Nasi diz que pessoas de extrema direita não o representam
Redação Diário da Manhã
Publicado em 19 de junho de 2025 às 18:38 | Atualizado há 9 horas
Duas décadas depois, o festejado ‘Acústico MTV: Ira!’ ainda embala memórias. Nasi Valadão destaca, em entrevista ao DM, o entrosamento dos músicos e afirma que pessoas de extrema direita não o representam
Marcus Vinícius Beck
O Ira! desembarca em Goiás para dois shows. Hoje, no PiriBier, em Pirenópolis, o grupo paulistano celebra as duas décadas de seu festejado “Acústico MTV”. Amanhã, dirige-se ao Centro de Convenções da PUC, na capital goiana, onde se apresenta a partir das 21h.
Será bonito. O público entoará versos cheios de ternura e balançará assim que ouvir os arranjos delicados. Edgard Scandurra emocionará geral quando o violão ressoar pelas caixas de som. Nasi Valadão, ou apenas Nasi, vocalizará as canções — com timbre rasgado.
Embalou muitos beijos, fossas e até porres. Pés na bunda foram curados ao som do “Acústico MTV: Ira!”. As rádios tocavam demais “O Girassol”, cujo eu-lírico tentava se erguer às próprias custas. Mas sempre caia — esse pobre diabo — nos braços deliciosos do amor.
Para o projeto celebratório, o Ira! reuniu uma banda orgânica. “O Johnny Boy, tecladista, é o baixista do Ira! hoje. O baterista é o baterista do Ira! hoje. O Daniel Scandurra, que está no baixo, já foi baixista do Ira! no começo da nossa volta, em 2014”, diz Nasi à reportagem.

“O Jonas Moncaio é o único músico, fora o quarteto, é óbvio, que estava no DVD. É original daquela banda que gravou o projeto da MTV”, conta o vocalista. “E a nova percussionista Juba tem os requisitos que tinha antes Michelle Abu, que era um destaque à parte.”
Segundo Nasi, Juba é muito boa. “Ela tem expressão. Tem axé, como eu digo. Dança”, descreve o artista, dizendo que essas qualidades a colocam à altura de Abu. “E também é conhecida do lugar onde eu vivo, que é chamado de Morro do Querosene, em São Paulo.”
Nasi prossegue com os elogios. “É um reduto artístico muito grande. Eu já a conhecia desde que tinha 15 anos. Juba começava os primeiros passinhos como percussionista”, lembra o cantor. “Foi um entrosamento muito rápido. Diria para você que foi no primeiro ensaio.”
Essa sintonia passa às músicas, chega às pessoas, faz o público sussurrá-las, fechar os olhos e recordar a vida pretérita. “Não são músicos contratados que estão lá com partitura, entendeu? E tocando aquilo direitinho. Foram ensaios divertidos. Isso se reflete nos shows.”
“Não são músicos contratados que estão lá com partitura, entendeu? E tocando aquilo direitinho. Foram ensaios divertidos. Isso se reflete nos shows” – Nasi, vocalista do Ira!
A pretexto das declarações de Nasi, o “Acústico MTV: Ira!” emociona. A versão em DVD tem 19 canções. Arranjos lindos. No formato CD, três composições a menos. Ótimas também. Tanto um produto quanto o outro, porém, oferecem uma visão ampla acerca do grupo.
Entre o fim dos anos 1990 e início deste século, o Ira! retornou aos holofotes. Os discos “Isso é Amor” (1999), “MTV Ao Vivo” (2000) e “Entre Seus Rins” (2001) tiveram boas repercussões. Canções como “Bebendo Vinho”, releitura do roqueiro gaúcho Wander Wildner (ex-Replicantes), impulsionam a banda nas rádios, popularizando-a ainda mais.
Havia ainda a MTV. Na virada para o novo milênio, a emissora norte-americana se achava envolvida em dois formatos fonográficos bem-sucedidos em termos comerciais: o mencionado acústico e o “Ao Vivo”. Este, como o nome sugere, era plugado. Aquele, por sua vez, ia para o lado unplugged, desconectado. Ou seja, eram duas linguagens distintas.
Quem gravasse um formato era meio que excluído do outro. Mas vem o Ira! e quebra essa regrinha, já que fez o projeto eletrificado em 2000 e depois recebeu convite para se desplugar. Para Nasi, a banda foi uma das que mais levou o projeto “Acústico” a sério.

