Cotidiano

Quando a paixão vira doença

Diário da Manhã

Publicado em 28 de dezembro de 2017 às 00:50 | Atualizado há 5 meses

A paixão, o amor e a obses­são têm estágios diferen­tes que podem ser aumen­tados na vida de quem desenvolve os sentimentos mexidos por outra pessoa. A paixão é muito parecida com a obsessão. A diferença é que a primeira representa uma emo­ção comum do primeiro contato com alguém especial.

Já a paixão pode se manifestar de algumas formas, como quan­do o coração palpita ao encon­trar aquela pessoa. Ou quando os pensamentos ficam direcio­nados a ela o tempo inteiro.

Quando o amor vira obsessão é preocupante. Alguns sentimen­tos da fase da paixão voltam com tudo: o amado passa a dominar a cabeça e a possibilidade de per­dê-lo gera um pânico profundo e provoca atitudes irracionais.

A ex-procuradora de Justi­ça Luiza Nagib Eluf, atualmente advogada criminalista, tem sete livros publicados sobre crimes sexuais e passionais sob a ótica feminina. “A paixão no banco dos réus”, por exemplo, aborda casos de assassinatos de mulheres que chocaram o Brasil.

Para a advogada, todos os ca­sos são chocantes, tanto pela violência na execução da vítima quanto pela maldade, frieza e ou­sadia. Relata ainda que o femi­nicida tem ódio de todas as mu­lheres. “O Brasil tem cerca de dez casos por dia de feminicídio, um dos campeões do mundo. Em meu livro, eu descrevi 14 casos chocantes”.

Luiza comemora a lei que vem sendo aplicada de forma corre­ta e severa. Mesmo com as defi­ciências do serviço público, em geral, que pode ocasionar algu­ma impunidade devido a demo­ra nos julgamentos ou pela fuga do réu, dentre outros. “Acabou a tolerância que havia antigamen­te e que terminava em absolvição do assassino”, vibra.

AMOR VERDADEIRO OU DOENTIO?

Não querer perder quem se ama é uma convicção comum para muitos casais. No entanto, a maneira como as pessoas lidam com as crises nos relacionamentos pode dizer muito se o sentimento pelo parceiro é amor ou obsessão. É um transtorno compulsivo que, se não for controlado, pode ser pe­rigoso para a saúde do paciente e das pessoas do seu convívio.

Quem se considera vítima desse amor doentio precisa rea­lizar um tratamento com a ajuda profissional. Foi o caso da pro­fessora Lauane Cerqueira, que passou por um momento difícil em seu último relacionamento.

Para se sentir segura, foi neces­sário anos de terapia. Não aceitava que o companheiro olhasse para o lado, ou mesmo saísse sozinho, implicava até com sua vida profis­sional. “Sentia algo ruim dentro de mim, não queria perdê-lo. Quan­do ele me deixava para ter o seu momento, eu chorava pensando que não ia voltar. Isso é uma doen­ça e hoje me curei”, conta.

Características do relacionamento doentio

O perfil controlador está entre as características de uma pessoa obsessiva. Quem tem um com­portamento obsessivo-compulsi­vo pode querer manter o controle total da vida do parceiro.

A paranoia se manifesta de um jeito incontrolável e tudo vira sus­peita de mentiras e traições. Che­gar mais tarde em casa ou sair para espairecer com os amigos começa a parecer forte indícios de que há ou­tro envolvimento amoroso no jogo.

Além das desconfianças com pouco embasamento real, a obses­são também se manifesta através das perseguições. As mulheres com essa doença passam a querer saber sobre cada passo dado pelo parcei­ro, onde foi e por que foi, mostran­do uma necessidade de domínio.

Essas características são perigo­sas e podem causar o fim do rela­cionamento, pois, por mais que o companheiro goste da namorada ou esposa, o estilo de vida torna-se pesado e a convivência com a porta­dora da patologia pode ser infernal.

Não aceitar a rejeição é outra característica complicada. A pes­soa que passa por isso tem medo de perder a pessoa na qual julga amar, por isso, se a ameaça de ficar sozinho for concretizada, qualquer loucura pode aparecer para tentar evitar o prejuízo.

Nesse caso, é comum que a pessoa faça ameaças de suicídio e outras loucuras que podem afe­tar a si próprio ou o companheiro. Quem está se relacionando com uma pessoa obsessiva precisa to­mar cuidado com as atitudes, pois, no auge da falta de controle, qual­quer ameaça que pareça imprová­vel pode tornar-se real.

