ATIVIDADES RELIGIOSAS X VÍNCULO EMPREGATÍCIO
Redação DM
Publicado em 8 de agosto de 2022 às 10:33 | Atualizado há 3 anos
Não são poucos os questionamentos que recebo indagando se uma instituição religiosa pode ou não configurar como empregador; e, se assume ou não responsabilidades no âmbito trabalhista em relação aos líderes religiosos.
A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) traz que qualquer pessoa, quer física ou jurídica, pode ser considerado empregador. Mais além, traz que para que exista a relação de trabalho entre empregado e empregador, deve-se verificar a existência do vínculo empregatício.
Ou seja, para ser considerado empregado é necessário que uma pessoa física celebre com o empregador um contrato de trabalho no qual conterá as ordens, cumprimento de tarefas e especificidades, determinando-se a jornada de trabalho e local para sua realização mediante o recebimento de salário, assumindo o contratante/empregador os riscos da sua atividade empresarial.
Dito isso, precisamos pontuar que as instituições religiosas, instituições de beneficência, associações sem fins lucrativos se equiparam a empregador. Do mesmo modo, qualquer pessoa física, absolutamente capaz, pode ser empregado destas instituições, nos moldes do arts. 5º e 44 do Código Cívil c/c arts. 2º e 3º da CLT.
Entretanto, a celeuma está na figura de sacerdotes, líderes religiosos, ou ainda membros de instituições religiosas que, voluntariamente, oferecem seus serviços a estas instituições e, posteriormente, ingressam na Justiça do Trabalho pleiteando direitos trabalhistas.
Tenho visto nas decisões judiciais o não reconhecimento do vínculo empregatício às pessoas (que não são sacerdotes) que seguem a fé professada pela organização religiosa e oferecem seus serviços àquelas organizações de forma gratuita. Visto que, prestam serviços de forma gratuita e esporádica.
Da mesma forma, tenho visto obreiros (diáconos, músicos, regente de coral, presbíteros etc) – que são aqueles que prestam habitualmente serviços necessários ao bom andamento das atividades religiosas, dedicam parte de seu tempo, voluntariamente às atividades eclesiásticas, podendo receber ou não ajuda de custo (reembolso de alguma despesa) de forma esporádica da instituição religiosa – não terem o vínculo reconhecido.
Neste último caso, dificilmente o juízo trabalhista reconhece vínculo empregatício. Até porque, em sua grande maioria, estão presentes o curto lapso temporal e a voluntariedade dedicada ao trabalho clérigo, ainda mais por possuírem vínculo empregatício, e, portanto, remunerado com outra pessoa (física ou jurídica).
Mas, não tem sido incomum ver, e participar ativamente, o grande debate em todos os Tribunais do Trabalho do país quanto aos ministros/líderes/sacerdotes religiosos das mais diversas matizes.
Comumente as demandas são após a sua saída da instituição religiosa em busca de reconhecer o vínculo com a antiga instituição religiosa a qual pertencia. Contudo, importante ponderar aqui que, conceitualmente, a função como sacerdote ou líder espiritual traz dentre suas atribuições principais a difusão de sua fé e apoio espiritual aos fiéis. E, portanto, subordinam-se aos ditames eclesiásticos determinados no estatuto da instituição religiosa e em seu regimento interno, como a percepção de prebenda ou ajuda de custo mantidas com doações e dízimos dos fiéis.
Logo, o trabalho sacerdotal por eles desempenhado, geralmente, não visa a obtenção de contraprestação pela realização de suas funções, como é o caso das relações de emprego e, consequentemente, não há que se falar em direitos trabalhistas por não se tratar de categoria ou classe de trabalhadores, como tem se posicionado o TRT 18ª Região (ROT – 0011259-69.2020.5.18.0129, 02/09/2021; RO 104458820205180054, 08/12/21) e outros pelo país.
Por outro lado, há também julgados, inclusive do Tribunal Superior do Trabalho (TST) em que, mesmo sendo a atividade de convicção religiosa, tem-se afastado a função religiosa se comprovados, no processo, os requisitos para caracterização de vínculo empregatício entre líderes religiosos e a instituição religiosa, existindo ou não natureza comercial da instituição, ou seja, o desvirtuamento institucional (TST, RR-19800-83.2008.5.01.0065, DEJT 10/02/2012; RR-34600-12.2008.5.01.0035, 05/05/14).
Logo, faz-se necessário, que tanto a instituição religiosa quanto o líder religioso, consulte advogada(o) especialista na área para analisar cada caso e verificar a existência ou não da relação empregatícia.
Prof.ª Karolinne Pires Vital
Mestra em História pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás – PUCGOIAS. Docente Universitária da Graduação e Pós-Graduação, pesquisadora e coordenadora do Grupo de Estudos sobre Direito Eclesiástico do Centro Universitário UniAraguaia. Assessora jurídica AGR.
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