Cultura

Hugo de Carvalho Ramos recebe homenagem na Flipiri

DM Redação

Publicado em 6 de outubro de 2025 às 19:25 | Atualizado há 4 horas

Elogios: Hugo de Carvalho Ramos publicou ‘Tropas e Boiadas’ quando estava com 21 anos
Elogios: Hugo de Carvalho Ramos publicou ‘Tropas e Boiadas’ quando estava com 21 anos

Marcus Vinícius Beck

Contista celebrado por leitores e críticos, o escritor goiano Hugo de Carvalho Ramos recebe homenagem durante a 15ª Festa Literária de Pirenópolis (Flipiri). O evento começa nesta quinta, 9, e vai até o próximo sábado, 11, na cidade histórica localizada a 128 km de Goiânia.

A Flipiri produziu neste ano uma programação gratuita que se pauta pela diversidade, num diálogo entre Piri, seus moradores e visitantes. De acordo com a professora Iris Borges, idealizadora da festa literária, o tema escolhido foi “Aluminar – Ler e Criar com Energia”.

Além do autor goiano, o evento festeja a obra da escritora carioca Roseana Murray, que já escreveu, segundo suas contas, cerca de 100 livros. Murray é, ademais, voz destacada na literatura infantojuvenil brasileira. “O Braço Mágico” saiu em 2024 após tragédia pessoal.

Carvalho Ramos, por sua vez, se insere na tradição regionalista. Pertence ao grupo a que o crítico literário Manuel Cavalcanti Proença se refere como “documentarista”, isto é, “sua obra artística transborda da pura ficção estética para o pragmático do material sociológico”.

Autor goiano na companhia de jovens amigas no Rio de Janeiro em outubro de 1918 – Foto: Divulgação

Seu livro mais famoso, azeitado nessas características, é a coletânea de contos “Tropas e Boiadas”. Editado pela primeira vez em 1917, descreve a violência do sertão goiano — muitas vezes manifestada na fúria dos coronéis e nos resquícios sociais da escravidão.

Quando a obra completou 100 anos, em 2017, o professor Luiz Roncari, da USP, esteve na Faculdade de Letras da UFG para ministrar uma palestra no seminário “Cem Anos de Tropas e Boiadas”. Disse, na ocasião, que “o sertão é retratado como ausência do Estado”.

Para o estudioso, “a lei e a justiça são submetidas aos desmandos dos coronéis, onde o poder privado prevalece”. “Tropas e Boiadas”, como se vê, traz relatos orais, aos quais o autor se familiarizou em sua meninice pelas viagens interioranas que fazia com seu pai.

A obra indica logo no título do que irá tratar — o universo dos vaqueiros e tropeiros. São homens que, na lida com o gado, criam uma identidade perpetuada até hoje. O sertanejo goiano, nessa perspectiva, diferencia-se do caipira que se associa a Monteiro Lobato.

Vida rural: escritor goiano descreve o sertão como lugar em que não há presença do Estado – Fotos: Divulgação

Esse arquétipo, segundo a pesquisadora Maria Amélia Alencar, tem como base social a economia de subsistência. Por isso, conforme analisa em “A Identidade Sertaneja na Literatura Regionalista”, esse caboclo descrito por Lobato mal sobrevivia, revelava dificuldade comunicativa e, sobretudo, era menosprezado no mundo urbano.

Como diz Alencar, “vaqueiros e tropeiros, habituados ao deslocamento na lida com o gado, às viagens para a venda de mercadorias, apresentam desenvoltura e facilidade no trato”. Tal imagem, sem dúvida, soa positiva. Assim, Carvalho Ramos reafirma Goiás diante da nação.

“Tropas e Boiadas”, além de tudo, tem histórias curtas e lineares — com voz narrativa em terceira pessoa. A linguagem, concisa, arregimenta a prosódia sertaneja para colocá-la a serviço de um léxico erudito, no que se observa certa distância entre narrador e personagem.

Carvalho Ramos nasceu em 21 de maio de 1895, em Vila Boa – Foto: Divulgação

Embora o primeiro queira revelar por completo o segundo, trata-se de dialogismo próspero na literatura brasileira. Graciliano Ramos, autor de “Vidas Secas”, se tornaria um estilista da oralidade sertaneja assimilando Carvalho Ramos. O velho Graça, ao que tudo indica, o leu.

Inteligente e sensível — para usar afirmação das professoras Darcy França Denófrio e Vera Maria Tietzmann Silva na “Antologia do Conto Goiano” —, o vilaboense logrou elogios no Rio de Janeiro, então centro político e cultural do Brasil. Isso foi em meados dos anos 1910.

Carvalho Ramos nasceu em 21 de maio de 1895, em Vila Boa, então capital de Goiás. Desde cedo, revelou interesse pela literatura, que o fez ler os clássicos universais durante a adolescência. Matriculou-se, em 1916, na Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais.

Iniciou-se cedo na carreira literária, o que lhe valeu elogios do dândi carioca João do Rio. Seus textos foram lidos e influenciaram escritores modernistas como Mário de Andrade e João Guimarães Rosa. Deprimido, matou-se em 1921, aos 25 anos, no Rio de Janeiro. 

Capa de “Obras Reunidas”, pela Ercolano – Foto: Divulgação

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