Brasil

Políticos e juízes brasileiros recebem 20 vezes mais que a renda média da população

DM Online

Publicado em 13 de agosto de 2025 às 09:24 | Atualizado há 1 hora

Luany Galdeano – Folha Press

O Brasil tem um dos piores índices de desigualdade de renda entre gestores públicos e a população do país, atrás de nações como Chile e Argentina. Aqui, políticos e juízes federais podem chegar a vencimentos cerca de 22 vezes maiores que o salário médio dos brasileiros.

O presidente da República e os deputados federais ganham 21 vezes o salário médio da população do país. Enquanto políticos receberam remunerações de R$ 44 mil no ano passado, a renda domiciliar per capita nacional foi de R$ 2.069, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

Os dados são do Índice de Disparidade Salarial 2025, feito pelo Livres, grupo voltado ao liberalismo econômico. O índice calcula quantas vezes o salário de um político ou servidor é maior do que a renda média da população. Foram avaliados dados de 16 países.

O estudo faz a comparação a partir do salário do presidente da República e de deputados e juízes federais, que recebem o equivalente ao teto constitucional no serviço público. O estudo considera dados de 2024, quando o teto estava em R$ 44 mil.

No caso dos magistrados federais, a renda bruta no ano passado variava entre R$ 35,8 mil para os substitutos e R$ 39,7 mil para os desembargadores, conforme estabelecido pelo CJF (Conselho da Justiça Federal). O valor não considera adicionais, como as verbas indenizatórias, que podem elevar os vencimentos acima do teto.

No ano passado, a renda média dos magistrados foi de R$ 48,6 mil, segundo dados do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), valor que já ultrapassa a regra do CJF. Com isso, os juízes recebem, em média, 23,5 vezes o salário da população. Mas houve casos de juízes recebendo até R$ 444 mil, o que amplia ainda mais a diferença.

Em relação ao presidente da República, a desigualdade de renda no Brasil fica acima da média global, cujo índice de desigualdade é de 10,7, e da média de países em desenvolvimento, cuja cifra é 16,8.

Na Argentina, por exemplo, o presidente teve uma remuneração de cerca de 4 milhões de pesos (R$ 16 mil) em 2024, enquanto a renda média da população do país foi de 442 mil pesos (R$ 1.812). O salário do chefe do Executivo foi 9,2 vezes superior ao dos argentinos.

Já no Chile, o presidente tem uma renda 13,7 vezes maior do que o salário médio da população. A remuneração do chefe do Executivo é de 7,5 milhões de pesos chilenos (R$ 42 mil), enquanto a renda dos chilenos é de 555 mil pesos (R$ 3.109).

As diferenças são ainda maiores no caso dos deputados federais. Na Argentina, os salários dos parlamentares são 4,5 vezes maiores do que os da população do país. A cifra cai para 3,7 no Reino Unido e para 3,0 em Portugal.

Já ministros do STF (Supremo Tribunal Federal), do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e do STJ (Superior Tribunal de Justiça) recebem cerca de 22 vezes o salário dos brasileiros. A diferença também é maior do que na Argentina e no Reino Unido, onde o salário dos membros da Suprema Corte é 11 vezes superior à renda média da população. Em países como Suíça e Alemanha, os vencimentos são 6 vezes maiores.

O estudo usou dados da Pnad Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua), além de estatísticas nacionais de outros países, como o do INDEC (Instituto Nacional de Estadística y Censos) da Argentina e do INE (Instituto Nacional de Estadística) da Espanha.

O levantamento não considera salários recebidos por servidores concursados ou comissionados no Executivo federal. Nesses casos, as diferenças podem ser ainda maiores levando em conta as carreiras mais bem remuneradas: advogados da União ganharam até R$ 547 mil em honorários no ano passado, como revelou a Folha de S.Paulo.

Para especialistas, a diferença de renda entre os mais bem remunerados no setor público e a população do país pode gerar desconfiança em relação a políticas e serviços públicos.

Isso porque, devido à renda elevada, os políticos e a elite do funcionalismo não dependem dos serviços públicos, como é o caso de boa parte dos brasileiros. Eles costumam acessar, por exemplo, redes particulares de saúde, além de matricular os filhos em escolas privadas.

“Como a população entende que essas pessoas não estão familiarizadas com aquele ambiente, a crença de que elas podem legislar de forma eficiente sobre isso diminui”, afirma Magno Karl, diretor do Livres. “Há potencial de corroer a crença nas instituições da democracia representativa.”

Segundo o diretor, o estudo serve para expor o grau das diferenças salariais no Brasil. O país é o terceiro mais desigual entre o 17 analisados, à frente apenas da África do Sul e do México, onde chefes de Estado recebem, respectivamente, valores quase 22 vezes e 24 vezes superiores à renda média da população.

“O salário maior do que a média faz com que a população tenha um sentimento de injustiça, e isso talvez ajude a minar a legitimidade do Estado”, afirma Cibele Franzese, professora de administração pública da FGV (Fundação Getulio Vargas).

Para ela, o caso do Judiciário é mais grave devido aos supersalários, que extrapolam o teto constitucional. Franzese afirma que as remunerações de agentes políticos do Executivo e do Legislativo correspondem com seu grau de responsabilidade, sobretudo no caso do presidente da República.

Embora tenham vencimentos elevados, políticos não contam com os mesmos benefícios dos servidores do Judiciário, como as verbas indenizatórias livres de Imposto de Renda e o direito a duas férias ao ano.

Políticos também dependem de eleições para permanecer no cargo, enquanto magistrados contam com a vitaliciedade ou seja, só podem ser expulsos de sua função após sentença judicial transitada em julgado.

Para a professora, o estudo traria uma análise mais complexa se abordasse a efetividade, ou seja, a relação entre o que é gasto e o que é entregue. “Não temos evidência de que o gasto com salários de políticos prejudique a qualidade dos serviços públicos. A gente tem evidência de que a qualidade depende mais de um serviço público bem gerenciado, de uma boa gestão de desempenho e pessoas capacitadas trabalhando, tanto nas carreiras públicas, quanto na ponta.”

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