Cidades

Por que os goianos matam e agridem as mulheres?

Rariana Pinheiro

Publicado em 28 de dezembro de 2022 às 21:53 | Atualizado há 2 anos

 

Rariana Pinheiro

Enfermeira foi atropelada e quase perdeu a vida ao tentar impedir agressão à mulher no meio da rua. 



Neste ano, o goiano teve que lidar com notícias de violência contra a mulher, difíceis de digerir. No começo do mês, uma criança de 10 anos esfaqueou o pai em Uruaçu, no norte goiano. Conforme informações da Polícia Civil de Goiás (PCGO), o garoto defendia a mãe de uma agressão. Já a enfermeira Leidiane Nazário Rodrigues, de 35 anos, na tentativa de impedir uma agressão do empresário Leonardo Oliveira Lobo de Souza contra a sua esposa na rua, foi atropelada, arrastada por 20 metros e prensada contra a parede.


Tal agressão contra a enfermeira, foi uma das que mais marcou a delegada da Delegacia de Atendimento Especializado à Mulher (DEAM) da região noroeste de Goiânia, Azuen Magda Albarello neste ano. “Como delegada e cidadã, a gente prega que se alguém ver um caso de violência deve denunciar. Isso que ela fez. Esse exemplo, é caso verdadeiramente violência de gênero, em que a vítima foi agredida por ser mulher. Ela vai ficar dois meses sem andar porque teve fraturas na bacia, meses sem falar, porque machucou o maxilar e porque fez sua parte como cidadã”


Os casos de feminicídio, que, segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) aumentaram em 121% em relação aos primeiros semestres de 2019, segundo a delegada, na maioria das vezes,  acontecem devido a ciúmes e términos que não foram aceitos pelo gênero masculino.


“Atendo cerca de 25 mulheres por dia, que são ameaçadas e agredidas pelos homens que não aceitam o fim da relação. Se ele termina está correto. O homem que tem que dizer quando começa e termina o relacionamento e não aceita a mulher colocar limite. O machismo aliado à forma com que muitos  homens são criados, uma personalidade agressiva, favorece esses casos”, argumenta. 


Segundo a  psicóloga forense, psicóloga jurídica da Coordenadoria da Mulher do Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO), Daniele Nascimento, os casos de violência contra a mulher aumentam de forma assustadora no Brasil e, consequentemente, em Goiás. Conforme dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, quatro mulheres morreram por dia, vítimas de feminicídio, entre janeiro e junho deste ano. 


Ela explica que o crescimento se deve ao aumento das denúncias. “Muitos desses casos não eram denunciados ou subnotificados”, afirma. Mas, apesar das denúncias crescerem, a psicologia jurídica, informa que o motivador dos casos é quase sempre à forma com que a mulher é encarada pela sociedade.


“Os casos acontecem porque as mulheres são consideradas inferiores e frágeis. E há uma naturalização desse tipo de violência. O ciúme, por exemplo, muitas vezes é visto como proteção e cuidado, inclusive nas músicas atuais. Quando sofrem violência, as mulheres são questionadas e consideradas culpadas de algo que elas não fizeram”, argumenta.


Ela conclui que o lar, que deveria trazer conforto, não representa segurança para as mulheres. “O homem se sente dono do corpo e das decisões das mulheres. Essa é uma questão complexa e enraizada na nossa sociedade, desde a época colonial em que existia uma permissão para o marido matar esposa e amante, em casos de traição”. 

 

Rariana Pinheiro

  Para psicóloga jurídica Daniele Nascimento, muitos lares não são lugares seguro para as mulheres



Saídas

A persistência da violência contra a mulher, de acordo com a advogada e professora de Direito, Carolina Lima Gonçalves, que é Mestra em Direitos Humanos-UFG e doutoranda em Ciência Política-IPOL/UnB e em Direitos Humanos – UFG, como todo problema social complexo, não possui respostas ou soluções simples. Contudo, acredita que é possível apontar aspectos que corroboram para tal fenômeno. 


“O primeiro é que até pouco tempo a violência contra a mulher era tratada como uma questão privada, familiar, ou seja, não era reconhecida como um problema social e de segurança pública, o que só começou a mudar com advento da “Lei Maria da Penha” (Lei n 11.340/2006)”


O segundo aspecto, a advogada acredita que centra-se na socialização dos homens, que ainda conserva a ideia de superioridade sobre as mulheres. E, em paralelo, cita a conservação de modelos e ideais de comportamento das mulheres associado à docilidade e a subordinação

“Este comportamento conflita com a realidade atual em que as mulheres, cada vez, mais galgam espaços em posição de poder e independência financeira e emocional. E importa mencionar ainda que a violência física é o ápice, mas geralmente, é precedida de outras formas violentas como a psicológica, e a patrimonial”, analisa.

84 anos de Consuelo Nasser: pioneira na luta contra violência às  mulheres em Goiás

 

Rariana Pinheiro

                         Consuelo Nasser


Uma luz na luta contra a violência contra a mulher foi a jornalista, advogada e feminista Consuelo Nasser, que,  nesta quarta-feira (28), se estivesse viva,  completaria 84 anos. Sua existência mudou um pouco a realidade de muitas mulheres em situação de vulnerabilidade e violência em Goiás, pois foi a fundadora do Centro de Valorização da Mulher (Cevam).


A entidade, fundou ao lado das amigas  Linda Monteiro, Mari Baiochi, Marília Vecci, Amália Hermano, Belkiss Spenciere, Glória Drummond, Maria Cabral, Ivone Silva, Gracie Climaco e outras. Em seus  últimos 11 anos de vida, se dedicou completamente à entidade e transformou sua casa no Setor Sul, em sede do Cevam. Assim, agregou ao espaço, os serviços de abrigamento tanto de mulheres vitimadas pela violência doméstica e sexual (Projeto Nove Luas), quanto adolescentes (Projeto Castelo dos Sonhos). 


Mulher culta e informada, no início da década de 1980, comandou importante semanário da imprensa goiana, o Cinco de Março (1959-1979), também dirigiu financeiramente os jornais Diário da Manhã (1982-1984) e Folha de Goyaz (1984). Também fundou e comandou o jornal Edição Extra (1984-1985), e a Revista Presença (1986-1991). 


Lançou ainda o livro “Alfredo Nasser – O líder não morreu” que conta a história do tio que considerava como pai. Com 438 páginas, a obra foi lançada pela editora Líder e com o apoio da Assembleia Legislativa de Goiás.

Consuelo Nasser foi mãe de nove filhos (Júlio Nasser (Atual presidente do Diário da Manhã), Fábio, Tanila Romana, Luciana, Mônica, Jorge, Sérgio, Camila e Vanessa). Tanila morreu aos quatro meses de vida (1966) e Fábio aos 32 anos (1999). Depois de 23 anos de vida comum, Consuelo Nasser e Batista Custódio se separam, em 1985. 

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