Opinião

As bem-aventuranças de Jesus

Redação

Publicado em 19 de abril de 2015 às 02:11 | Atualizado há 10 anos

Vendo Jesus essa multidão, subiu ao monte; e depois de sentar-se, aproximaram-se dele os seus discípulos. Erguendo então os olhos para os seus discípulos, pôs-se a falar e os ensinava, dizendo:

“Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o Reino dos Céus.

Bem-aventurados os que são brandos, porque herdarão a terra.

Bem-aventurados os que choram, porque serão consolados.

Bem-aventurados os que tem fome e sede de justiça, porque serão saciados.

Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia.

Bem-aventurados os puros de coração, porque verão a Deus.

Bem-aventurados os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus.

Bem-aventurados os que são perseguidos por causa da justiça, porque deles é o Reino dos Céus.

Sereis bem-aventurados, quando os homens vos amaldiçoarem, vos perseguirem, vos rejeitarem, vos odiarem, vos carregarem de opróbrios e de injúrias, e repelirem vosso nome como infame por causa do Filho do Homem, e falsamente disserem  de vós toda sorte de mal, por minha causa. Alegrai-vos e exultai nesse dia, porque será grande a vossa recompensa nos céus, pois foi assim que seus pais  perseguiram os profetas, que vieram antes de vós.

Mas, ai de vós, ricos, porque já tendes a vossa consolação!

Ai de vós, que agora estais fartos, porque tereis fome!

Ai de vós, que agora rides, porque haveis de lamentar-vos e chorar!

Ai de vós, quando vos louvarem os homens, porque assim seus pais trataram os falsos profetas”. (Evangelhos de: Mateus, cap. 5, vv. 1 a 12 – Lucas, cap. 6, vv. 20 a 26).

Jesus inicia o seu monumental código de ética, denominado Sermão da Montanha, iniciando com as promessas de recompensas eternas aos que perseveram no Bem e nas virtudes ainda que enfrentem dores e adversidades. Ele inicia o Sermão da Montanha listando esses laureis, ou seja, essas bem-aventuranças.

O divino Messias inicia as verdades das recompensas, enaltecendo os que se reconhecem espiritualmente pobres diante do Criador da Vida, transformando-se em instrumentos dóceis de Sua vontade soberana. São para esses, o Reino dos Céus, isto é, o reino ou a comunidade espiritual dos que gozam da ventura de desfrutar da plena confiança de Deus. Também é possível interpretar essa máxima no seguinte sentido: aqueles que padecem de necessidades materiais e ainda assim se mantêm no trabalho e no cultivo das virtudes também desfrutarão da felicidade que a Lei divina proporciona, além de constatarem que as demais coisas lhes serão acrescentadas. A humildade sempre possibilita um processo eficaz de autoconhecimento, facultando o conhecimento das potencialidades e limitações do espírito.

Quando Jesus afirmou “Bem-aventurados os que são brandos, porque herdarão a terra”, indicou a brandura ou a mansidão como sendo o primeiro passo para a experiência do amor por si e por todos os seres da Natureza. A herança da terra são as oportunidades de evolução espiritual bem aproveitadas que as reencarnações terrenas nos possibilitam. O espírito que não mais necessita reencarnar no orbe terrestre e avança para mundos mais evoluídos tomará posse e carregará para sempre a herança espiritual proveniente de suas vidas terrenas, ou seja, é o herdeiro das riquezas espirituais que o mundo terreno lhe proporcionou. Jesus considera a brandura como uma condição básica para vencermos todos os obstáculos que nos impedem de tomar posse dessa herança divina, isto é, as experiências e vivências bem sucedidas durante as reencarnações terrenas.

A mensagem do Cristo é eminentemente consoladora em todos os níveis e por isso ele não poderia deixar de falar àqueles que sentem dores de toda a natureza, as quais lhes arrancam lágrimas físicas e espirituais. Por isso, o divino Mestre asseverou: “Bem-aventurados os que choram, porque serão consolados”, indicando que, ainda entre lágrimas, não devemos desesperar, mas perseverar no trabalho, na fé, na esperança e na caridade, condições fundamentais para a tão esperada, merecida e consequente recompensa da consolação. Ele mesmo chorou em diversas ocasiões, sendo consolado por Deus, o Pai Supremo e Criador de todas as coisas, a quem ele chamava constantemente e com intimidade Abba, ou seja, paizinho.

