Área milionária paga com moeda podre
Redação DM
Publicado em 17 de abril de 2015 às 01:32 | Atualizado há 10 anosHélmiton Prateado Da editoria de Política&Justiça
A Prefeitura de Goiânia vendeu três terrenos no Parque Lozandes para a Construtora Queiroz Silveira, sem licitação e aceitou em pagamento títulos precatórios, comprados no mercado com deságio. A área total de 8.618 metros quadrados foi negociada por R$ 3.467 milhões e a escritura foi passada no dia 31 de março de 2010, um dia antes do então prefeito de Goiânia, Iris Rezende, renunciar para ser candidato ao governo do Estado.
A história da área onde a Queiroz Silveira está erguendo três torres em um empreendimento chamado Lozandes Corporate Design começou com outras empresas interessadas no negócio, mas que foram preteridas na facilidade. Ainda em 2006, segundo ano da gestão do prefeito Iris Rezende, a prefeitura abriu licitação para alienar (vender para terceiros) diversas áreas públicas. Três lotes em especial foram arrematadas pelas construtoras Fuad Rassi Engenharia e Warre Engenharia e Saneamento ao preço de R$ 3,165 milhões.
As empresas fizeram um expediente no processo de licitação solicitando para compensar os valores com créditos junto ao município de Goiânia. Esses créditos eram justamente precatórios. Em outubro de 2007, mais de um ano depois, a procuradora Maria Desirée Santana Roriz Lima emitiu parecer contrário à pretensão e favorável a que a licitação fosse revogada.
Em 2009, começou a ser preparada a negociação para acontecer com os precatórios. Um precatório oriundo de uma desapropriação foi negociada pelos credores com a Procuradoria-Geral do município, com os detentores do crédito concedendo um desconto e podendo negociar esse crédito com empresas para quitação de débitos para com a Fazenda municipal.
Em dezembro de 2009, foi lavrada uma escritura de Cessão de Direito Parcial de Precatório entre os donos do crédito e a Queiroz Silveira. Por esse crédito, a Construtora Queiroz Silveira pagou pouco mais de R$ 709 mil, com o destaque de que “a cessão dos créditos foi celebrada com a finalidade de se promover a quitação das dívidas tributárias e/ou futuros da cessionária devidas ao município de Goiânia, relativamente aos créditos tributários de natureza: ITU, IPTU etc…”
Premeditação
A Prefeitura de Goiânia, sob a batuta de Iris Rezende, e a Queiroz Silveira já estavam negociando as três áreas milionárias muito antes disso. O prefeito Iris Rezende e seu procurador-geral, Marconi Pimenteira, assinaram com os diretores da Queiroz Silveira um “Termo de Compromisso de Compra e Venda” em que o município se comprometia a vender os terrenos para a Queiroz Silveira. O detalhe é que foi forjada uma dispensa de licitação.
Para a compra dos terrenos, a Queiroz Silveira se comprometia a pagar uma entrada de R$ 577.994,50 e outras cinco parcelas de igual valor e sequenciais. Ocorre que nada foi recolhido para os cofres municipais.
A prefeitura, em tese, abriu uma licitação para vender os terrenos e essa concorrência se deu “deserta”, ou seja, não apareceu nenhum interessado em negociar as áreas milionárias, nem mesmo as interessadas de antes. Fontes da Procuradoria do município comentaram que essa licitação pode ter sido anunciada em um edital somente em um site sem que tenha havido publicidade do ato para que ninguém tomasse conhecimento e não aparecesse para oferecer lance.
Assim foi feito. Como a licitação foi “deserta” por falta de interessados a Lei de Licitações e Contratos autoriza o poder público a fazer uma “venda direta”, sem licitação, ou apenas convidando interessados na negociação.
O Termo de Compromisso de Compra e Venda foi assinado em março de 2008 e a Queiroz Silveira se comprometia a pagar, pelas três áreas, a quantia de R$ 3,467 milhões, ou apenas R$ 2.000 a mais que a avaliação de dois anos antes. Cumprindo o rito do compromisso, a negociação se completou em 31 de março de 2010, com a Escritura Pública de Compra e Venda lavrada no Cartório Índio Artiaga. Um dia depois, em 1º de abril, Iris Rezende renunciou ao mandato de prefeito para ser candidato a governador do Estado.
A facilidade negada em 2007, de quitar o negócio com os precatórios foi aceita dessa vez, no último dia de gestão de Iris na prefeitura. Especialistas em Direito Tributário são unânimes em afirmar que o uso de precatório é legal e válido para quitação de débitos tributários, mas não para compra de bens imóveis públicos.
A reportagem procurou a empresa Queiroz Silveira para se pronunciar. Seu advogado informou que a empresa entende que a negociação foi legal e que nada acrescentaria.
A Prefeitura de Goiânia tem um procedimento para apurar essa venda e de outras áreas também.