Opinião Pública

A liberdade de expressão na TV tem nome: Sílvia Jafet

Redação DM

Publicado em 5 de dezembro de 2023 às 11:00 | Atualizado há 2 anos

Ano de 76. Estávamos na ditadura. Censura vigendo e censores plantados nas redações. Havia um pedaço da paulicéia desvairada onde ainda se respirava liberdade. Ele ficava (e ainda fica) ali no Morumbi. Endereço: Rua Radiantes, 13.

Vivi essa epopéia. Eu tive a felicidade de estar ali e sou testemunha de momentos históricos de desafios históricos na TV Bandeirantes, ainda embrião de rede.

Entre redação, câmeras e holofotes, vi e vivi o destemor de uma mulher determinada, ousada, audaciosa, destemida: a jornalista Silvia Saad Jafet, a grande comandante do departamento de jornalismo da TV Bandeirantes.

Diretora da área mais vigiada pelos militares, ela fez da casa um balão de oxigênio para a democracia e para a liberdade de expressão. Compôs uma verdadeira seleção de grandes profissionais para o seu “bunker” (que os censores chamavam de “célula comunista”): Gabriel Romero, Odair Redondo, João Victor Strauss, Carlinhos Brickmann, dentre outros. A auxiliá-la a jornalista Ana Maria Paes Barreto, velha amiga e companheira de batalhas.

Foi com esse time que ela escreveu a história do jornalismo desafiador do regime. Não poucas vezes, em épocas recentes, eu lhe medi a grandeza do seu feito. Sílvia sorri e diz: “O feito é do senhor João” (o saudoso João Jorge Saad, tio dela e dono da TV).

A Sílvia nunca quis louros e nem lutou por eles. Apenas fez jornalismo. Sou testemunha desta página que não pode ser esquecida. Vi e vivi os momentos tensos em que ela abriu microfones e câmeras aos emudecidos pelo sistema. Foi nessa época que surgiu um líder sindical até então ignorado por todos. Eu o conheci há 46 anos, quando, acompanhando o repórter João Russo, fui a São Bernardo do Campo para entrevistá-lo pela primeira vez. Atrás de uma mesa e de farta barba, o metalúrgico Luiz Inácio nos recebeu.

Ali estava o carismático Lula. Jeito simples, mas firme em suas posições. Foi nesse dia que o Brasil passou a conhecer quem era e quais as ideias daquele líder sindical que já preocupava os generais. A Bandeirantes o mostrou ao país. E as suas ideias e os seus mais importantes momentos.

A TV dava aos trabalhadores vez e voz. Sílvia soube como fazê-lo. Inesquecível o resultado dessa liberdade construída por ela e equipe. Espaço para todos. Sem engajamento político-ideológico, era apenas e tão somente o direito de informar, de mostrar os fatos.

Em 1979, o Brasil viveu o clímax e o primeiro susto dos militares. A greve geral dos metalúrgicos do ABC mostrou o rápido avanço da organização dos trabalhadores, que, a partir dali, passaram a desafiar a ditadura. Cerca de 200 mil participaram do movimento, paralisando as indústrias automobilísticas. Imagens da greve nas tevês, mas as falas de Lula e grevistas só apareceram na Bandeirantes.

Mantendo essa posição de equilíbrio e responsabilidade, o jornalismo comandado por Sílvia foi, gradativamente, ganhando espaço dentro da programação e muita coisa boa aconteceu a partir.

Dentre elas, o histórico Canal Livre. Era o começo de uma nova história. Registro aqui essas memórias para fazer justiça, ainda que por este humilde escriba, a essa grande jornalista e grande mulher Silvia Saad Jafet. A liberdade de expressão e o jornalismo brasileiro devem muito a ela. A Bandeirantes, também. A ela ofereço estas linhas, simples mas verdadeiras, em tributo a uma profissional a quem muito devemos. Deus com você, querida Sílvia.

Jornalista

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