Carisma
“O que isso significa? Uma seleção de bons músicos que se entrosaram pessoalmente com a gente, que tinham um carisma, que eram excelentes em seus instrumentos. Depois, pesquisamos o nosso repertório. Eu, Edgard, Rick Bonadio (produtor). Bem minuciosa, sem pressa, né? Começamos a nos preparar bem antes da gravação”, revela o vocalista.
De acordo com Nasi, os ensaios ocorriam praticamente todos os dias. “Só não ensaiávamos quando estávamos tocando em alguma cidade. Então, esse carinho, essa atenção, esse trabalho a que nós nos dedicamos nesse projeto fez com que o Ira! fizesse um dos ‘Acústicos’ mais celebrados e mais elogiados de todo o catálogo desse produto da MTV.”
Os shows, diz o artista, são lotados, com público emocionado. “Nenhum incidente. Ninguém nos ofendendo. Em alguns lugares há manifestações com relação à democracia, à anistia, e são normais. Se você for ver as principais pesquisas de institutos sérios no Brasil, elas falam que mais de 60% das pessoas são contra a anistia que está posta no Congresso.”
“Mas, no geral, não tem nada. Não tem provocação do público com relação à banda. Nem da gente com relação a setores do público. Eu acho que, para mim, este assunto está encerrado. Já falei o que eu tinha que falar. Pessoas de extrema direita não me representam, entendeu? Democratas de qualquer espectro me representam”, declara Nasi.
Cantor afirma que recepção do público tem sido ótima
Hoje, com músicos entrosados e polidos pela poeira da estrada, o Ira! percorre o Brasil para comemorar as duas décadas de seu disco desplugado. Nem todos, contudo, o entendem. Durante “Rubro Zorro”, em Contagem (MG), o público soltou o coro: “sem anistia.”
“É isso aí”, endossou Nasi, que passou a ser vaiado. Seu comentário contra a anistia aos acusados pelos ataques golpistas do 8/1 dividiu opiniões. Ele reagiu: “Pra vocês que estão vaiando, vou falar uma coisa: tem gente que acompanha o Ira!, mas nunca o entendeu.”
Embora o show tenha revelado algo que já se sabia — a visão de mundo à esquerda da banda —, Nasi afirma que a recepção tem sido ótima. “Tiveram shows em que o público entoou ‘Sem Anistia’. Eu me resumi a falar que eles nos representam. E tiveram shows em que ninguém entoou nada. Eu também fiquei na minha, porque eu acho que meu recado já foi dado.”

“Mas não ouvi nenhuma manifestação de agressão à banda, nem tumulto, nada. Porque esse é o normal do show do Ira! Eu não sou um cara que fica fazendo palestra em show. Falo até, inclusive, pouco. Teço comentários sobre as músicas que irei tocar. ‘Olha, a próxima música tem uma história tal. Olha, essa música é assim, foi gravada tal’. Isso, entendeu?”, conta.
No entanto, em certos momentos, o cantor se solidariza com o que julga ser democrático. “Se têm pessoas que acham que o que aconteceu no 8 de Janeiro, aquelas degradações, aquelas coisas horríveis, pessoas defecando, patrimônio público e histórico destruído, pedindo ditadura militar, entendeu? Aí eu pergunto: é essa direita que quer mudar o Brasil?”
Nasi é categórico. “Vivemos em uma democracia e há alternâncias de poder. A direita novamente ou a centro-direita virão ao poder de novo. Mas ninguém pode corroborar com aquilo. Acho que a direita que se preza repudia o que aconteceu”, reflete. Os ingressos estão sendo vendidos pelo Icones e Balada App a partir de R$ 80 e R$ 180, respectivamente.