Brasil

O poeta Artur

Redação DM

Publicado em 6 de junho de 2017 às 01:54 | Atualizado há 8 anos

Depois de estar praticamente malhando em ferro frio, com opinião sobre este nosso Brasil podre, vou variar um pouco para contar as amenidades de mais um de meus causos.

Esta me foi contada pelo compadre Mário Fusaro Cavaliere, de Belo Horizonte, que conheceu o personagem na época do governo Benedito Valadares.

Dizem que o Artur era um camarada inteligente e preparado. Não digo que fosse preparado em tudo, mas aflorou como poeta em Viçosa, lá em Minas, tornando-se personagem conhecidíssimo em sua época.

Começou a compor versos e sentia-se um Pigmalião (que se apaixonou pela sua própria escultura): Artur também passou a cultuar seus escritos e ficava grande parte de seu tempo registrando no papel o sentimento inspirado por suas numerosas musas.

Figura conhecida de todo mundo, Artur sempre encontrava lugar e ocasião para mostrar seus pendores camoniamos: onde houvesse uma rodinha de estudantes, ele pedia licença para declamar seus versos.

Os poemas, de início admirados e até aplaudidos, passaram a ser enfadonhos, consequência natural da lei da oferta e da procura: sua produção era grande demais, e as rodas de amigos permitiam suas declamações mais por gozação do que por gosto artístico.

E Artur sentia um prazer imenso em mostrar seus sonetos, suas quadras, seus poemas perfeitamente metrificados em decassílabos e redondilhas.

Mas a poesia começou a misturar-lhe o juízo, deixando-o com ideia fixa: era um grande poeta, e ninguém se atrevia a afirmar o contrário.

Os amigos passaram a sentir pena, e a família a preocupar-se com o rapaz, ainda novo e já enfraquecendo o juízo com coisas de poesia.

Artur continuava a obsessão de produzir cada vez mais e a exibir-se para todos que quisessem (e tolerassem) suas enfáticas declamações.

Um dia, não se sabe de onde, surgiu o boato de que o governador Benedito Valadares estava querendo conhecer o vate de Viçosa e ouvir-lhe os poemas.

Quando a notícia chegou aos ouvidos de Artur, ele ficou pisando as nuvens, de tão contente. E foi o primeiro a espalhar aos quatro ventos que até o governador do Estado havia lhe reconhecido os méritos.

A família e os amigos incentivaram-no a ir a Belo Horizonte, para que o governador o conhecesse e lhe apreciasse a arte poética.

Aprontou-se e embarcou para a capital na primeira oportunidade, sobraçando volumosos escritos para satisfazer a vontade do mandatário.

Ao desembarcar em Belo Horizonte, levaram-no imediatamente do ponto de desembarque, e ele nem teve tempo de estranhar o insólito palácio a que foi conduzido.

Quando ele se deu conta de si, estava era internado no manicômio “Raul Soares”, na Avenida do Contorno, no  bairro Santa Efigênia,

Fora o jeito mais fácil que encontraram de trazê-lo de Viçosa para tratar da bola em Belo Horizonte.

 

(Liberato Póvoa, desembargador aposentado do TJ-TO, membro-fundador da Academia Tocantinense de Letras e da Academia Dianopolina de Letras, membro da Associação Goiana de Imprensa – AGI -, escritor, jurista, historiador e advogado, [email protected])


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