Os obcecados possuem também a mania de passar o dia admirando as qualidades da pessoa que gos­ta de uma forma não saudável. Os outros campos da vida do portador passam a ser deixados de lado, pois a coisa mais importante é manter o companheiro próximo e dominado. Esse tipo de pessoa pode negligen­ciar a profissão, a saúde, a família e os amigos de um jeito que passa a se isolar e sofrer as consequências do desequilíbrio pessoal.

A doença se manifesta apenas em alguns momentos da vida do portador, porém se houver des­confianças e motivos para preo­cupações, o que seria apenas um sentimento de dúvida em uma pes­soa normal, transforma-se em um motivo para brigas desenfreadas e comportamento compulsivo.

A tendência é que, se não hou­ver tratamento, a pessoa entra em decadência emocional e passa a ter cada vez mais dificuldades de relacionar-se com alguém e de conviver em sociedade.

Uma ameaça preocupante é a depressão. Uma briga sem motivos ou um sentimento negativo gera­do por uma desconfiança ou pela imaginação destrutiva podem ser suficientes para o desenvolvimen­to da depressão.

O sentido da vida é desvia­do para a presença da pessoa na qual o pensamento obsessivo foi desenvolvido e qualquer confli­to com esse companheiro pode causar problemas graves para a mente do doente. Com o tempo, os momentos depressivos ten­dem a se tornar mais frequentes do que os períodos felizes, o que demonstra a necessidade de um tratamento para recuperar a qua­lidade de vida.

 

Goiás acumula lista de crimes passionais

Desde os anos 1960, assassi­natos envolvendo casais famo­sos ou não causam comoção no Brasil, como os de Angela Diniz, Daniela Perez, Eloá Pi­mentel, Eliza Samúdio e Mar­cos Matsunaga.

Em Goiás, casos como de Ju­liana Paiva, 25 anos, morta pelo namorado, no dia 29 de maio de 2015, em um shopping de Aparecida de Goiânia, choca­ram os goianos, principalmen­te aqueles que estavam presen­tes na hora da execução.

Juliana estava com o namo­rado, o guarda civil metropo­litano Ewerton Duarte Caldas, na praça de alimentação do shopping. O casal se desen­tendeu e o homem atirou na cabeça da namorada e em se­guida disparou um tiro contra ele mesmo e morreu no Hos­pital de Urgências de Goiânia (Hugo).

No dia 6 de outubro de 2016, Lidiane Gomes Reis Me­drado, de 31 anos, foi vítima do ex-marido David da Silva Medrado, de 32 anos. O ex­-companheiro não aceitava o fim do relacionamento, inva­diu a casa da família, matou a filha, a ex-cunhada e feriu a ex-sogra. Em seguida, David cometeu suicídio. Familiares de David relataram à polícia que ele não aceitava a sepa­ração e que estava depressivo. Lidiane sobreviveu ao aten­tado do ex-marido, mudou­-se de residência e hoje tenta seguir a vida após a tragédia.

Três dias depois, no dia 9 de outubro de 2016, em Via­nópolis, a vítima foi uma fi­sioterapeuta de 27 anos, Cail­lane Marinho. A jovem foi encontrada morta dentro de casa com um tiro na cabeça. O autor do crime, o namo­rado, o engenheiro agrôno­mo Diego Henrique Lima, 30 anos, com quem morava há dois meses. Amigos da vítima relataram na época que o ca­sal tinha uma relação turbu­lenta e que ele era ciumento. Dias antes do crime, Cailane chegou a revelar que estava triste com o relacionamen­to e queria terminar com o companheiro.

Cerca de duas semanas an­tes do crime, Diego escreveu uma carta para a namorada. No texto, pede desculpas à jo­vem, diz que a ama e afirma: “Não te mereço e deixei tudo acabar”. Mais uma vítima, dei­xou uma filha de 7 anos. Cin­co dias após o crime, Diego se entregou à polícia e disse que o tiro foi acidental.

Esses e outros casos vêm causando pânico, principal­mente, entre as mulheres. A orientação da Justiça é não ter medo e denunciar os casos de agressão para que as medidas de proteção sejam realizadas. As denúncias podem ser fei­ta de forma anônima na Cen­tral de Atendimento à Mulher, disque 180.

A violência praticada con­tra os homens é um assunto pouco debatido no Brasil, no entanto, há uma dificuldade para identificar essa violência, pois os homens têm vergonha de admitir. Considera-se vio­lência doméstica todo e qual­quer tipo de agressão, seja ela física ou psicológica, ou ainda, conduta controladora, frases insultantes, frases deprecia­tivas, ameaças, tapas, ponta­pés e golpes. Portanto, ambos os sexos têm apoio e proteção no Judiciário.

