Brasil

Polícia matou 17 pessoas por dia no Brasil, e 12 estados tiveram alta de letalidade

Redação Diário da Manhã

Publicado em 24 de julho de 2025 às 09:43 | Atualizado há 1 dia

Tulio Kruse – Folha Press

Policiais militares e civis mataram um total de 6.243 pessoas ao longo do ano passado no Brasil. Embora isso tenha significado uma queda de 3% nos números absolutos, ainda representa uma média de 17 mortes por dia.

Além disso, como houve uma queda geral nos assassinatos em ritmo maior, a violência policial hoje é responsável por uma parte maior do total de mortes violentas intencionais no país.

Os dados são do 19º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgado nesta quinta-feira (24). A estatística inclui tanto casos em que os autores das mortes estavam em serviço e de folga ou seja, representa não apenas a letalidade das operações oficiais das forças de segurança, mas da conduta dos policiais como um todo.

A violência do Estado aumentou num período em que o país passava por uma diminuição dos assassinatos. Em 2014, as mortes em intervenções da polícia respondiam por 5,1% do total de mortes violentas no país (em números absolutos, foram 3.146 vítimas). Dez anos depois, essa proporção subiu para 14,1%, com praticamente o dobro de mortes provocadas pelas forças de segurança.

Em paralelo aos 6.243 mortos, um total de 46 policiais foram mortos em serviço e outros 124 morreram de forma violenta quando estavam de folga. Isso significou uma queda de 4,5% na vitimização de policiais, o que está mais próximo da diminuição nas mortes violentas intencionais em geral no país (de 5,4%).

As vítimas da violência policial foram, na maior parte, homens, negros e com idades entre 18 e 24 anos. A taxa de morte em intervenções policiais foi de 9,6 a cada 100 mil habitantes nessa faixa etária, e de 7,3 entre aqueles de 25 a 29 anos. Todas as demais faixas etárias têm taxas abaixo de 5 mortes a cada 100 mil.

O estudo também aponta que o risco de uma pessoa negra ser morta pelas forças de segurança é 3,5 vezes maior do que o para uma pessoa branca. São Paulo, o estado mais populoso, destacou-se pelo crescimento das mortes provocadas por policiais no segundo ano de mandato do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos). Foram 813 mortes provocadas por policiais, um aumento de 61% em relação a 2023.

Parte importante dessas mortes ocorreu durante a Operação Verão, que mobilizou centenas de policiais militares na região da Baixada Santista entre o fim de janeiro e o início de abril, em resposta à morte de um soldado da Rota (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar, tropa de elite da PM). A Verão deixou um saldo oficial de 56 mortos, tornando-se a operação mais letal na história da corporação desde o Massacre do Carandiru, em 1992.

Para a diretora-executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Samira Bueno, há uma conexão entre as mortes em que a polícia transgride padrões legais de conduta quando matam quem não oferece risco à vida de ninguém— e os casos mais graves de corrupção, quando agentes do Estado passam a colaborar com o crime organizado.

Num artigo publicado no Anuário com outros dois pesquisadores Leonardo de Carvalho, da UFRJ, e Thais Carvalho, da USP, Samira lembra de um dos assassinatos de maior repercussão de 2024: o de Antônio Vinícius Gritzbach, delator do PCC (Primeiro Comando da Capital) fuzilado no Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos. Dezoito policiais militares foram denunciados, inclusive três acusados de matá-lo na área de desembarque.

“Se o controle do crime organizado é uma prioridade, o controle das forças policiais também precisa ser priorizado. O policial corrupto também é o policial que aperta o gatilho, e o policial que aperta o gatilho também é corrupto”, disse Samira à Folha. “É muita ingenuidade achar que essas coisas não têm conexão.”
Nos últimos anos, a letalidade policial fez surgir o debate sobre a obrigatoriedade do uso das câmeras corporais pela Polícia Militar. Os equipamentos têm servido como meio para obter provas de crimes cometidos por policiais em vários casos desde sua implementação, a exemplo da prisão em flagrante de dois PMs pela morte de um suspeito que já estava rendido há duas semanas em Paraisópolis, na zona sul de São Paulo.

Até dezembro do ano passado, dez estados tinham programas de câmeras corporais em andamento nas suas PMs, segundo estudo do Fórum. Outros dez estavam em fase de testes e implementação dos equipamentos. Amazonas, Mato Grosso, Tocantins, Goiás, Distrito Federal e Sergipe não tinham programas de câmeras em andamento nem previsão de implementá-las na tropa.

O caso mais singular é o de Santa Catarina, que teve o programa pioneiro no Brasil e o encerrou em setembro do ano passado. A gestão Jorginho Mello (PL) disse, à época, que a tecnologia dos equipamentos estava obsoleta, que havia “fragilidade e vulnerabilidade nos quesitos de segurança”, e que faltavam verbas para continuar o programa.

Não houve variação no número de mortes provocadas por policiais em Santa Catarina em 2024, mas a PM passou a maior parte do ano com o programa ainda em vigor.


Proporção da letalidade policial nas mortes violentas
Dados de 2024 (em %)
Amapá – 38%
Sergipe – 28%
Goiás – 27%
Bahia – 26%
Pará – 24%
São Paulo – 22%
Mato Grosso – 19%
Rio de Janeiro – 18%
Paraná – 18%
Tocantins – 16%
Mato Grosso do Sul – 16%
Brasil – 14%
Santa Catarina – 12%
Rio Grande do Norte – 10%
Rio Grande do Sul – 9%
Espírito Santo – 8%
Alagoas – 7%
Minas Gerais – 6%
Distrito Federal – 6%
Acre – 6%
Ceará – 5%
Paraíba – 5%
Piauí – 4%
Roraima – 4%
Amazonas – 4%
Maranhão – 4%
Pernambuco – 2%
Rondônia – 2%
Fonte: 19º Anuário Brasileiro de Segurança Pública

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