Viver e conviver
Redação DM
Publicado em 27 de janeiro de 2016 às 00:11 | Atualizado há 10 anos
Viver independe da gente. A gente simplesmente nasce, queira nascer ou não, a gente nasce, por uma razão imperiosa que desconhece, emanada da Divindade, pra quem naturalmente crê na Divindade, mas nasce certamente. Algum tempo depois de nascido, na medida em que vai adquirindo mais consciência de grupo ou espécie, aí a gente se depara com o grande ou maior dilema da vida: conviver com o semelhante, nem sempre semelhante, mas muitas vezes diferente de nós, cultural, social, psíquica ou economicamente.
A verdade é esta: ora, se viver independe da gente, já conviver depende totalmente de nós, por se tratar de ato de vontade. Realidade volitiva.
O Direito distingue Ato de Fato.
O Fato acontece independentemente da ação ou da vontade das pessoas, sendo um sucedido absolutamente natural. Como exemplo, a passagem natural do tempo, causando consequências jurídicas, como a prescrição, decadência e caducidade.
Enquanto que o Ato traduz a atuação humana, dependente da vontade, para que produza consequencias jurídicas. Portanto, o Ato é toda ação humana capaz de criar, extinguir, manter, alterar ou transferir direitos.
Não restam dúvidas de que, sob esse prisma jurídico aí, viver ou nascer se insere na categoria dos Fatos.
Ao passo que conviver, ah conviver!, se inclui precisamente na dos Atos. Ora pra conviver é preciso precisamente querer conviver. Não mais do que ter vontade de compartilhar o espaço e o tempo com o outros ou outras. Vontade esta nem sempre cortadamente pacífica.
E conviver prazerosamente é mais fácil ainda. Foi exatamente por isso mesmo, cremos nós, que o homem concebeu a cultura, como técnica, valor ou prática que facilita mais facilmente a convivência e a paz grupal. Ou a concórdia coletiva. Uma forma de coexistir deliciosamente.
É mais ou menos isso o que alardeia o historiador brasileiro, Alfredo Bosi, quando diz em a Dialética da Colonização ser a cultura “o conjunto de práticas, de técnicas, de símbolos e de valores que se devem transmitir às novas gerações para garantir a reprodução de um estado de coexistência social”. Sendo coexistente o “que convive harmoniosamente ou de maneira pacífica”.
Um exemplo de coexistir deliciosamente é em torno de uma gorda e reconfortante feijoada, ah, não há nada que se compare a uma dessas feijoadas em torno!, uma daquelas fumegantes, cujos ingredientes são, sem exceção nenhuma, incluindo a indispensável e inebriante caipirinha, há anos, culturalmente transmitidos geração a geração. Principalmente através da cozinheira mais velha do grupo. O feijão preto, a linguiça, o toicinho, a costela, a orelha de porco, o lombo salgado, a couve refogada, são motivos, rimando, de riso e alarido para um mundo inteiro, onde pulse um coração brasileiro.
(Pedro Nolasco de Araujo é bacharel em Direito, especialista em Direito Constitucional, mestre em Gestão do Patrimônio Cultural e membro da Associação Goiana de Imprensa)