O Presídio de Trindade é uma ilha de excelência no sistema prisional de Goiás. Quem garante isso são professores, gestores e outros que conhecem a cadeia, como o presidente da Subsecção da Ordem dos Advogados de Trindade. “Esse é o presídio onde os presos têm de fato oportunidade de se reeducar, onde os familiares e visitantes são tratados com dignidade e onde os advogados têm suas prerrogativas profissionais respeitadas”, comenta o advogado criminalista Marcelino Assis Galindo.
Para que isso aconteça, o trabalho de garantir a execução desse projeto é cuidado dia após dia com atenção integral do diretor do presídio, Fábio Teixeira Rocha. A unidade foi inaugurada em 2009, tem capacidade para 165 presos, mas comporta um número que oscila em torno de 420 presos provisórios e apenados já cumprindo pena. São 340 no regime fechado e 80 no semiaberto. Tudo isso com apenas oito servidores efetivamente trabalhando no presídio.
Fábio Teixeira executou um audacioso projeto de humanização da forma de relacionamento com os presos e com a comunidade, aumentando as possibilidades de trabalho e inserção para detentos e reeducandos. “Sempre acreditamos que a geração de oportunidades de trabalho no presídio teria o condão de dar mais tranquilidade aos presos, pacificar as relações e permitir que novas práticas fossem adotadas por eles e com eles”, resume o diretor.
Uma das principais atividades criadas pelo diretor foi a instalação de uma linha de montagem de blocos de cimento para usar nas construções do próprio presídio. Os detentos do regime fechado podem sair da carceragem, onde impera a superlotação, o cheiro nada agradável do cárcere e a ociosidade que provoca inúmeros problemas, e ir para um lugar aberto, arejado, com a vista do campo pela frente e trabalhar para ganhar algum dinheiro.
Antônio Nilson Santiago, 34 anos, natural de Miracema do Tocantins, cumpre pena de oito anos e nove meses. Ele trabalha na linha dos blocos de cimento e não quer sair de lá enquanto não conseguir o benefício de progressão para o regime semiaberto. “Aqui eu fico fora da cela durante o dia, posso me divertir e aprender uma profissão. Sei que quando eu sair daqui poderei ter uma ocupação correta e ganhar meu sustento”. Ele lembra que já esteve recluso em outro presídio e que o de Trindade gera muito mais oportunidades que os outros. O subsídio de 2/3 do salário mínimo que ele recebe para trabalhar é mandado para a família. “Trabalhando a gente se esquece de pensar em fugir e não tem vontade de arrumar confusão”, resume.
Outra oportunidade singular de trabalho digno e aprendizado de uma ocupação lícita foi abraçada pelas detentas Adriana Rosário de Jesus, 38 anos, e Aresina Aparecida Simão, 45. Aresina está há três anos e quatro meses no presídio de Trindade e fala com alegria da oportunidade de trabalhar na cozinha que prepara as refeições dos servidores da unidade. “Já completaram dois anos que estou aqui na cozinha e posso garantir que é muito melhor ficar aqui do que lá dentro da carceragem feminina. Aqui eu trabalho e reduzo minha pena e aqui aprendi o ofício em uma cozinha industrial, porque antes não sabia cozinhar nada”, explica. Para ela, a oportunidade é única, como outras geradas pela direção do presídio e por isso ninguém pensa em fugir. “A gente sabe que se fugir e voltar perde o benefício e vai voltar para a cela fechada, o que ninguém quer”.
OCUPAÇÃO
Esse é um dos pontos de maior importância para os presos: a direção gera oportunidades de trabalho para remir a pena e ainda ganhar algum dinheiro e eles sequer cogitam fugas para não perder o benefício. Aresina come a mesma comida que prepara junto com a amiga Adriana e o companheiro Deusimar Pereira Marinho. Além disso, podem frequentar aulas, ler livros e esboçar até algum divertimento sadio que não teriam na cela. O diretor Fábio Teixeira conseguiu um convênio com a Secretaria Estadual de Educação e levou o programa EJA (Educação de Jovens e Adultos) para o presídio para dar formação e diplomas para os detentos.