Jesus viveu num tempo de muitas injustiças e conhecia as dores dos oprimidos e dos injustiçados. Pela primeira vez no Sermão da Montanha, ele usou uma metáfora: “Bem-aventurados os que têm forme e sede de justiça, porque serão saciados”. Ele sabia que as injustiças humanas, sociais, econômicas, políticas, religiosas e institucionais geram agonia e dores atrozes, semelhantemente aos que sentem fome e sede. Ainda assim, ele recomenda que permaneçamos na fé e no caminho reto da justiça, porque a Lei Natural de Justiça, determinada por Deus a tudo registra e sabe processar os métodos eficazes de educação para que os indivíduos saibam considerar ou respeitar os direitos naturais de outrem. Isso, por meio da dor provacional ou expiatória, ou por meio dos caminhos emocionantes do amor.

O divino Mestre avança para as recompensas reservadas aos que sabem perdoar: “Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia”. Compaixão, piedade e indulgência são virtudes afins que atuam como ferramentas do amor-misericórdia que leva ao perdão. As nossas dívidas morais perante a justiça da Lei Natural é pagável, mas as nossas dívidas espirituais diante da misericordiosa graça de Deus são impagáveis. Alcançarão misericórdia perante a Lei Natural de Justiça aqueles que também forem compreensivos e souberem perdoar às ofensas do seu próximo. No entanto, já alcançamos a misericórdia de Deus desde o momento da nossa criação, independentemente de sermos ou não misericordiosos.

Jesus também asseverou: “Bem-aventurados os puros de coração, porque verão a Deus.” Allan Kardec pergunta aos espíritos nas questões 10 e 11 da obra O Livro dos Espíritos, (Edição FEB, tradução de Guillon Ribeiro):

“10. Pode o homem compreender a natureza íntima de Deus?

“Não; falta-lhe para isso o sentido.”

  1. Será dado um dia ao homem compreender o mistério da Divindade?

“Quando não mais tiver o espírito obscurecido pela matéria. Quando, pela sua perfeição, se houver aproximado de Deus, ele o verá e compreenderá”.”

Allan Kardec comenta as respostas:

“A inferioridade das faculdades do homem não lhe permite compreender a natureza íntima de Deus. Na infância da Humanidade, o homem O confunde muitas vezes com a criatura, cujas imperfeições lhe atribui; mas, à medida que nele se desenvolve o senso moral, seu pensamento penetra melhor no âmago das coisas; então, faz ideia mais justa da Divindade e, ainda que sempre incompleta, mais conforme à sã razão.”

Os “puros de coração”, segundo o conceito de Jesus, são aqueles que atingiram a perfeição intelecto-moral, ou seja, atingiram elevados níveis de compreensão (intelectual) e de amor (moral) diante dos principais fenômenos da Vida. São os seres espirituais que não mais necessitam de encarnações em mundos corpóreos porquanto os seus caminhos para evolução ocorrem em mundos extracorpóreos, isto é, no plano espiritual. Desse modo, o Mestre revela que a pureza de coração, ou seja, a pureza de sentimentos, somente alcançada por meio da sabedoria e do amor, é o único meio de obtermos uma plena compreensão da natureza íntima do Pai.

Jesus também enaltece os que promovem a paz. Pela primeira vez, ele fala de um tipo de recompensa até agora não mencionada: a recompensa do reconhecimento por parte dos que valorizam a Paz: “Bem-aventurados os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus”. Ser “Filhos de Deus” é o título designado por Jesus aos que promovem a paz e o entendimento entre os homens.

A missão de pacificar é valorizada por Jesus. Diante de Pedro, designado para coordenar o seleto grupo dos apóstolos, o Rabi questionou por três vezes (João 21:15-17): “Pedro, tu me amas?” Para cada uma das três afirmativas do apóstolo, o Mestre recomendou: “Apascenta as minhas ovelhas”. Desse modo, o Rabi revelou a razão primeira da convivência humana: pacificar, unir para que haja amor. Esse é o desejo do Pai: ver os seus filhos numa convivência pacífica para o bem e o progresso de todos.

