formas. E o que fica é o que nos interessa: sua poesia.

Saudade

Saudade é solidão acompanhada,
é quando o amor ainda não foi embora,
mas o amado já…

Saudade é amar um passado que ainda não passou,
é recusar um presente que nos machuca,
é não ver o futuro que nos convida…

Saudade é sentir que existe o que não existe mais…

Saudade é o inferno dos que perderam,
é a dor dos que ficaram para trás,
é o gosto de morte na boca dos que continuam…

Só uma pessoa no mundo deseja sentir saudade:
aquela que nunca amou.

E esse é o maior dos sofrimentos:
não ter por quem sentir saudades,
passar pela vida e não viver.

O maior dos sofrimentos é nunca ter sofrido.

É Proibido

É proibido chorar sem aprender,
Levantar-se um dia sem saber o que fazer
Ter medo de suas lembranças.

É proibido não rir dos problemas
Não lutar pelo que se quer,
Abandonar tudo por medo,

Não transformar sonhos em realidade.
É proibido não demonstrar amor
Fazer com que alguém pague por tuas dúvidas e mau-humor.
É proibido deixar os amigos

Não tentar compreender o que viveram juntos
Chamá-los somente quando necessita deles.
É proibido não ser você mesmo diante das pessoas,
Fingir que elas não te importam,

Ser gentil só para que se lembrem de você,
Esquecer aqueles que gostam de você.
É proibido não fazer as coisas por si mesmo,
Não crer em Deus e fazer seu destino,

Ter medo da vida e de seus compromissos,
Não viver cada dia como se fosse um último suspiro.
É proibido sentir saudades de alguém sem se alegrar,

Esquecer seus olhos, seu sorriso, só porque seus caminhos se
desencontraram,
Esquecer seu passado e pagá-lo com seu presente.
É proibido não tentar compreender as pessoas,
Pensar que as vidas deles valem mais que a sua,

Não saber que cada um tem seu caminho e sua sorte.
É proibido não criar sua história,
Deixar de dar graças a Deus por sua vida,

Não ter um momento para quem necessita de você,
Não compreender que o que a vida te dá, também te tira.
É proibido não buscar a felicidade,

Não viver sua vida com uma atitude positiva,
Não pensar que podemos ser melhores,
Não sentir que sem você este mundo não seria igual.

Quero apenas cinco coisas..
Primeiro é o amor sem fim
A segunda é ver o outono
A terceira é o grave inverno
Em quarto lugar o verão
A quinta coisa são teus olhos
Não quero dormir sem teus olhos.
Não quero ser… sem que me olhes.
Abro mão da primavera para que continues me olhando.


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