Cultura

“O Agente Secreto” tenta vaga para o Brasil no Oscar

DM Redação

Publicado em 15 de setembro de 2025 às 20:18 | Atualizado há 3 horas

Wagner Moura protagoniza película que retoma temas já conhecidos do público - Foto: Victor Jucá
Wagner Moura protagoniza película que retoma temas já conhecidos do público - Foto: Victor Jucá

Eduardo Moura

“O Agente Secreto” teve seu favoritismo confirmado nesta segunda-feira (15/09) e foi escolhido pela Academia Brasileira de Cinema para tentar uma vaga na disputa de melhor filme internacional do Oscar do ano que vem, marcado para o dia 15 de março.

A decisão foi tomada em meio à gritaria das redes sociais, que ao longo da última semana virou palco de uma disputa acalorada entre o longa de Kleber Mendonça Filho e “Manas”, de Marianna Brennand, que surgiu como sério candidato na disputa repentinamente.

Também estavam pré-selecionados para tentar a vaga brasileira os filmes “O Último Azul”, de Gabriel Mascaro; “Baby”, de Marcelo Caetano; “Kasa Branca”, de Luciano Vidigal, e “Oeste Outra Vez”, de Erico Rassi.

Em 16 de dezembro, a academia hollywoodiana vai anunciar a lista de pré-indicados ao Oscar de filme internacional. O anúncio de quem de fato concorre à estatueta acontece no dia 22 de janeiro.

Nos Estados Unidos, “O Agente Secreto” é da Neon, distribuidora poderosa e influente, responsável pelo grande vencedor deste ano, “Anora”, e que pode alavancar a campanha e emplacar um filme brasileiro na disputa logo após a vitória de “Ainda Estou Aqui”. Do outro lado do Atlântico, no Reino Unido, a distribuição é da Mubi, outra com poderio significativo.

“O Agente Secreto”, novo filme de Kleber Mendonça Filho, retoma vários temas que já há muito tempo habitam a filmografia do cineasta. A ditadura militar, o Nordeste, a política brasileira, a sexualidade, o Recife. Mas o longa, que abriu o 58º Festival de Brasília nesta sexta (12/09), traz, como estopim da tensão que aflige o personagem de Wagner Moura, um tema novo –ciência e tecnologia.

No filme, há um centro de excelência de tecnologia no Nordeste. Um figurão de São Paulo vai lá para conhecer e fica totalmente estarrecido com o que está acontecendo ali, reage da pior maneira possível. A excelência não pode acontecer no Nordeste.

“A grande questão para mim é que o Brasil foi montado errado. Toda a riqueza ficou concentrada numa região só. Isso explica muitos dos problemas do país”, diz Mendonça Filho. “Tudo ficou muito concentrado no Sudeste e no Sul. Raramente houve uma alteração de curso para isso.”

“Acho que nos governos Lula já começou a ter alguma alteração de curso em relação a isso. Mas ainda há uma reação muito forte à ideia”, completa. A sintonia entre cinema e tecnologia é algo que está ficando cada vez mais nítido também fora das telas, no mercado audiovisual brasileiro.

Na área de cultura, as políticas públicas, diz o diretor, têm tido sucesso na descentralização. “Eu, por exemplo, fiz meu primeiro filme como parte de uma cota [de financiamento] para o Nordeste. Hoje tem cineastas fazendo filmes de lugares que nunca faziam filmes antes” diz. Segundo ele. “30 anos atrás seria impossível”.

Kleber Mendonça Filho: “Existe hoje uma pluralidade por causa de políticas públicas” – Foto: Humberto Araujo/ Festival de Brasília/ Instagram

Pluralidade

“Existe hoje uma pluralidade por causa de políticas públicas”, diz. Ele aponta, porém, para o mercado do streaming, onde prevalecem outras regras, as de mercado, e onde, ele diz, há grande concentração.

“Quais são as produtoras que lidam com o grande dinheiro de streamings para fazer séries e originais no Brasil? As decisões aí não são de política pública. As decisões aí são de marketing, de mercado. Então, o Brasil inteiro está filmando por políticas, mas as decisões de dinheiro privado continuam com um modelo de 50 anos atrás.”

Desde que o governo Lula (PT), assumiu, há iniciativas que miram na desconcentração de recursos por parte do Ministério da Cultura. Exemplos são programas como Rouanet das Favelas, Rouanet do Nordeste e Retomada Cultural RS. Há ainda, segundo ela, diálogo do ministério com algumas empresas que têm lançado editais para abarcar projetos com públicos e territórios menos beneficiados pelo mecanismo.

O programa Arranjos Regionais do Audiovisual, por exemplo, destinará R$ 300 milhões para fomentar a produção audiovisual em todo o Brasil -70% dos recursos são destinados a Norte e Nordeste e 30% para Sul, Minas Gerais e Espírito Santo.

Assim como em ‘O Agente Secreto’, há pessoas incomodados com essa política de descentralização, diz Kleber. No final de “O Agente Secreto”, vem escrito nos créditos: “Este filme gerou 1300 empregos diretos e indiretos” “Essa mensagem já estava em ‘Bacurau’, no momento em que o cinema foi desmontado, a cultura foi desrespeitada e o Ministério da Cultura foi extinto”, diz. O longa foi lançado em 2019, primeiro ano do governo de Jair Bolsonaro (PL).

Wagner Moura (à esquerda) e Kleber Mendonça Filho (à direita) durante gravações de “O Agente Secreto” – Foto: Victor Jucá/ Divulgação

“É uma maneira de lembrar que a cultura é feita por trabalhadores”, diz Kleber. “E dentro do discurso da extrema-direita com tendência fascista, a cultura é um inimigo. Só que ao combater esse inimigo, eles estão machucando a economia.

“A frase foi muito bem pensada para lembrar o óbvio, que é o que você faz quando vive num regime sem tendências democráticas -lembrar o óbvio.” “O Agente Secreto” abriu o 58º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, um dos mais tradicionais do país, nesta sexta (12/10).

A solenidade parecia ignorar o clima que pairava sobre Brasília, um dia após a condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), pelo supremo tribunal federal. Até que o marasmo das falas institucionais foi quebrado por um grito vindo da plateia: “Sem anistia!”

Na manhã deste sábado, Kleber afirma que “é muito estranho que, nesta semana e semana passada, você continue lendo a combinação de palavras ‘anistia ampla, geral e restrita’ em 2025”. É muito “Acho que isso vem de um trauma espiritual do nosso país, que é esquecer todos os estupros, sequestros, assassinatos e torturas e bola para frente, não vamos falar sobre isso.”

“A lógica contemporânea do Brasil, se a gente pensar no Brasil como uma democracia, é bem diferente da lógica dos anos 1970 e dos anos 1960, quando tínhamos um regime militar”, diz o diretor. “Mas nos últimos dez anos, eu comecei a perceber a volta de coisas que eu achava que tinham sido aposentadas e que de fato estavam num museu de péssimas ideias do nosso país”. (Folhapress)


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