 

CASOS QUE REPERCUTIRAM NO PAÍS

 

Os crimes contra as mulheres também ocorrem em grande quantidade nas camadas mais destacadas da sociedade, inclusive dentre artistas

 

  • Mércia Nakashima – Desapareceu no dia 23 de maio de 2010, e só teve o corpo encontrado no dia 10 de junho. O policial militar reformado e ex-namorado da vítima, Mizael Bispo, foi apontado como autor do crime. Disse ter assassinado a namorada por não concordar com o fim do relacionamento. Foi condenado a 20 anos de prisão.
  • Ângela Diniz – A socialite foi assassinada às vésperas do no ano novo, no ano de 1976, em Búzios. O autor do crime foi o namorado com quem vivia há três meses, o corretor de ações Raul Fernando do Amaral Street. O namorado tinha um ciúme doentio e perdeu o controle tirando a vida da companheira. Na época, o advogado de defesa relatou amores anormais, devido a um suposto caso homossexual que ela havia tido. Portanto, o júri declarou que o assassinato foi cometido em “legítima defesa da honra”. Resultou em dois anos de prisão, porém não foi cumprido, mas na segunda sentença, o réu foi condenado a 15 de anos de prisão.
  • Sandra Gomide – A jornalista foi morta no dia 20 de janeiro de 2000. O namorado, diretor de redação, matou devido ao término do namoro. Ficou preso mais de 10 anos e cumpre em casa o restante da pena, desde 2016.
  • Eliza Samúdio – A modelo e mãe do filho do ex-goleiro do Flamengo, Bruno Fernandes, desapareceu em 4 de junho de 2010. O jogador foi apontado como mandante do assassinato de Eliza, sendo sentenciado, depois de inúmeras trocas de advogado e embates entre defesa e acusação, a 22 anos e três meses de prisão pelos crimes de homicídio triplamente qualificado, ocultação de cadáver e cárcere privado de seu filho com a modelo, Bruninho. A polícia de Minas Gerais nunca localizou o corpo da vítima.
  • Marcos Matsunaga – A técnica em enfermagem Elize Matsunaga assassinou e esquartejou o marido, Marcos, diretor da empresa Yoki, em 19 de maio de 2012. Segundo ela, durante uma discussão do casal, motivada pelo envolvimento do empresário com prostitutas, acertou um tiro na cabeça dele e, sem saber o que fazer com o cadáver, pegou uma faca de cozinha, dividiu o corpo em seis partes e as colocou em malas de viagem, para se livrar da prova do crime com menos dificuldade. Presa em 4 de junho de 2012, a ré foi condenada a 19 anos e 11 meses de prisão em 5 de dezembro de 2016.
  • Eloá Pimentel – Inconformado com o fim do relacionamento, Lindemberg Alves Fernandes invadiu o apartamento da ex-namorada, em Santo André, ABC paulista, no dia 13 de outubro de 2008. A jovem estava na companhia de três amigos, quem também foram feitos reféns. Após ameaças, o sequestrador acabou liberando os dois rapazes no mesmo dia. Após aproximadamente 100 horas de sequestro, policiais militares invadiram o cativeiro. Acuado, Lindemberg alvejou as meninas: Nayara foi atingida no rosto, mas, sobreviveu; Eloá foi atingida na cabeça e na virilha e morreu. Em 16 de fevereiro de 2012, o assassino foi condenado a 98 anos e dez meses de prisão.
  • Daniella Perez – Foi cruelmente assassinada no dia 28 de dezembro de 1992 pelo colega de trabalho Guilherme de Pádua, que contracenava com ela na novela “De corpo e alma”. A esposa de Guilherme, colaborou com o crime e o casal cumrpiu apena um terço da pena. A mãe da atriz, a escritora Glória Perez, conseguiu um milhão de assinaturas em um abaixo-assinado que aprovou a primeira emenda popular da história do Brasil, tornando o homicídio qualificado crime hediondo.
  • Eliana de Grammont – Esposa do cantor Lindomar Castilho, foi morta no dia 30 de março de 1981. O casal estava junto há dois anos. Lindomar era agressivo, e inconformado com o término do casamento, cometeu o assassinato. Quatro anos após o crime, ele foi beneficiado por um bom comportamento e conseguiu a liberdade condicional.

 


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