Economia

Derrubada de decreto do IOF reduziria despesas livres do governo a nível crítico de R$ 72 bi

DM Online

Publicado em 2 de junho de 2025 às 22:50 | Atualizado há 3 dias

A eventual derrubada do decreto do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) pode reduzir a R$ 72,4 bilhões o espaço que o governo tem para realizar investimentos e honrar despesas ligadas ao funcionamento dos órgãos.
O patamar é considerado crítico por técnicos do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que veem risco de paralisação de atividades dos órgãos ou corte excessivo de investimentos.
O ministro Fernando Haddad (Fazenda) manifestou preocupação com o tema na noite de quarta-feira (28), após reunião com lideranças do Congresso. “Nós ficaremos num patamar bastante delicado do ponto de vista do funcionamento da máquina pública do Estado brasileiro”, disse.
O Orçamento de 2025 reserva R$ 222 bilhões em despesas discricionárias, que incluem gastos com custeio (como pagamento de contratos e contas de luz e água) e investimentos (como realização de obras ou aquisição de equipamentos). Desse valor, R$ 50,4 bilhões são carimbados para emendas parlamentares, e outros R$ 60 bilhões ajudam a cumprir os mínimos de saúde e educação.
Na prática, o governo tem R$ 111,6 bilhões para despesas livres. É sobre essas rubricas que recai boa parte do congelamento de R$ 31,3 bilhões anunciado em 22 de maio.
Segundo cálculos do governo, a contenção sobre as despesas livres será de R$ 24,2 bilhões, somando bloqueio e contingenciamento, e o restante atingirá as emendas.
O bloqueio é mais difícil de ser desfeito, uma vez que as despesas são canceladas para abrir espaço ao crescimento de gastos obrigatórios (como benefícios previdenciários). Já o contingenciamento serve para assegurar a meta de resultado primário após a constatação de frustração de receitas e pode ser revertido se a arrecadação melhorar.
A equipe de Haddad lançou mão do IOF justamente para sustentar as receitas em um patamar mais elevado e evitar um aperto ainda maior nas contas. Mesmo com a medida, o espaço livre para despesas do governo já caiu a R$ 87,4 bilhões.
Eventual derrubada do decreto sem que haja outra fonte de compensação forçará o governo a congelar outros R$ 19,1 bilhões, distribuídos entre emendas e gastos discricionários. O montante já desconta da estimativa de arrecadação inicial (R$ 20,5 bilhões) a perda de R$ 1,4 bilhão com o recuo na taxação das remessas ao exterior feitas por fundos brasileiros de investimento -já compensada pelo saque de recursos da União em fundos privados.
Simulações internas indicam que, em caso de novo congelamento, as despesas livres seriam reduzidas em até R$ 15 bilhões. O valor final dependeria de como a trava seria distribuída, já que os pisos de saúde e educação também encolheriam em decorrência da arrecadação menor com impostos.
O arcabouço fiscal assegura um patamar mínimo de execução das despesas discricionárias, equivalente a 75% do valor autorizado na Lei Orçamentária Anual. Isso significa que o contingenciamento poderia ir a 25% do montante previsto. Nas condições atuais, ele está em cerca de 10%.
Embora a lei permita formalmente o contingenciamento adicional, técnicos do governo avaliam que a aplicação do dispositivo, sugerido pelo Legislativo, é inviável na prática. O resultado, na avaliação desses interlocutores, seria a paralisação de políticas, de órgãos do governo ou de redução drástica de investimentos -tudo isso a pouco mais de um ano das eleições de 2026.
Apesar dos apelos do governo, o Congresso exerce forte pressão contra o aumento do IOF. Na quinta, o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), criticou o que chamou de “gambiarras tributárias” e alertou que o clima no Parlamento é pela derrubada do decreto.
Motta se reuniu na noite de quarta-feira (28) com Haddad e a ministra Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais). O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) e lideranças do Congresso também participaram.
Segundo o presidente da Câmara, ficou combinado com a equipe econômica que ela teria dez dias para apresentar uma alternativa à arrecadação com o imposto.
Na manhã de quarta, Haddad disse que explicou ao comando das duas Casas que a derrubada do decreto deixaria a máquina pública em situação delicada.
No dia seguinte, o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, disse que a eventual derrubada do decreto de aumento do IOF seria equivalente a extinguir o programa habitacional Minha Casa, Minha Vida e os investimentos do Ministério da Defesa.
Nesta segunda (2), Haddad afirmou que acertou com Motta e Alcolumbre a tomada de medidas que possibilitem uma calibragem no decreto de elevação do IOF e a retomada de reformas estruturantes.
Para dar uma dimensão do efeito disso sobre as políticas, o secretário destacou que o programa habitacional tem R$ 12 bilhões reservados para este ano, enquanto a Defesa, incluindo as Forças Armadas, contam com R$ 8 bilhões para investimentos.
“[Derrubar o decreto] significaria o equivalente a extinguir todo o Minha Casa, Minha Vida e todo o investimento do Ministério da Defesa”, disse Ceron.
A comparação não representa uma relação direta entre eventual derrubada do decreto e a suspensão dessas políticas, pois o congelamento de verbas poderia ser distribuído entre mais pastas do Executivo. Segundo o secretário, o objetivo foi “dar a dimensão da importância da discussão”.
Como mostrou a Folha de S.Paulo, o governo quer manter o aumento do IOF pelo menos em 2025 e negociar alternativas à medida apenas para 2026.
Ministros do governo Lula informaram à cúpula do Congresso que não há condições de abrir mão da arrecadação vinda da alta do tributo e que não há tempo para elaborar outras medidas neste ano.
Essa avaliação foi explicitada pelo próprio secretário. “A margem para absorver isso é muito difícil. Então, ela [receita] é imprescindível, a não ser que se tenha uma outra solução que gere o mesmo resultado”, afirmou. “Neste momento, não há alternativa ao IOF e ele é imprescindível.”

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