Nobel de Medicina de 2025 vai para descobertas sobre defesas do corpo
Léo Carvalho
Publicado em 6 de outubro de 2025 às 08:59 | Atualizado há 3 horas
O Prêmio Nobel em Fisiologia ou Medicina de 2025 vai ser dividido entre o trio de pesquisadores formado pelos americanos Mary Brunkow, 63, e Fred Ramsdell, 64, e pelo japonês Shimon Sakaguchi, 74. Os três, cujos nomes foram anunciados nesta segunda-feira (6), desenvolveram trabalhos fundamentais para compreender a chamada tolerância imunológica periférica, um dos processos pelos quais o organismo consegue distinguir entre ameaças reais vindas de fora e seus próprios componentes.
Esse processo é essencial para que as células do sistema de defesa do organismo, ou sistema imune, não se voltem contra os próprios componentes do corpo, um fenômeno que, quando desencadeado, leva às chamadas doenças autoimunes (como, por exemplo, a diabetes tipo 1 e a esclerose múltipla). Esse reconhecimento deriva, entre outras coisas, da capacidade das células do sistema de defesa de reconhecer moléculas na superfície de micróbios invasores, distinguindo-as, assim, das moléculas que existem na superfície das células do próprio organismo.
Na chamada tolerância imunológica central, a qual, como o nome diz, acontece num único “centro de processamento” do organismo, o timo, uma pequena glândula localizada perto do coração. No timo, células de defesa com potencial para atacar o próprio corpo são eliminadas. Mas esse processo não é totalmente eficiente, e o restante do trabalho de controle desse risco pelo organismo cabe à tolerância imunológica periférica.
Em 1995, Sakaguchi, que é professor da Universidade de Osaka (Japão), identificou um novo tipo de célula do sistema imune que estava envolvida com esse processo de controle. Já em 2001, Brunkow e Ramsdell, que estudavam uma variedade de camundongos que era muito suscetível a doenças autoimunes, verificaram que o problema se devia a uma alteração no gene conhecido como Foxp3.
O pesquisador japonês, então, completou o quebra-cabeças ao constatar que o gene também estava por trás do desenvolvimento específico das células que estudara antes, hoje designadas como células T regulatórias. O papel das células T regulatórias é fazer o “controle de qualidade” de outras células do sistema imune que escaparam da vigilância do timo, garantindo que não haja um ataque errôneo delas contra o resto do organismo.
Esse conhecimento é útil para enfrentar não apenas as doenças autoimunes propriamente ditas como também para a busca de formas mais eficientes de transplante de órgãos, que dependem justamente da capacidade de segurar os ataques do sistema de defesa.
Combate ao Câncer
Além disso, os dados também são valiosos para abordagens contra o câncer. Isso porque os tumores nascem a partir de células do próprio organismo cuja multiplicação se descontrola, e há uma dificuldade de o sistema imune reconhecer como e quando atacá-las por suas características semelhantes às do organismo saudável.
Brunkow hoje trabalha no Instituto de Biologia de Sistemas de Seattle (noroeste dos Estados Unidos), enquanto Ramsdell é conselheiro científico da empresa Sonoma Biotherapeutics, na Califórnia.
A cerimônia de entrega das láureas em Estocolmo, na Suécia, está agendada para 10 de dezembro, aniversário da morte do químico sueco Alfred Nobel (1833-1896). Cada um dos ganhadores receberá um diploma feito por um artista sueco ou por um norueguês, uma medalha de ouro e 11 milhões de coroas suecas, montante equivalente a R$ 6,3 milhões na cotação atual.
Em 2024, a láurea nessa categoria ficou com os americanos Victor Ambros e Gary Ruvkun, pela descoberta de pequenas moléculas chamadas microRNAs e seu papel na ativação e desativação de trechos do material genético.
Outros premiados
Com a premiação desta segunda-feira (6), chega a 116 o número de vezes que a láurea foi entregue nessa categoria, desde 1901 —isso não ocorreu apenas nove vezes, de 1915 a 1918, em 1921, 1925 e de 1940 a 1942. Até hoje, nenhuma pessoa o recebeu mais de uma vez.
A pessoa mais jovem a receber o prêmio de Fisiologia ou Medicina foi Frederick G. Banting (1891-1941). O canadense tinha 31 anos em 1923 quando dividiu a láurea com o escocês John James Rickard Macleod (1876-1935) pela descoberta da insulina.
Já o americano Peyton Rous (1879-1970) foi a pessoa mais velha a ganhar o prêmio. Em 1966, ele tinha 87 anos quando recebeu a láurea pela descoberta de vírus que induzem ao desenvolvimento de tumores. Além dele, o prêmio naquela categoria foi entregue ao canadense Charles B. Huggins (1901-1997) por suas descobertas relacionadas ao tratamento hormonal de câncer de próstata.
Em duas ocasiões, a láurea foi entregue a casais. A primeira se deu em 1947, com os austro-húngaros Gerty Theresa Cori (1896-1957) e Carl Ferdinand Cori (1896-1984), laureados pela descoberta do curso da conversão catalítica do glicogênio. A segunda veio já neste século, em 2014, com os noruegueses May-Britt Moser e Edvard I. Moser por descobertas de células que constituem um sistema de posicionamento no cérebro.
Também já houve casos em que o pai e mais tarde o filho receberam a láurea. Hans von Euler-Chelpin (1873-1964) ganhou o Nobel em Fisiologia ou Medicina em 1929 e seu filho Ulf von Euler (1905-1983) em 1970. Isso se repetiu mais tarde com Sune K. Bergström (1916-2004) e Svante Pääbo, ganhadores em 1982 e 2022, respectivamente. (Reinaldo José Lopes/FOLHAPRESS)