Adriana Rosário de Jesus, aos 38 anos, já é avó e está há cinco meses no presídio. Ela divide o trabalho na cozinha com Aresina e Deusimar Pereira Marinho, um maranhense de 47 anos que está no presídio há sete anos e três meses. Deusimar considera que as razões para não haver desavenças que redundem em brigas e rebeliões seja a forma agradável e digna com que a direção e os agentes prisionais dispensam aos detentos. “Todos recebem um bom dia e são tratados como gente, mesmo que sejam presos por algum crime. Isso acalma a gente”, comenta. Ele diz que não tem vontade alguma de sair da cozinha, apenas quando conseguir o benefício de progressão de regime. Deusimar levanta todos os dias às 4h30 para preparar o lanche dos carcereiros, o café da manhã dos servidores do presídio e cuidar de tudo na cozinha. De segunda a segunda, mas com alegria, segundo ele porque lá tem cama limpa e decente, possibilidade de ler e de repensar sua vida.
DIGNIDADE
O vereador Wesley Cabeção, representante do PMDB na Câmara de Trindade, é um dos defensores mais entusiastas do corpo de direção e servidores do presídio. Ele lembra que o diretor não cuidou somente dos detentos, mas sua atenção se estendeu também a prover com dignidade familiares que vão visitar os presos e reeducandos. “O diretor Fábio mandou instalar um corrimão para facilitar a subida da escadaria para visitantes. Era muito triste ver mulheres de idade que vinham visitar filhos e não tinham qualquer segurança para subir a escada. Uma mulher assim não tem culpa se o filho incorreu em um erro e praticou um crime, precisa ser tratada com respeito e isso só veio com a atual direção, por isso somos muito agradecidos a ele”.
Wesley reitera que ouve sempre de familiares e visitantes que tudo mudou para melhor desde que Fábio Teixeira e sua equipe chegaram à Unidade Prisional de Trindade. “Antigamente eles tratavam parente igual tratavam os presos. Então o [diretor] Fábio Teixeira conseguiu dar respeito que as pessoas merecem e em nome das famílias só temos a agradecer”, ressalta.
O advogado Marcelino Assis Galindo lembra que conhece dezenas de outros presídios e que pode atestar nota máxima para o que é feito em Trindade. “Eu ando muito como advogado criminalista em outros presídios e posso afirmar com convicção que aqui em Trindade é o local onde os advogados são mais bem tratados e respeitados em sua dignidade e respeito às prerrogativas, não tenho dúvida nenhuma quanto a isso. O respeito, a atenção, educação, a disponibilidade no atendimento, tudo isso faz com que a Subsecção da OAB tenha um trabalho de parceria e respeito com a direção do presídio da cidade”, lembrou.
O presidente destaca ainda o tratamento humanizado que o diretor do presídio dispensa aos presos e que é corroborado pelos seus subalternos. “Uma das coisas que mais batemos aqui em Trindade é que a família do preso não é o preso e eles também merecem tratamento digno. O efeito desse tratamento respeitoso é que a população carcerária respeita o diretor e não promove bagunça ou rebelião”. Marcelino avança na avaliação e diz que o exemplo de Fábio Teixeira deve ser levado como modelo para a direção do sistema prisional do Estado. “Esse presídio aqui deve ser observado como modelo para o Brasil porque todas as práticas aqui comprovadamente resultam em mais trabalho para os presos, menos rebeliões, redução drástica de fugas e redução de gastos. Tudo porque eles tratam todos como seres humanos”, frisa.
EDUCAÇÃO
A direção do presídio consegue manter uma escola regular que alfabetiza e forma alunos dentro do presídio. Uma pequena sala nos fundos da carceragem, apertada e com carteiras espremidas para os alunos sentarem, é o oráculo onde a professora Maria Lúcia Rodrigues, da Rede Estadual de Ensino, exerce o sacerdócio de ensinar. Graduada em Ciências Sociais e História e com mestrado em Educação, essa comprometida educadora cumpre seu desiderato de levar ensino e saber para homens e mulheres que transgrediram a lei e foram condenados ao cárcere, com uma consciência social invejável. “Aqui tentamos alfabetizar e criar neles a vontade de aprender mais coisas boas. Para nossa escola é muito bom porque temos uma oportunidade de melhorar a sociedade melhorando as pessoas. Os alunos são dedicados e receptivos a todo aprendizado. Muitos não sabiam ler nem escrever e já avançaram muito, hoje já buscam literatura diversificada e nos impressionam com a sede de aprendizado”, explica.
