Cultura

A Sorte grande na vida

Redação DM

Publicado em 7 de agosto de 2015 às 23:59 | Atualizado há 10 anos

O velho gaitista toca mais um blues em sua harmônica surrada.

Do outro lado da rua, a jovem advogada amarra em suas virilhas,

O apetite úmido de uma ninfomania.

Meio a solos desafinados de um instrumento enferrujado,

o pobre coitado a fita pelas lentes escuras dos óculos,

supondo a cor da peça intima por debaixo daquela saia de cetim.

Não percebe as moedas mirradas que pessoas apressadas depositam

em seu chapéu coco, sustento para as cartas e o álcool.

Ela pede um expresso na cafeteria e acende seu cigarro,

revelando na cruzada de pernas a cinta de renda branca

que abraça suas saudáveis coxas.

Desconcertado, o instrumentista disfarça o efeito que aquela cruzada

provocou em sua desbotada calça de cetim com bends mal-sucedidos

naqueles pequenos orifícios ensalivados.

A cada trago, a mulher imagina que tipo de estrago aquela boca

poderia fazer a favor de seu prazer, já que, mesmo velho e maltrapilho,

carregava uma certa elegância naqueles cabelos desgrenhados.

Terminados café e cigarro, ela se levanta, atravessa a rua e coloca

dentro do encardido pedaço de feltro,

50 pratas, seu cartão e no guardanapo, um recado:

“Tome um drinque, descanse a boca, mais tarde precisarei dela.”

 

(Simião Mendes, 31 anos, goiano, poeta e vocalista da banda Vandalismo Poético, estudante do curso de Letras da Universidade Federal de Goiás)


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