Opinião

Cerveró arranha a espinha dorsal do governo

Diário da Manhã

Publicado em 14 de janeiro de 2016 às 22:09 | Atualizado há 9 anos

A testemunhal é a prostituta das provas, diz-se no fórum. Delação premiada, por consequência, a prostituta remunerada pelo Estado. Não obstante, o instituto foi essencial para limpar outras plagas de pragas “políticas”. A Itália é exemplo. A corrupção criada sob o manto do poder só pode corresponder heterodoxia semelhante. A seguir o ramerrão de métodos judiciais tradicionais e “garantistas”, os atos oriundos de corrupção ficariam soterrados desde seus idos às calendas gregas.

A Nestor Cerveró, obviamente, o governo acusado não atribui nenhuma credibilidade. É possível, sim, que delação premiada não contenha um grão de certeza. Porém, em direito a certeza recebe a contribuição da verossimilhança. Na avaliação das provas, os olhos podem ser perfeitamente substituídos pela inteligência. Sob pena de termos de conviver com a impunidade.

A delação de Cerveró tem lógica granítica e abala personagens centrais do poder: Lula, Dilma, Renan e Collor.

Lula o nomeou para a Diretoria de Serviços da BR Distribuidora. Gratidão por haver colaborado à quitação de empréstimo de R$ 12.000.000,00 feito ao PT para duas finalidades malcheirosas: calar, em Santo André, o chantagista Renan Maria Pinto, por R$ 6.000.000,00. Nas circunstâncias esteve envolvido o torpe homicídio de Celso Daniel. A outra metade da laranja podre foi lançada em Campinas, onde, também, foi assassinado um prefeito. Obter um empréstimo pode ser simples, sobretudo por quem tem poder; resgatá-lo é que são elas. No ponto, Cerveró foi decisivo sob o modo de atribuir a uma empresa gêmea do Banco concedente do empréstimo, a Sachin Engenharia, a contratação para operação do navio-sonda da Petrobras, o Vitória 10.000. Qualquer semelhança entre o nome do navio e os fatos é mera coincidência. No meio da embromação entrou como interposta pessoa José Carlos Bumlai, pecuarista amigo siamês de Lula, que ingressava no Planalto como se fora seu celeiro. Hoje preso, perdeu a outrora irrestrita liberdade.

Não ficou por aí, nesse lodaçal específico da Petrobras, as diatribes do ex-Presidente. Segundo o delator, para obstar a explosiva comissão parlamentar de inquérito sobre a Petrobras, Lula removeu da empresa e realocou no Senado José Eduardo Dutra, falecido em 2015, de transição fácil entre os parlamentares, personagem adequada aos acordos, a exemplo de Delcídio Amaral.

Escandalosamente, para quem ouviu Lula tonitruar increpações no Vale do Anhangabaú contra Fernando Collor para “golpeá-lo” com a ajuda dos cara-pintadas, o insigne metalúrgico atribuiu poderes amplos e irrestritos a seu figadal inimigo de outros tempos para mandar e desmandar na BR Distribuidora. Cerveró foi alertado disso diretamente na Casa da Dinda.

A presidente Dilma Roussef apoiou a ilimitada sinecura concedida ao alagoano. Em desabafo a Cerveró, Renan Calheiros confirmou a generosa benesse: por isso é que a candidatura de Collor, naturalmente inviável, deslanchara. A fé e o dinheiro removem montanhas. A moeda de troca foi o alinhamento absoluto e incondicional do triste PTB à oposição à comissão de inquérito sobre a Petrobras. A personagem das Alagoas, caçador de marajás, voltou ao poder como um semideus mitológico.

Renan reclamou de não estar sendo agraciado como os demais; porém encontrou, lá mesmo ou alhures, os milhões de reais que elegem os políticos brasileiros.

Tanto veneno necessitava de um antídoto. Cerveró, servindo a alguém, aplicou canhestramente um ineficaz: corrupção na Petrobrás, também, no já longínquo governo de Fernando Henrique Cardoso, sem indicação de nomes e fatos concretos, como os acima reproduzidos.

 

(Amadeu Garrido de Paula, jurista brasileiro com uma visão bastante crítica sobre política, assuntos internacionais, temas da atualidade em geral. Além disso, tem um veio poético, é o autor do livro Universo Invisível, uma publicação que reúne poesias e contos sobre arte, cultura, política, filosofia, entre outros assuntos, todos os poemas são ilustrados. O livro está à venda no site da livraria Cultura http://www.livrariacultura.com.br/p/universo-invisivel-46024299 e nas livrarias Nobel Santana e Nobel Santo André)

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