Os alunos corroboram a fala da professora e reiteram que no estudo conseguem cumprir duas metas distintas: aprendem algo proveitoso e a prática também serve como remissão de suas penas. A professora Maria Lúcia faz um comovente apelo para que a comunidade faça doação de livros literários para que os alunos possam ler e se instruir. “Temos muita dificuldade de conseguir literatura brasileira ou mesmo de outra nacionalidade. Seria muito bom se as pessoas nos ajudassem doando livros para que os alunos possam se instruir”, resume.
HORTALIÇAS
Uma das pérolas da Unidade Prisional de Trindade é a horta, com mais de um alqueire – quase 5.000 metros quadrados –, plantada com cebolinha, hortelã, salsa, alfaces variadas, abobrinha e couves gigantescas. “Tudo aqui serve para ser vendido e o dinheiro é revertido para compras de insumos e mudas e gerar ainda mais empregos para os detentos”, explica o diretor Fábio Teixeira Rocha. Ele confere diariamente a plantação e se orgulha da vedete do presídio. “Isso aqui é um sonho que enche todos de alegria e dá ocupação lícita para os presos, além de ser o indutor de bons pensamentos para eles”.
Na horta trabalham diretamente 12 detentos que também recebem tratamento diferenciado. Eles dormem no local: um barracão aberto, bem arejado, fazem sua própria comida e beliscam produtos frescos da própria horta e também recebem 2/3 de um salário mínimo. O número de pedidos de trabalho para a horta é muito maior do que as vagas disponíveis e o local parece muita coisa, menos um presídio. Os detentos ficam em um lugar aberto, cercados de verde, podem ler, ouvir música e ninguém pensa em fugir. Edivair Ferreira da Silva é uma espécie de coordenador da horta e revela um dos segredos da ausência de fugas: “A gente tem um lugar bom para ficar cumprindo nossos dias, se inventar de fugir vai ficar muito pior, então essa ideia nem passa pela nossa cabeça. Aqui não tem opressão nenhuma, todo mundo respeita a gente e quem quer se reintegrar na sociedade aqui é uma oportunidade única, não tem porque querer fugir. Sei que a grande maioria dos presídios no Brasil não chega nem perto desse aqui. Esse é um trabalho muito lindo que nosso diretor está fazendo”, revela. Ele diz que à noite podem tomar um banho reconfortante, jantar com dignidade, ler um livro ou ver televisão e esperar o sono chegar.
A atividade laboral para reintegrar presos, gerar renda, remir penas e humanizar relações dentro do presídio se encerra com a confecção. Cerca de 14 detentos trabalham nas máquinas de costura industrial cozendo calças jeans para uma conhecida marca de Goiânia. Todos são remunerados pela atividade e recebem a mesma atenção da direção do presídio.
RECONHECIMENTO
O superintendente do Sistema Prisional, da Secretaria de Segurança Pública e Justiça, tenente-coronel Newton Nery de Castilho, reconhece o valor do trabalho de inserção e pacificação desenvolvido pela direção da Unidade Prisional de Trindade e que experiências exitosas como essa são citadas como exemplos para implantação em outros presídios. “Exemplos de sucesso são sempre copiados em sua essência e esse é um dos que podemos citar como forma de garantir pacificação nos presídios, sem rebelião ou fugas”, finaliza.
Todos recebem um bom dia e são tratados como gente, mesmo que sejam presos por algum crime. Isso acalma a gente” Deusimar Pereira Marinho, 47 anos Aqui eu fico fora da cela durante o dia, posso me divertir e aprender uma profissão. Sei que quando eu sair daqui poderei ter uma ocupação correta e ganhar meu sustento” Antônio Nilson Santiago, 34 anos, cumpre pena de oito anos e nove meses Já completaram dois anos que estou aqui na cozinha e posso garantir que é muito melhor ficar aqui do que lá dentro da carceragem feminina. Aqui eu trabalho e reduzo minha pena e aprendi um ofício” Aresina Aparecida Simão, 45 anos Sempre acreditamos que a geração de oportunidades de trabalho no presídio teria o condão de dar mais tranquilidade aos presos, pacificar as relações e permitir que novas práticas fossem adotadas por eles e com eles” Diretor do presídio, Fábio Teixeira Rocha