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PF diz que há evidências de que investigados foram avisados de operação contra PCC

DM Redação

Publicado em 1 de outubro de 2025 às 09:29 | Atualizado há 2 horas

Constança Rezende – Folha Press

A Polícia Federal afirma que existem fortes evidências de que investigados da operação Tank, que mirou no sistema de lavagem de dinheiro do PCC (Primeiro Comando da Capital), tenham sido avisados previamente sobre operação do dia 28 de agosto e comunicado outros integrantes do grupo.

Em documento obtido pela Folha de S.Paulo, o órgão cita trocas de mensagens nos celulares apreendidos com os suspeitos e a saída de alguns deles às pressas de suas residências na véspera da operação. Por conta disso, a polícia indiciou 12 pessoas por obstrução de investigação envolvendo organização criminosa, além de lavagem de dinheiro e gestão fraudulenta de instituição financeira. Há oito foragidos, que tiveram seus nomes incluídos na lista de difusão vermelha da Interpol.

A PF ainda deve analisar a origem dos supostos vazamentos em inquéritos que serão abertos com este objetivo. As informações estão no relatório parcial do órgão sobre a operação da Superintendência do Paraná, concluído na sexta-feira (26) e obtido pela Folha de S.Paulo.

Uma das conversas que evidenciaria o conhecimento prévio sobre investigação, segundo a PF, foi entre os alvos Thiago Ramos e Gerson Lemes no dia 26 de agosto, dois dias antes da deflagração da operação. Nela, ambos demonstram preocupação com a apreensão de aparelhos celulares e discutem alternativas de deslocamento e hospedagem, inclusive mencionando a troca imediata de aparelho telefônico.

Thiago pergunta “vamos para onde papai”?. Ao que Gerson responde “depois q vc me falou que eles entra (sic) na casa msm assim desanimei”. O primeiro responde “eu não vou ficar, papai, vou sair só eu”, em referência aos familiares. Gerson afirma “Pois é. Amanhã vou trocar meu celular”. Em seguida, Thiago diz “pai…só não pegar o aparelho. Eu vou para o hotel ou para a praia”. Em seguida, ele faz buscas por hotéis e manda uma foto de uma mala para o parceiro, que a polícia chama de “kit fuga”.

“Tais elementos reforçam a hipótese de comprometimento da operação, indicando que os investigados tiveram ciência antecipada das diligências policiais”, diz a PF. Thiago Ramos e Gerson Lemes são identificados no relatório como alguns dos principais operadores do esquema e responsáveis por coordenar atividades de lavagem de dinheiro, fraude fiscal e adulteração de combustíveis.

Eles usariam uma rede de laranjas e empresas de fachada para simular transações comerciais e justificar a movimentação de grandes quantias sem lastro fiscal. A PF também afirma que “fica clarividente” o esforço dos investigados para impedir o cumprimento dos mandados judiciais expedidos pela 13º Vara Federal de Curitiba de prisão preventiva e de busca e apreensão nas suas residências e escritórios.

O órgão diz que, ao que tudo indica, eles retiraram material potencialmente probatório dos imóveis na véspera da deflagração, pernoitando fora de suas residências para não serem localizados pelas equipes policiais. “Também levaram seus aparelhos celulares, documentos e outros eletrônicos de interesse da investigação, fazendo com que os policiais federais se deparassem com um cenário preparado, aguardando o cumprimento do mandado de busca e apreensão”, aponta a polícia.

O relatório ainda afirma que os alvos Rafael Gineste e João Chaves Melchior, por sua vez, “foram além”. Isso porque, mesmo pernoitando fora de suas residências, foram surpreendidos pelas equipes policiais, ocasião em que teriam tentado se livrar dos celulares antes que pudessem ser apreendidos —Gineste jogou o celular no mar e Melchior, no terreno do seu vizinho, segundo os relatórios de diligência.

Ginete teria o controle sobre os dados pessoais e contas bancárias de diversos laranjas do grupo, utilizando-os para a constituição de dezenas de empresas e repasses de valores milionários em todos os níveis do esquema criminoso, segundo a PF. Já Melchior, de acordo com a PF, seria um dos principais operadores financeiros do grupo, atuando diretamente na organização de planilhas, repasse de valores, distribuição de lucros e realização de pagamentos entre os integrantes.

A PF também destacou que não encontrou o suspeito Roberto Augusto Leme, conhecido como Beto Louco e considerado “colíder” do esquema, em sua residência. Ele segue foragido. Também não havia qualquer veículo no local, assim como equipamentos eletrônicos, computadores, celulares ou documentos, “de modo que nada de interesse da investigação foi encontrado”, segundo o relatório.

“A equipe consignou que duas funcionárias que trabalham na residência informaram que no dia anterior o investigado estava em casa, mas que quando chegaram para trabalhar, na manhã do dia 28, já não encontraram ninguém”, diz o documento. Os policiais pontuaram que no local havia caixas de relógios Rolex vazias, bem como uma “xicara de café que parecia ter sido usada há não muito tempo”.

Além disso, consta no relatório de diligência que “um dos servidores da Receita Federal comentou que eles tinham tomado conhecimento de um suposto vazamento de parte da operação deles no interior do Estado, o que poderia, eventualmente, ter alertado o alvo”.

A PF deve analisar a origem dos supostos vazamentos em inquéritos que serão abertos com este objetivo. O diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, também disse no dia da operação, em agosto, que a hipótese de vazamento seria investigada. A ação da PF ocorreu no mesmo dia da Operação Carbono, do Ministério Público de São Paulo.

“De fato merece atenção que há 14 mandados de prisão e só 6 foram encontrados. Não é uma estatística normal das operações da Polícia Federal. Portanto, com o retorno das equipes que vão às residências e precisam relatar o que foi encontrado, vamos ter mais elementos para dizer, ou inferir, que possa ter havido vazamento. Nessa hipótese, nós vamos fazer investigação para apurar se houve”, disse.

A defesa de Rafael Gineste disse que ele foi localizado em sua própria embarcação, junto de sua esposa, “circunstância que demonstra claramente a ausência de qualquer intento de fuga”.

“A narrativa de que estaria se evadindo das autoridades não condiz com a realidade dos fatos, pois permaneceu acessível e não adotou qualquer medida que pudesse caracterizar ocultação ou resistência à ação policial”, disse.

Também afirmou “que é igualmente inverídica a afirmação de que Rafael teria arremessado seu telefone no mar” e que o seu celular e o de sua esposa “foram arrecadados pelas autoridades no dia 28, ainda no litoral catarinense, e sem observância das formalidades legais previstas”.

Acrescentou que as ilações de que Rafael exerceria controle de dados e contas bancárias de terceiros, constituindo empresas e movimentando valores milionários, “são meras alegações unilaterais de investigação, sem qualquer lastro em decisão judicial transitada em julgado”. A Folha de S.Paulo não localizou as demais defesas.

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