O mistério da fabulosa Mina dos Tapuias
Redação DM
Publicado em 5 de maio de 2016 às 01:18 | Atualizado há 9 anosVez em quando, pego um daqueles livros que li na infância e garro a ler, revivendo aqueles tempos.
Reli, pela enésima vez, “Lendas e Mitos do Brasil”, de Theobaldo Miranda Santos, e, entre meia centena de interessantíssimas lendas, há uma que faz parte do folclore matogrossense, de que já me ocupara em tentar uma explicação.
É a lenda da Mãe do Ouro. Diz ele que em Rosário, às margens do Rio Cuiabá, morava um rico e ambicioso mineiro, senhor de muitos escravos, os quais eram obrigados a entregar-lhe diariamente certa porção de ouro. Um de seus escravos, ao passar uns dias sem achar uma única pepita, andava triste e cabisbaixo, já antevendo o castigo que lhe seria infligido, quando lhe apareceu à frente uma formosa mulher de cabelos louros que, ao saber o motivo da tristeza do negro, disse-lhe:
– Vá no comércio comprar uma fita azul, vermelha e amarela, um pente e um espelho para mim, pois vou ajudá-lo!
Mais que depressa, o negro cuidou de trazer-lhe o que pedia. Então, ela lhe indicou um lugar onde havia muito ouro. O escravo apanhou sua bateia, garimpou algum tempo e conseguiu uma grande quantidade do precioso e cobiçado metal, levando-o ao seu senhor, para tentar livrar-se do castigo que o aguardava. O patrão, naturalmente, quis saber onde ele encontrara aquele aribê de ouro. Mas o negro se recusou a dizer-lhe, pois a misteriosa benfeitora o prevenira que mantivesse em sigilo a jazida, em troca da permanente cata no misterioso local.
A negativa do escravo acarretou-lhe castigos sob o implacável chicote do feitor, fato que se repetia diariamente, até que o negro, não mais suportando o iracundo senhor, implorou à misteriosa mulher que o liberasse do compromisso do segredo: diante do sofrimento do escravo, a mulher aquiesceu e mandou dizer ao dono do negro que levasse 22 escravos e cavasse até o fundo da promissora mina. Quando o senhor e os escravos estavam lá no fundo do buraco, o barranco ruiu, soterrando todos. Com a morte do senhor, o escravo adquiriu sua liberdade.
A mulher era a misteriosa e lendária Mãe do Ouro.
Esta é a lenda.
Em Dianópolis, formada perto de uma rica mina de ouro, a Mina dos Tapuias (hoje, no centro da cidade, ao lado da Rodoviária), aconteceu um fato parecido no fim do século XIX.
Contam os mais velhos que escravos dos donos da mina cavaram profundo buraco, até que toparam com um veio de ouro tão fabuloso, que tinha de ser cortado a machado. Ao começarem a exploração do veio (que, diz a tradição, atravessa a cidade por mais de quilômetro e meio), decidiram paralisar o trabalho para uma estrondosa comemoração na Vila de São José do Duro.
Enquanto a festa animava o povoado, adveio uma chuva, que dava a impressão de que estava voltando a época de Noé. E pela manhã, encontraram o descomunal buraco soterrado e cheio d’água até ao beiço. De nada adiantaram os esforços para a retirada do entulho e dreno da água, usando surrões de couro e ferramentas rústicas.
Passaram-se mais de cinquenta anos sem que ninguém voltasse a falar da mina. O terreno dentro do qual ficava a jazida foi acabar nas mãos de um dono de boteco por nome Solteiro, cria do meu padrinho João Barbosa. Este trocou a posse do lote com meu irmão Tonho por uma bicicleta velha, achando que tinha feito um grande negócio. Naquela época, beirando 1960, chegava ali o doutor Irineu de Macedo Soares, do Rio de Janeiro, que se engraçou com o lugar e decidiu-se a passar uns tempos por lá. E, não sei se sabendo da história da velha mina ou por mero acaso, propôs a Tonho a compra do terreno. E Tonho, ao receber a proposta de quinhentos cruzeiros, não contou conversa: vendeu-lhe o lote, com mina e tudo.
Macedo Soares soubera depois que alguns de minha família tinham se cotizado para tentar recuperar a mina, sem resultado, pois não dispunham de recursos técnicos, e decidiu reexplorar a jazida, com algum proveito, pois parece que o teor aurífero é dos melhores do Tocantins.
Depois que fui embora para Belo Horizonte, não fiquei sabendo mais do resultado da famosa mina.
Macedo Soares foi-se embora há muitos, anos e fiquei sem saber se ele chegou a bamburrar. Dizem que não chegou a achar a fábula de ouro que os antigos noticiam como certa.
Soube que ele passou a concessão de exploração para uma firma do Rio, que andou fuçando por lá, e o resultado é que não ouvi mais falar em sua exploração.
O certo é que ela continua ali perto da Rodoviária, desafiando quem quiser in¬vestir em busca da fortuna.
Deve ser coisa da Mãe do Ouro.
(Liberato Póvoa, desembargador aposentado do TJ-TO, membro-fundador da Academia Tocantinense de Letras e da Academia Dianopolina de Letras, escritor, jurista, historiador e advogado, liberatopo[email protected])