Wes Gama se volta para a ecologia ao pintar mural no Pará
DM Redação
Publicado em 26 de setembro de 2025 às 20:15 | Atualizado há 4 horas
Marcus Vinícius Beck
De longe, um painel colorido, western, cintila diante dos olhos na Rua Três, no Centro, esquina com a Oito. As cores do mural grafitado por Wes Gama se entrelaçam ao cinema de Érico Rassi. É quando o passante aprecia “Oeste Outra Vez” numa mostra democrática.
Lá pelo meio-dia, uma hora da tarde, ou às dez, onze da noite, a sensibilidade refulge na multidão. A cidade, os prédios e os carros emitem decibéis urbanos. Os sons da algazarra jovem se misturam à música emanando dos bares. Todos, ali, são bêbados cometas.
Vencedor do Kikito em Gramado (RS), o faroeste é ambientado na Chapada dos Veadeiros. Mostra, durante 98 minutos, relações humanas esvaziadas. Homens brutos, insensíveis, emergem na tela, mas revelam-se incapazes de compreender suas próprias fragilidades.
O fotógrafo André Carvalheira pinta com luz paisagens áridas cerratenses, paleta terrosa, planos abertos e closes contidos. “Oeste Outra Vez”, não à toa, foi agraciado: levou nada menos que o prêmio de melhor fotografia — também conquistado no festival gaúcho.

Como disse o escritor Guimarães Rosa (1908–1967), o sertão está em toda parte. Érico, leitor do romance “Grande Sertão: Veredas”, limitou-se então a elogiar aquele spray que traduz em formas os costumes goianos. “Ficou foda”, comentou o cineasta, feliz, numa rede social.
Nascido em Uruaçu, no norte de Goiás, Wes se diz autodidata. Em seu percurso artístico, iniciou-se nas ruas da capital goiana no ano 2000. À época, explorava as técnicas de pixação e bombing. Dedicou-se, desde então, a desenvolver uma linguagem que o deixasse satisfeito.
Assim, fez seus murais com cores saturadas. Suas linhas, situando-se entre a natureza e o ser humano, misturam ancestralidade e tecnologia. É o que o artista visual entende como Caipira Futurista, que seria, segundo ele, um homem sensível, respeitoso e equilibrado.
“Vive em equilíbrio com a terra, com as águas e os seres viventes”, afirma ao DM, de Belém (PA), onde pintou no Museu Goeldi. “Os pássaros nos olhos são a oportunidade de ver o mundo pelos olhos da natureza. O orgânico vive e se transforma. Sempre recomeça.”
Autodidata, goiano do pé rachado, Wes Gama figura dentre os 19 artistas brasileiros escolhidos por edital para a 3ª edição do Museu de Arte Urbana de Belém (MAUB). A ideia, segundo o MAUB, é criar uma “verdadeira” galeria a céu aberto na Amazônia.
Dessa vez, a iniciativa se une ao histórico Museu Paraense Emílio Goeldi para revitalizar os muros do Parque Zoobotânico, patrimônio tombado que jamais recebeu intervenção artística. A edificação, fundada há 130 anos, ganhará novas cores e significados.

Com curadoria de William Baglione, fundador do coletivo Famiglia, os trabalhos têm viés ecológico — abordam temas como fauna, flora, arqueologia, heranças afro-amazônicas, saberes indígenas e biodiversidade. Isso reforça a ligação entre arte, ciência e Amazônia.
A inauguração será realizada neste domingo, 28. Belém, conforme reportagens da imprensa local, vive os preparativos para a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP-30), em novembro. Ou seja, Wes dialoga com o espírito da COP-30.
Sobre trabalhar no Goeldi às vésperas do megaevento, o goiano sentencia: “Está sendo inspirador.” Salienta ainda que “pintar um mural com esse tema aqui em Belém […] tem grande importância e esperança de conscientizar a população e autoridades”.
Ao jornal O Liberal, declarou que sua obra “permeia a vida dos caboclos, das pessoas da mata, de quem trabalha no meio rural e tem um conhecimento ancestral”. Para Wes, o tempo em Belém lhe proporcionou unir “a parte da natureza com as pessoas que se identificam”.
Projetado no cenário nacional, Wes Gama afirma ao DM que as artes não têm limites territoriais. “É importante e enriquecedor para todo artista circular e vivenciar. Isso me transforma e me faz criar todo o conceito do meu trabalho”, diz o artista nascido em 1987.
Wes conta que desenha desde criança. “Comecei na pixação e, logo em seguida, descobri o graffiti e me identifiquei. Era a melhor forma de ganhar uma moral no bairro”, confabula o artista, cuja obra está disponível tanto no Centro de Goiânia quanto em Belém.