Regularizar fila do INSS pode custar pelo menos R$ 14 bi, indicam estimativas
Redação Diário da Manhã
Publicado em 27 de junho de 2025 às 05:47 | Atualizado há 6 horas
Idiana Tomazelli – Folha Press
A regularização da fila do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) pode custar pelo menos R$ 14 bilhões aos cofres públicos, segundo estimativas feitas por técnicos a partir do estoque de pedidos represados, da taxa histórica de concessão e do valor médio dos benefícios. O número também pode ser interpretado como o quanto o governo deixou de gastar até agora com a espera imposta aos segurados.
Como mostrou a Folha de S.Paulo, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) agiu para segurar a fila do INSS e frear a alta de gastos com benefícios previdenciários e assistenciais. Sob orientação da Casa Civil e do Ministério da Fazenda, o instituto usou o programa de enfrentamento à fila, que paga bônus aos servidores pela análise extra de requerimentos, para priorizar processos de revisão de benefícios já concedidos ou apuração de irregularidades no segundo semestre de 2024.
A ordem de preferência consta em ofícios do INSS obtidos via Lei de Acesso à Informação. Um deles diz que as ações para reduzir as filas “precisaram de enérgica moderação dada a prevalência do cenário de restrição orçamentária”. Em nota, o governo federal negou que tenha represado os benefícios. Segurar a fila do INSS não anula a obrigação de pagamento, que continua existindo e precisará ser honrada quando os pedidos forem finalmente analisados. Mas a medida traz um alívio temporário ao governo ao adiar a necessidade de incluir essas despesas no Orçamento.
Outras administrações, como o governo de Jair Bolsonaro (PL), também seguraram as concessões em momentos de aperto fiscal. O efeito final, porém, é negativo tanto para o segurado, que fica mais tempo à espera do benefício, quanto para a União, que precisa pagar valores retroativos à data do pedido, com correção monetária. Além disso, um acordo judicial de 2021 prevê o pagamento de juros quando o tempo de análise ultrapassa os prazos pactuados (que variam de 30 a 90 dias).
Segundo o INSS, o estoque de benefícios está em 2,44 milhões neste mês de junho. A informação foi dada pelo órgão em reunião do CNPS (Conselho Nacional de Previdência Social), já que os boletins oficiais atualizados ainda não foram publicados. O número representa uma queda em relação aos meses anteriores. Em março, a fila atingiu o pico de 2,71 milhões. Em abril, caiu a 2,68 milhões, na primeira queda desde junho de 2023.
Simulações feitas pela Folha de S.Paulo a partir do estoque de junho indicam que o gasto extra do governo pode ser de pelo menos R$ 13,74 bilhões neste ano, considerando uma situação hipotética em que a regularização da fila ocorresse em três meses. O cálculo considera o valor médio dos benefícios concedidos pelo INSS (R$ 1.884,78 em março, último dado disponível) e a taxa média de concessão observada no ano passado (em média, 56,8% dos requerimentos foram aprovados pelo órgão). Também leva em conta só o estoque já existente -o ingresso de novos pedidos, que ocorre na casa de um milhão ao mês, poderia gerar uma nova fila, ainda que menor.
Mesmo que o desrepresamento seja mais gradual, ao longo de cinco meses, o impacto seria de pelo menos R$ 10,7 bilhões. As estimativas consideram apenas o que seria o fluxo mensal de despesas com os novos benefícios e não incluem o pagamento dos valores retroativos. Por isso, o impacto efetivo pode ser ainda maior. A XP Investimentos calcula que reduzir a fila teria um impacto anual de R$ 19 bilhões. Desse valor, R$ 15,7 bilhões seriam pagos em novos benefícios ao longo de 12 meses, e outros R$ 3,3 bilhões cobririam as obrigações atrasadas.
A estimativa considera uma reversão da fila aos níveis de junho do ano passado (quando estava em 1,4 milhão) e uma taxa de concessão um pouco menor (50% dos pedidos). Na prática, 662 mil beneficiários seriam adicionados à folha do INSS. O economista da XP Tiago Sbardelotto diz que a conta considera uma regularização mais gradual da fila, entre 2025 e 2026, com uma redução do estoque a um ritmo de cerca de 100 mil pedidos por mês.
“O que a gente viu foi simplesmente um repasse do custo da Previdência que teria ocorrido no ano passado para este ano. Vimos uma restrição muito forte no Orçamento, por conta justamente de benefícios previdenciários e BPC [Benefício de Prestação Continuada, pago a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda], e o grande risco para este ano continuam sendo estes benefícios”, afirma.
“Na nossa conta, o governo deveria fazer um bloqueio adicional de R$ 7 bilhões [no Orçamento de 2025] para reverter essa fila”, diz. A equipe econômica já precisou congelar R$ 31,3 bilhões em despesas neste ano, dos quais R$ 10,6 bilhões estão bloqueados para compensar o crescimento dos gastos obrigatórios -incluindo Previdência e BPC. Com a derrubada do decreto que elevou o IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), a necessidade de travar despesas pode subir ainda mais.
Por isso, a visão dos economistas e dentro do próprio governo é que está cada vez mais difícil encontrar espaço para absorver novos bloqueios. Em 2024, os gastos previdenciários terminaram o ano R$ 29,9 bilhões acima do valor aprovado originalmente no Orçamento. No início de 2025, segundo Sbardelotto, o ritmo de crescimento real das despesas está mais comportado, na casa dos 2% acima da inflação, mas a tendência é que essa trégua seja temporária.
“Boa parte da desaceleração se deveu a justamente ao aumento de fila. À medida que governo for revertendo, devemos ver crescimento semelhante ao que foi visto no ano passado e que começou a preocupar os analistas. Então, o início de ano não reflete com fidedignidade a trajetória da Previdência”, avalia.