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A dor que não cessa

Com milhares de fãs aguardando ansiosamente por sua apresentação no Rock in Rio 2017, a cantora norte-americana, Lady Gaga, cancelou seu show na última quinta-feira (14/09), um dia antes da data marcada no evento. O motivo da decisão tem nome pouco conhecido, mas que é reconhecido desde 1990 pelo Colégio Americano de Reumatologia: fibromialgia. De acordo com a definição dada pela Sociedade Brasileira de Reumatologia, trata-se de uma síndrome clínica que se manifesta com dores no corpo inteiro, mas que ainda não há uma definição onde são sentidas, se nos músculos ou nas articulações.

Maria Lúcia, 55 anos, sofre com a síndrome há 30 anos, ela conta que começou a sentir as dores durante a gravidez de sua segunda filha e pioraram depois do parto. Na época, a funcionária pública consultou diversos médicos e realizou exames que não apontavam um diagnóstico. “Eu já estava de um jeito que quando eu me consultava com o médico e ele me perguntava o que eu tinha, eu chorava porque sabia que teria que repetir tudo. Eles passavam um monte de exames e não dava nada. As dores pareciam dores fantasmas, mas elas existiam e eram muito fortes”, descreve.

Ela tratou a dor por muito tempo com analgésicos até que viu um programa de TV falando sobre a fibromialgia. Com a descrição da síndrome, Maria Lúcia identificou a semelhança com as dores que sentia, além da insônia e outros sintomas. A funcionária pública procurou, então, um neurologista que indicou um medicamento controlado e a encaminhou também para um reumatologista, ela afirma que depois do remédio pôde ter um alívio dos sintomas.

Foram quase sete anos entre a época que Maria Lúcia começou a sentir as dores até quando os médicos diagnosticaram a síndrome. “O mais triste dessa síndrome é que as pessoas olham para você e você está bem, aparentemente ótima, mas só você sabe da dor que sente. Às vezes, você está fazendo careta de tanta dor e as pessoas pensam que você está fingindo ou acham que é um problema psicológico, mas a dor é real”, comenta.

Maria Lúcia relata ainda que atualmente toma um analgésico para dores neuropáticas duas vezes por dia, vai à psicoterapia e pretende voltar a fazer pilates. Diferente de Ana Lúcia Britschgi, 42 anos, que toma ômega 3, vitamina Q10 e cápsulas de alho, além de reduzir o glúten na alimentação. A agente de turismo conta que soube da síndrome em decorrência da depressão, quando as dores começaram a aparecer há quatro anos. “Eu tinha a crise e ficava dias de cama com dores musculares. Morava na Suíça e o frio aumentava as dores. Eu não conseguia mais limpar a casa, eu não trabalhava, então tive que vir embora”, narra.

Ana Lúcia afirma que a mudança de clima ajudou muito e que hoje tem dores leves, mas ainda assim não consegue executar tarefas como limpar casa ou andar por muito tempo. Além das atividades físicas, ela cita que alterações de humor também influenciam para surgimento das dores. “Nesses casos, tento me acalmar e mentalizar coisas boas. Remédios acabam com a saúde e com o tempo não agem igual, então faço afirmações positivas, mentalizações e orações”, comenta.

Membro da comissão de fibromialgia da Sociedade Brasileira de Reumatologia, Dr. José Martinez, explica que a fibromialgia é multifatorial, ou seja, cada pessoa apresenta a síndrome por fatores diversos. “Todos nós temos um sistema que controla a dor, ele funciona para não interpretarmos tudo como dor, mas quem tem a síndrome apresenta um desequilíbrio nesse sistema”, esclarece. Ele cita que há atualmente dois tipos de tratamentos: os não medicamentosos, como exercícios aeróbicos, e os medicamentosos, antidepressivos e anticonvulsivos.

Dr. Martinez explica que há alguns tratamentos que não são unanimidade na comunidade médica como a acupuntura e outros ainda sendo pesquisados em universidade como a Estimulação Magnética Transcraniana (ETM), que consiste em em um procedimento médico que utiliza estímulos elétricos e magnéticos para reestabelecer o  funcionamento cerebral. A fibromialgia foi descrita em um artigo pela primeira vez por Hugh Smythe e Moldofsky em 1977. De acordo com o médico, não há registro do número exato de quantas pessoas apresentam a síndrome. “Há dois estudos no Brasil, um indica que 2,5% da população brasileira sofre com a fibromialgia e outro aponta 4,4%”, afirma.

O pouco conhecimento sobre a síndrome leva muitas pessoas a negligenciar as dores do fibromiálgico, quando não é acompanhado também pelo preconceito. Lady Gaga cancelou seu show, mas alguns dos fãs desconsideraram o motivo e reclamaram da sua decisão nas publicações da cantora nas mídias sociais. Em um dessas publicações, a cantora mostra o braço recebendo medicamento na veia. Na legenda, ela afirma que precisa cuidar do corpo, pede a compreensão dos fãs e promete voltar em breve para se apresentar no Brasil.

A assessoria da cantora publicou também uma nota explicando a gravidade das dores que impedem sua performance no festival Rock in Rio 2017. “Lady Gaga está sob os cuidados de médicos especialistas. Ela manda seu amor para todos os fãs do Rio e agradece por seu apoio e compreensão”, afirma.

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