Ao prosseguir com as Bem-aventuranças, Jesus mais uma vez trata do tema Justiça: “Bem-aventurados os que são perseguidos por causa da justiça, porque deles é o Reino dos Céus”. Antes, o Mestre mencionou que “os têm fome e sede de justiça serão saciados”. Do mesmo modo que não sabemos tudo o que Deus é e sim o que Ele não pode deixar de ser para ser Deus, também não conhecemos inteiramente os mecanismos da Justiça divina; mas sabemos que a Lei Natural de Justiça existe e atua das formas mais eficazes, inesperadas, misteriosas e impressionantes possíveis. Sabemos quase nada a respeito da Lei de Justiça, o que sabemos se vincula aos mecanismos de justiça das sucessivas reencarnações, dos fenômenos da ação e da reação, ou seja, da causa e do efeito, por exemplo: “Pedro, põe a tua espada no seu lugar, embainha a tua espada, pois todos os que lançarem mão da espada morrerão pela espada”, mas quando e de que modo a Lei agirá ainda não nos é possível saber. No entanto, sabemos que a reação da Lei virá inexoravelmente. As vítimas de injustiças poderão passar por algum processo de resgate moral, mas se permanecerem no caminho da retidão serão recompensadas. O que não significa a aceitação da injustiça, mas o perdão das ofensas e prática da caridade para com o ofensor segundo dos ditames da Justiça Natural.

Como exemplos de injustiças, Jesus descreve diversos tipos de perseguições que alguém pode sofrer por vivenciar e defender as suas verdades, a sua vida e os seus ensinos. O Mestre solicita que não desistamos porque há muito tempo que perseguições são frequentes com quem defende os valores do Bem, da Verdade e da Justiça de Deus e cita os exemplos dos profetas que foram perseguidos e mortos por nossos antepassados. Ele nos consola, recomendando que não desistamos no cumprimento dos nossos deveres porque a recompensa é grande para quem persevera no Bem. Nesse sentido, o divino Messias já antevia as dores que ele, João Batista e seus discípulos teriam de passar por vivenciarem e defenderem as verdades de Deus; ele de forma serena, imperturbável e amorosa; João Batista de maneira humilde e resignada; os seus apóstolos, de forma corajosa e heróica; numerosos discípulos nas arenas de Roma, cantando hinos de louvor a Deus, causando admiração e respeito aos justos e espanto aos detratores.

Jesus também alerta aos perseguidores, aos ricos indiferentes ao sofrimento humano, aos que se alegram, ignorando as dores e as tristezas dos que sofrem, aos que se locupletam pelas ambições do poder, da fama e das riquezas materiais. Se recompensas esperam os que palmilham pelos caminhos do Bem, também sofrimentos atrozes aguardam aos praticantes da iniquidade.

As bem-aventuranças de Jesus é uma descrição realista das causas e consequências das nossas ações no uso do livre-arbítrio. As bênçãos são os resultados finais das ações justas e generosas. O processo educativo pela dor é a última consequência da colheita dos injustos e egoístas contumazes. Cabe a cada um de nós a escolha. O alerta foi dado há mais de dois mil anos. Observemos que os ensinos de Jesus são comprovados no dia a dia porque não há como enganar as Leis de Deus. A perfeição espiritual é a recompensa destinada aos filhos de Deus. Ninguém poderá fugir eternamente dos desígnios do Pai. Não há como adiar indefinidamente esse religare da Lei Natural do Progresso. Não como evitar essas bem-aventuranças que foram endereçadas prioritariamente aos justos, ainda que estes temporariamente tenham trilhado os caminhos da injustiça e do desamor. As bem-aventuranças de Jesus representam, na prática, o funcionamento do pensamento diretor de Deus, seu propósito para cada um de nós destinados a conhecê-Lo e a desfrutar com Ele da Sua suprema felicidade.

 

(Emídio Silva Falcão Brasileiro, escritor, conferencista, pesquisador, professor universitário, advogado, doutor em Direito, membro da Academia Espírita de Letras do Estado de Goiás, da Academia Goianiense de Letras e da Academia Aparecidense de Letras. E-mail: [email protected])

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