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Acidente em Obra Residencial: De Quem é a Responsabilidade?

Redação DM

Publicado em 7 de julho de 2025 às 12:24 | Atualizado há 8 horas

A decisão de construir ou reformar uma casa costuma ser a materialização de um sonho. Contudo, por trás do planejamento de cômodos e da escolha de acabamentos, existe um cenário que poucos consideram até que seja tarde demais: a ocorrência de um acidente de trabalho dentro da sua propriedade. Quando um trabalhador se lesiona, o sonho pode rapidamente se transformar em um complexo pesadelo jurídico e financeiro. A pergunta que surge é imediata e angustiante: de quem é a responsabilidade?

A resposta é mais complexa do que se imagina e raramente se limita ao empregador direto do acidentado. A legislação brasileira estabelece uma teia de responsabilidades que pode, sim, alcançar o proprietário do imóvel. Entender esse mecanismo é fundamental, e o ponto de partida para essa compreensão passa, invariavelmente, pela segurança do trabalho. Normas como a NR-18 explicada pela Engehall, que estabelece as diretrizes de segurança para a indústria da construção, são a base que define um ambiente de trabalho seguro. Embora um proprietário residencial não precise ser um especialista na norma, a Justiça entende que a escolha de profissionais que a respeitem é o primeiro e mais crucial passo para mitigar riscos e definir as fronteiras da responsabilidade de cada um.

O Papel do “Dono da Obra” e a Complexidade da Culpa

No jargão jurídico, o proprietário do imóvel que contrata os serviços de construção ou reforma é o “dono da obra“. Essa posição, que parece simples, carrega consigo deveres importantes. A extensão da sua responsabilidade em caso de acidente depende fundamentalmente do modelo de contratação escolhido. Contratar uma construtora consolidada, com engenheiro responsável e uma equipe devidamente registrada, cria um cenário jurídico diferente de contratar um pedreiro autônomo para coordenar uma equipe informalmente.

A Justiça do Trabalho analisa cada caso para determinar se o dono da obra teve alguma parcela de culpa no evento danoso. Essa culpa não significa, necessariamente, uma ação direta que causou o acidente. Ela pode se manifestar de formas mais sutis, principalmente através de dois conceitos: a culpa in eligendo (culpa na escolha) e a culpa in vigilando (culpa na vigilância). A primeira ocorre quando o dono da obra contrata um profissional ou empresa sabidamente inidôneo ou sem as qualificações técnicas necessárias. A segunda acontece quando o proprietário interfere diretamente no trabalho, dando ordens sobre procedimentos para os quais não é qualificado, ou quando, mesmo ciente de uma prática perigosa, nada faz para impedi-la.

Responsabilidade Solidária vs. Subsidiária

Para entender o risco financeiro, é vital conhecer os dois tipos de responsabilidade que podem ser imputados ao dono da obra. Eles definem quem o trabalhador acidentado pode acionar judicialmente para receber indenizações.

Responsabilidade Subsidiária: A Regra Mais Comum

Na maioria dos casos envolvendo um dono de obra residencial que não explora a construção como atividade econômica, a responsabilidade aplicada é a subsidiária. Pense nela como uma “fila” de responsabilidades. O trabalhador acidentado deve, primeiro, acionar judicialmente seu empregador direto, seja a empreiteira ou o mestre de obras que o contratou. Ele buscará na Justiça o pagamento de todas as verbas indenizatórias, como despesas médicas, danos morais e lucros cessantes.

A responsabilidade do dono da obra só é ativada se o empregador principal não tiver condições de arcar com a condenação. Se a empresa contratada for insolvente, decretar falência ou simplesmente não possuir bens para cobrir a dívida, a Justiça pode determinar que a responsabilidade “suba” para o próximo na cadeia: o dono da obra. Portanto, mesmo sendo uma responsabilidade secundária, ela representa um risco real e significativo, pois o proprietário do imóvel pode acabar tendo que arcar com a totalidade dos custos do acidente.

Responsabilidade Solidária: Um Risco Compartilhado

A responsabilidade solidária é um cenário mais grave para o dono da obra. Nela, não existe uma ordem de preferência. O trabalhador acidentado pode processar tanto o empregador direto quanto o dono da obra ao mesmo tempo, e cobrar a dívida integral de qualquer um deles. Felizmente, para obras residenciais de pessoa física, essa não é a regra geral. Ela costuma ser aplicada quando o dono da obra é uma empresa do ramo da construção ou quando se comprova uma fraude na contratação, visando burlar as leis trabalhistas.

Medidas Práticas para Proteger Seu Patrimônio

Diante desse cenário, a prevenção é a única estratégia verdadeiramente eficaz. A postura do dono da obra antes e durante a construção é o que irá protegê-lo de futuras dores de cabeça. Adotar algumas medidas práticas não é burocracia, mas sim um ato de inteligência e autoproteção.

  1. Priorize a Contratação Formal: Dê preferência a empresas de construção ou a profissionais que possuam CNPJ e boas referências. Evite acordos puramente verbais. Elabore um contrato de prestação de serviços, mesmo que simples. Esse documento deve, idealmente, conter uma cláusula que atribua expressamente ao contratado a responsabilidade total pela segurança, encargos trabalhistas e previdenciários de sua equipe.
  2. Verifique a Qualificação: Antes de fechar negócio, pesquise. Peça para ver outros trabalhos realizados pela empresa ou profissional. Verifique se existem reclamações em sites de consumidores ou processos trabalhistas. A “culpa na escolha” está diretamente ligada à falta desse dever de cuidado mínimo.
  3. Não Interfira na Execução Técnica: A menos que você seja um engenheiro ou arquiteto qualificado, resista à tentação de dar ordens diretas sobre como um procedimento deve ser executado. Deixe a gestão técnica para os profissionais contratados. Sua interferência pode ser interpretada como uma chamada à responsabilidade (a culpa in vigilando).
  4. Observe as Condições de Segurança: Você não precisa ser um fiscal, mas o bom senso prevalece. Se notar situações de risco flagrante, como andaimes improvisados com materiais precários, falta de equipamentos de proteção básicos como capacetes e luvas, ou fiação elétrica exposta de forma perigosa, questione o responsável pela obra. Essa observação demonstra sua preocupação e pode ser crucial para prevenir um acidente.

Em última análise, a segurança em uma obra residencial é um investimento, não uma despesa. A tranquilidade de saber que você escolheu profissionais que valorizam a vida e seguem as normas técnicas não tem preço. A responsabilidade por um acidente é uma via complexa, mas seu caminho é pavimentado pelas escolhas feitas muito antes de qualquer eventualidade. Agir com diligência e seriedade desde a contratação é a fundação mais sólida para garantir que seu projeto termine como começou: a realização de um sonho.

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